Opinião

EC nº 128/2022: pá de cal nos reajustes salariais dos profissionais do magistério

Autor

  • Rafael Santana Frizon

    é pós-graduado em Direito Constitucional pelo Instituto de Direito Constitucional e Cidadania (IDCC) e mestrando em Ciência Jurídica pela Universidade Estadual do Norte do Paraná (UENP -Campus Jacarezinho).

13 de janeiro de 2023, 9h18

De uns tempos para cá, afigurou-se forte embate entre gestores públicos e sindicatos dos profissionais do magistério, doravante denominados professores, tendo por epicentro aumentos salariais.

Em 2022, os ânimos entre eles se acirraram com a publicação, pelo Ministério da Educação (MEC) da portaria nº 67/2022 "concedendo" reajuste de 33,24% no piso salarial nacional do magistério.

A palavra concedendo está entre aspas haja vista forte insegurança jurídica que permeia o assunto, especificamente quanto à possibilidade de portaria editada pelo governo federal estabelecer piso salarial a ser pagos pelos erários municipais e estaduais.

Após edição da portaria nº 67/2022, representantes dos professores solicitaram aos gestores públicos a concessão do reajuste salarial na ordem de 33,24%, justificando que ela tem base legal na lei federal nº 11.738/08, dando-lhe direito líquido e certo a tal recomposição salarial.

Por outro lado, representantes dos entes políticos, como a Confederação Nacional de Municípios (CNM) apregoaram a inexistência de base legal para que a concessão do reajuste salarial fosse concedida por meio de uma mera portaria expedida pelo governo federal, somado a um segundo argumento de que o critério de reajuste anual do piso do magistério havia sido revogado pela Lei Federal 14.113/2022  referida lei regulamentou o novo Fundeb. Para essa vertente municipalista inexistiria direito líquido e certo para a recomposição salarial na ordem de 33,24%, posto que a  portaria nº 67/2022 careceria de validade jurídica.

Nesse cenário de incertezas jurídicas alguns gestores concederam referido reajuste salarial aos professores na ordem de 33,24%, outros fizeram somente a recomposição inflacionária do período pelos índice IPCA, INPC, enquanto outros ficaram inertes.

Ocorre que, referida discussão perdeu sentido em 22 de dezembro de 2022, com a publicação da emenda constitucional nº 128, que acresceu o §7º ao artigo 167 da Constituição Federal.

Agora, o §7º ao artigo 167 da Constituição Federal proíbe lei federal de criar despesas sem que haja previsão de fontes orçamentárias e financeiras ou transferência dos recursos necessários para a prestação do respectivo serviço público.

"Artigo 1º O artigo 167 da Constituição Federal passa a vigorar acrescido do seguinte §7º: Artigo 167.

§7º. A lei não imporá nem transferirá qualquer encargo financeiro decorrente da prestação de serviço público, inclusive despesas de pessoal e seus encargos, para a União, os Estados, o Distrito Federal ou os Municípios, sem a previsão de fonte orçamentária e financeira necessária à realização da despesa ou sem a previsão da correspondente transferência de recursos financeiros necessários ao seu custeio, ressalvadas as obrigações assumidas espontaneamente pelos entes federados e aquelas decorrentes da fixação do salário mínimo, na forma do inciso IV do caput do artigo 7º desta Constituição".

Nessa ordem de ideias, Lei federal que já regulamenta piso salarial para determinada categoria sem a previsão de fontes orçamentárias e financeiras passou para a ineficácia, tendo em vista sua não recepção pelo texto constitucional após emenda constitucional nº 128/22.

No tocante a esse ponto, perdeu fôlego jurídico o argumento dos representantes dos professores que solicitaram aos gestores públicos a concessão do reajuste salarial na ordem de 33,24%, justificando que ela tem base legal na Lei federal nº 11.738/08, dando-lhe direito líquido e certo a tal recomposição salarial, já que referida lei federal não contempla previsão de fontes orçamentárias e financeiras

Portanto, de agora em diante, a lei federal que regulamentar piso salarial para determinada categoria deverá vir acompanhada da previsão de fontes orçamentárias e financeiras ou transferência dos recursos necessários para a prestação do respectivo serviço pública.

A propósito, segundo a CNM "Se o critério de reajuste do piso nacional do magistério ainda tivesse eficácia legal, o reajuste do piso dos professores, hoje, seria de 14,95%, resultado da variação do Vaaf-MIN de 2021 de R$4.462,83, e o VAAF-MIN de 2022 de R$ 5.129,80". Contudo, por inexistir previsão legal válida, referido reajuste não poderá ser concedido.

Tal novidade vem em bom momento, tendo por escopo evitar que o governo federal faça "cortesia com chapéu alheio", haja vista que comumente estabelecia pisos salariais a determinadas categorias, porém não explicava de onde sairia os recursos financeiros para os pagamentos.

Trata-se de alteração constitucional que prestigia a saúde orçamentária e fortalece a capacidade de financiamento de políticas públicas na medida em que impede que os entes políticos tenham as suas finanças oneradas por criação de programas que não venham acompanhados das fontes de recursos necessários ao seu custeio.

Portanto, por inexistir lei federal que apresente a correspondente fonte de custeio para eventual piso salarial dos professores do magistério, a única conclusão possível é a de que a emenda constitucional nº 128/2022 colocou pá de cal no referido imbróglio.

Cabe, agora, torcer para que o Congresso Nacional faça sua obrigação, e trabalhe em prol dos professores, preferencialmente editando emenda constitucional especificando as fontes orçamentárias para os pisos dos profissionais do magistério, nos moldes da emenda constitucional nº 120/22  estabeleceu piso salarial para agentes comunitários de saúde e dos agentes de combate , ou da emenda constitucional nº 127/2022 — estabelece o superávit financeiro dos fundos públicos do Poder Executivo como fonte de recursos para o cumprimento dos pisos salariais profissionais nacionais para o enfermeiro, o técnico de enfermagem, o auxiliar de enfermagem e a parteira.

Enquanto isso a utilização de critérios de correção monetária, como a variação pelo INPC acumulado nos últimos doze meses, talvez seja uma saída razoável, sobretudo porque a valorização pecuniária em favor dos professores é fundamental para o avanço da educação brasileira.

 


Referência Bibliográfica

FEDERAL, Senado. Congresso promulga emenda que impede lei federal de criar despesa sem fonte de receita. 2022. Disponível em: https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2022/12/22/congresso-promulga-emenda-que-impede-lei-federal-de-criar-despesa-sem-fonte-de-receita. Acesso em: 2 jan. 2023.

Autores

  • é pós-graduado em Direito Constitucional pelo Instituto de Direito Constitucional e Cidadania (IDCC) e mestrando em Ciência Jurídica pela Universidade Estadual do Norte do Paraná (UENP -Campus Jacarezinho).

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