Opinião

A fixação prévia do valor estimado para contratação em processo licitatório

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16 de janeiro de 2023, 6h13

Entre os requisitos mínimos essenciais para a regular tramitação de uma licitação, a correta fixação prévia do valor estimado para a contratação é, sem dúvidas, um dos mais importantes. Afinal, é a partir desse montante que passam a ser impostas diversas regras, que vão desde a modalidade de licitação que poderá ser adotada até o tipo de garantia que deve ser apresentada pela licitante contratada para a prestação do serviço licitado.

Quanto ao assunto, o artigo 23 da Lei nº 14.133/2022, muito bem prevê que o valor previamente estimado da contratação deve ser compatível com os valores praticados em mercados, fixando em seus incisos parâmetros que podem ser observados cumulativamente ou não, conforme colacionado abaixo:

"Artigo 23. O valor previamente estimado da contratação deverá ser compatível com os valores praticados pelo mercado, considerados os preços constantes de bancos de dados públicos e as quantidades a serem contratadas, observadas a potencial economia de escala e as peculiaridades do local de execução do objeto.

§1º. No processo licitatório para aquisição de bens e contratação de serviços em geral, conforme regulamento, o valor estimado será definido com base no melhor preço aferido por meio da utilização dos seguintes parâmetros, adotados de forma combinada ou não:

I – composição de custos unitários menores ou iguais à mediana do item correspondente no painel para consulta de preços ou no banco de preços em saúde disponíveis no Portal Nacional de Contratações Públicas (PNCP);
II – contratações similares feitas pela Administração Pública, em execução ou concluídas no período de um ano anterior à data da pesquisa de preços, inclusive mediante sistema de registro de preços, observado o índice de atualização de preços correspondente;
III – utilização de dados de pesquisa publicada em mídia especializada, de tabela de referência formalmente aprovada pelo Poder Executivo federal e de sítios eletrônicos especializados ou de domínio amplo, desde que contenham a data e hora de acesso;
IV – pesquisa direta com no mínimo três fornecedores, mediante solicitação formal de cotação, desde que seja apresentada justificativa da escolha desses fornecedores e que não tenham sido obtidos os orçamentos com mais de seis meses de antecedência da data de divulgação do edital;
V – pesquisa na base nacional de notas fiscais eletrônicas, na forma de regulamento".

A partir da leitura do dispositivo colacionado acima, é possível visualizar que são diversas as preocupações e os parâmetros fixados para que o valor estimado para a licitação seja, de fato, um montante que corresponda a um valor atualizado e que, formalmente, possa ser analisado, sob pena de que não seja possível visualizar, na prática, de onde a quantia surgiu. Destaque-se, por exemplo, que nos casos de utilização como parâmetro de contratações similares feita pela própria Administração Pública para a compra de bens e contratações de serviços em geral, o contrato administrativo deve estar em execução ou ter sido concluído no máximo um ano antes  da data da pesquisa de preços. Ainda, é necessário também que a pesquisa seja feita com, no mínimo, 03 (três), fornecedores e, frise-se, dentro do máximo de seis meses anteriores à data de divulgação do edital.

Neste ponto, importante destacar que a Nova Lei de Licitações representa um avanço ao prever expressamente os referidos parâmetros e os demais constantes no dispositivo colacionado acima, uma vez que a Lei 8.666/93 aborda a necessidade de compatibilidade do valor estimado com o preço praticado em mercado apenas com termos mais vagos, como, por exemplo, ao prever em algumas disposições que algumas contratações devem respeitar o valor "compatível com o praticado no mercado" ou que é parte integrante do edital o orçamento estimado em planilhas de quantitativos e preços unitários, conforme artigo 40, §2º, inciso II, da referida legislação [1].

Acontece que, fora do mundo ideal previsto pelo legislador ao elaborar as leis, diversas são as ocasiões em que as licitações são deflagradas pela administração pública sem que tenha sido realizada, realmente, uma pesquisa pormenorizada para o cálculo da quantia estimada e que esteja comprovadamente adequada à realidade atual. Neste ponto, destaque-se que, não raro, para resguardar a supremacia do interesse público, no momento em que os editais de convocação para a licitação são publicados os licitantes sequer possuem conhecimento do valor estimado apurado ou dos parâmetros adotados para a pesquisa.

Em que pese o exposto, mesmo que a adoção criteriosa pela administração pública quanto aos critérios para encontrar a referida quantia para um certame licitatório pareça algo longe da realidade e que pode resultar, inclusive, na desclassificação de licitantes plenamente aptos e competentes para prestar os objetos licitados em razão de supostos preços inexequíveis, o Tribunal de Contas da União, por meio do Acórdão 2401/2022, reforçou a necessidade de respeito quanto aos referidos parâmetros:

"Acórdão 2401/2022 Plenário, Auditoria, relator ministro-substituto Augusto Sherman.3. Em obras custeadas com recursos da União, diante da necessidade de se recorrer à pesquisa de preços de insumos e serviços por meio de cotações de mercado, em razão de estes não estarem previstos em sistemas oficiais de referência de preços (parte final do artigo 6º do Decreto 7.983/2013), devem ser adotados os seguintes procedimentos: a) fazer constar nos autos do processo de licitação os parâmetros de busca introduzidos (as palavras chaves, o período, as especificações etc.) com a impressão da página da internet; como também os dados inerentes à pesquisa, a exemplo do responsável pela pesquisa, órgão consultado, número da licitação, nome do vendedor, meio de consulta, data da pesquisa, URL do site, CNPJ do fornecedor, quantidade, valor e especificação do objeto, bem como as demais condições de pagamento e entrega; b) na cotação direta com os fornecedores, somente admitir os preços cujas datas não se diferenciem em mais de 180 dias; c) para a obtenção do resultado da pesquisa de preços, não considerar os preços inexequíveis ou os excessivamente elevados, conforme critérios fundamentados e descritos no processo administrativo; d) buscar, na pesquisa de mercado, o mínimo de três cotações de fornecedores distintos e, caso não seja possível obter esse número, elaborar justificativa circunstanciada".

Note-se que o Tribunal de Contas cita parâmetros ainda mais rígidos, como, por exemplo, a obrigatoriedade de que seja respeitado o tempo máximo de 180 dias entre as cotações. É fato que, mesmo que na prática o respeito aos critérios para levantamento de estimativa de preço nas licitações não seja visualizado com facilidade, a identificação correta do montante representa uma garantia não só para a administração pública como para o licitante.

Portanto, o recente acórdão do Tribunal de Contas da União representa não só o reforço à necessidade de atendimento pela Administração Pública a critérios minuciosos para a elaboração de pesquisas e cotações de preços, mas também ao princípio da eficiência administrativa previsto no artigo 37 da Constituição Federal de 1988 [2] e, sobretudo, à possibilidade de licitantes acionarem as Cortes de Contas em casos de desrespeito aos parâmetros ora expostos.

 


[1] Artigo 40.  O edital conterá no preâmbulo o número de ordem em série anual, o nome da repartição interessada e de seu setor, a modalidade, o regime de execução e o tipo da licitação, a menção de que será regida por esta Lei, o local, dia e hora para recebimento da documentação e proposta, bem como para início da abertura dos envelopes, e indicará, obrigatoriamente, o seguinte (…) §2º Constituem anexos do edital, dele fazendo parte integrante: (…) II – orçamento estimado em planilhas de quantitativos e preços unitários

[2] Artigo 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: (…)

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