No início de junho, o Parlamento Europeu votou a favor da CSDDD (sigla britânica para Corporate Sustainability Due Diligence Directive), propondo emendas à diretiva que implementa regras de governança corporativa sustentável a empresas da UE (União Europeia) ou que mantenham relação econômica com o bloco.
A CSDDD está inserida no contexto ESG (da sigla, em inglês, Environmental, Social and Governance) e considera que empresas de todos os setores da economia como fundamentais para o sucesso na transição da UE para uma economia mais sustentável, em consonância com o Pacto Ecológico Europeu e os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da Organização das Nações Unidas (ONU), além de outras iniciativas globais de sustentabilidade.Para tanto, a diretiva prevê que as empresas deverão estabelecer e implementar medidas de due diligence para identificar, prevenir, mitigar e/ou eliminar impactos negativos, potenciais ou reais, relacionados a direitos humanos e meio ambiente. Essas medidas deverão ser implementadas sob pena de responsabilização civil com o risco de imposição de sanções pecuniárias não inferiores a 5% do faturamento líquido mundial no ano comercial anterior à decisão de aplicação da multa.
A redação atual da diretiva (sujeita a revisões) abrange entidades europeias de todos os setores da economia, incluindo aquelas do setor financeiro, com exceção das pequenas e médias. No entanto, a CSDDD também afetará empresas brasileiras a partir de duas perspectivas: direta e indiretamente.
A primeira perspectiva diz respeito à expressa previsão de aplicação da diretiva a empresas provenientes de países de fora da UE caso atendam um dos seguintes requisitos:
1) Tenha gerado um volume de negócios líquido em todo o mundo superior a 150 milhões de euros, sendo que pelo menos 40 milhões de euros tenham sido gerados na UE em um ano financeiro, incluindo o volume de negócios gerado por corporações de terceiros com as quais a empresa e/ou suas subsidiárias celebraram um acordo vertical na UE em troca de royalties; e/ou 2) seja controladora final de um grupo com 500 funcionários e um volume de negócios líquido em todo o mundo superior a 150 milhões de euros e pelo menos 40 milhões de euros gerados na UE em um ano financeiro, incluindo o volume de negócios gerado por firmas de terceiros com as quais a sociedade e/ou suas subsidiárias celebraram um acordo vertical na UE em troca de royalties.
Para esses casos, as empresas deverão adotar as medidas impostas pela CSDDD, que podem ser resumidas da seguinte forma: integrar a due diligence em suas políticas internas; identificar impactos negativos reais ou potenciais; prevenir e mitigar impactos negativos potenciais, bem como encerrar e minimizar a extensão de impactos negativos reais; estabelecer e manter um procedimento de ouvidoria; monitorar a eficácia de suas políticas e medidas de due diligence; e comunicar publicamente os atos de due diligence praticados.
Além disso, a CSDDD prevê que as empresas que preencham os requisitos da aplicabilidade da diretiva deverão adotar plano para garantir que seu modelo de negócio e a estratégia sejam compatíveis com a transição para uma economia sustentável e com a limitação do aquecimento global a 1,5 °C, de acordo com o Acordo de Paris. Nesse aspecto, a diretiva impõe um dever específico de diligência aos administradores pela supervisão deste plano, sob pena de responsabilização. E, para as empresas que possuem mais de 1.000 funcionários, há também imposição de vinculação de política de remuneração variável a esse plano de transição.
Cabe salientar ainda que a CSDDD também prevê a criação de autoridade reguladora para supervisionar o cumprimento da diretiva, além da necessidade de cada empresa designar um representante para receber comunicações sobre o cumprimento e aplicação das disposições da diretiva. Este aspecto trata de medida semelhante ao recente tema da proteção de dados, com a criação de agências reguladoras específicas e da figura do oficial de proteção de dados, que demandou intensa adaptação.
A segunda perspectiva diz respeito às empresas indiretamente submetidas à CSDDD. Isso significa que o dever de due diligence imposto pela diretiva não se dará apenas à própria operação da empresa, mas também às suas subsidiárias e às demais relações comerciais diretas e indiretas ao longo da cadeia de valor. Isso inclui, por exemplo, as entidades relacionadas aos produtos ou serviços, bem como a venda, distribuição, transporte, e armazenamento.
Portanto, ainda que determinada empresa brasileira não atenda aos requisitos elencados acima, ela poderá ser submetida indiretamente à CSDDD caso seja subsidiária ou tenha relações comerciais diretas ou indiretas com empresa sujeita à diretiva, seja por meio de assunção de garantias contratuais, realização de auditorias para o fim de identificar possíveis impactos negativos relacionados a direitos humanos e meio ambiente ou por meio de adequações à diretiva.
No entanto, a CSDDD tem como objetivo proteger esses parceiros comerciais e prevê que sejam feitos esforços para mitigar e prevenir riscos, sendo o rompimento das relações contratuais apenas uma medida extrema a ser tomada em último caso.
Por fim, vale ressaltar que, até o momento, foram apenas estabelecidas as posições e propostas de alterações da Comissão Europeia (em fevereiro de 2022), do Conselho da UE (em dezembro de 2022) e, agora, do Parlamento Europeu. O próximo passo será iniciar as negociações finais no "Trílogo" para definir a versão final da diretiva e o prazo para sua entrada em vigor.
A CSDDD é uma medida relevante no contexto ESG e terá impactos significativos nas empresas brasileiras abrangidas. Diferentemente de diretrizes e recomendações voluntárias, como o Decreto nº 9.571/2018 e a ABNT PR 2030, a CSDDD impõe obrigações legalmente exigíveis. Logo, é essencial acompanhar as definições finais da diretiva, pois exigirá a adoção de medidas para garantir que as empresas estejam em conformidade com seus requisitos, garantindo padrões de governança corporativa sustentável.