Opinião

Práticas ESG e a nova Lei de Licitações

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26 de fevereiro de 2023, 13h41

A promoção do desenvolvimento nacional, hoje, inevitavelmente passa por uma abordagem que seja ambientalmente responsável. A sigla ESG tem ganhado cada vez mais relevância nesse contexto, ao incentivar a substituição da lógica tradicional e predatória de retorno financeiro a curto prazo por um enfoque mais contemporâneo e complexo, que busca aliar práticas ambientalmente sustentáveis a retornos financeiros de longo prazo.

ESG, que em inglês significa Enviromental, Social and Governance, se traduz em um conjunto de padrões e boas práticas que visa assegurar que a operação de uma determinada empresa seja corretamente gerenciada e vise não somente o lucro a qualquer custo, mas também privilegie uma atuação socialmente consciente e ambientalmente sustentável. Trata-se de regra que tem influenciado de forma relevante a busca de investimento em nível global [1].

Em outras palavras, ESG e um conceito utilizado para se referir a boas práticas empresariais que, para além da lucratividade, se preocupam com critérios ambientais  buscando mitigar os impactos que a sua atuação causa no meio ambiente , sociais  que consideram a preocupação e a relação da empresa com o desenvolvimento social , de governança  dizem respeito a maior transparência entre a corporação, seus acionistas e a sociedade.

Em termos simples, isso quer dizer que o valor de uma empresa se mede não só pela sua rentabilidade financeira, sendo cada vez mais influenciado pela sua capacidade de aliar um modelo de negócios que seja financeiramente lucrativo com uma abordagem focada na preservação do meio ambiente e na responsabilidade social. Incorporar uma abordagem ESG, portanto, é um fator primordial para o futuro de um negócio, devendo ser considerada um elemento essencial de planejamento estratégico da empresa.

Seja para atender a requisitos regulatórios e de gerenciamento de riscos, seja para gerar maior reputação e valor à marca empresarial ou mesmo atrair novos investidores, fato é que a adoção de práticas ESG é de fundamental importância para a construção de um ecossistema empresarial sustentável.

Em âmbito nacional, o tema ESG ganhou ainda mais relevância [2] diante dos desastres ambientais e escândalos de corrupção que irromperam nos últimos anos, que levaram o legislador a editar leis que prevejam a implementação de mecanismos de governança e de mitigação de riscos como fator relevante para a atração de investimentos, sejam eles públicos ou privados, e para a contratação com órgãos e entidades estatais.

Um grande exemplo é a Nova Lei de Licitações (Lei nº 14.13/2021), que trouxe para o ambiente das contratações públicas brasileiro aspectos relativos a desenvolvimento social e ambientalmente sustentável e de governança corporativa. Com a Nova Lei, as empresas que planejam contratar com o poder Público deverão se adaptar a essa realidade, que impacta de modo decisivo no processo licitatório. A melhor conjugação entre técnica e preço não mais é o único fator determinante para as contratações.

Dentre os dispositivos da Nova Lei que refletem práticas ESG, vale destacar: a) a possibilidade de a Administração exigir de seus contratados a adoção de programas de integridade (§4º do artigo 25) [3]; b) a possibilidade de o edital de licitação exigir que a empresa contrate uma porcentagem mínima de mulheres vítimas de violência doméstica ou de oriundos do sistema prisional (incisos I e II do §9º do artigo 25); c) a atribuição de vantagem competitiva às empresas que promovem ações de equidade de gênero no ambiente de trabalho ou que possuem programas de integridade efetivos (incisosIII e IV do artigo 60); d) a garantia de preferência, em caso de empate, às empresas que investem em pesquisa e desenvolvimento tecnológico no País ou comprovem práticas de mitigação ambiental (incisos. III e IV do §1º do artigo 60).

Vale destacar, ainda, que a Nova Lei incluiu o desenvolvimento sustentável como um dos objetivos do processo licitatório (inciso IV do artigo 11), estabeleceu a necessidade de que os resíduos sólidos gerados pelas obras contratadas sejam adequadamente descartados (inciso I do artigo 45), possibilitou que para a remuneração variável do contratado fosse levado em conta critérios de sustentabilidade ambiental (artigo 144) e, no caso de compras, permitiu que seja dada preferência para bens reciclados, recicláveis ou biodegradáveis (inciso II do artigo 26).

Em uma palavra final, com o advento da Lei nº 14.133/2021 a agenda ESG, que já estava em crescente no Brasil, ganhou uma relevância ainda maior, especialmente para aquelas empresas que pretendem contratar com a Administração Pública. Além disso, não podemos deixar de observar que agora o Poder Público possui um ferramental bastante diverso para incorporar aos projetos de infraestrutura algumas características ou qualidades típicas de empreendimentos ESG. E esse fator, como visto, pode ser um diferencial chave para a atração de recursos para projetos estratégicos de infraestrutura.

 


[1] Pesquisa recente realizada pela Bloomberg estime que a agenda ESG deve atrair cerca US$53 trilhões em investimentos em 2025. Ver https://www1.folha.uol.com.br/seminariosfolha/2021/05/esg-deve-atrair-us-53-tri-em-investimentos-em-2025-estima-bloomberg.shtml.

[2] Inclusive, atualmente existem índices vinculados a Bolsa de Valores que acompanham a oscilação de valor de mercado das empresas que adotam práticas ESG. O índice S&P/B3 Brasil ESG, por exemplo, fiscaliza a performance no mercado de empresas que cumprem critérios de sustentabilidade.

[3] Exigência essa já prevista em outras leis, como a Lei das Estatais e a Lei Anticorrupção.

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