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Rodrigues e Burati: MP , nova portaria e IRPJ do Perse

6 de fevereiro de 2023, 19h14

Por Edilton Henrique Rodrigues, Aguinaldo Matheus Alves Burati

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Debateu-se recentemente a ilegalidade da IN RFB nº 2.114/2022 que, sob o pretexto de regulamentar o benefício fiscal previsto no artigo 4º da Lei 14.148/2021, inovou modificando critério material para a fruição da alíquota zero para IRPJ, CSLL, PIS e Cofins.

Isso porque, com a referida instrução normativa, a isenção inaugurada pelo Perse restou reduzida, com a previsão de que os benefícios só seriam aplicados sobre as receitas e resultados auferidos pelas pessoas jurídicas, quando eles, as receitas e resultados, estejam relacionados às atividades descritas nos incisos I a IV de seu artigo 2º. Tornando necessária a segregação de receitas, para fins de gozo do benefício (mandamento que não encontrava equivalente no texto da Lei 14.148/2021). A própria IN RFB 2.114/2022 instrumentalizou as medidas em seus artigos 5º e 6º.

Contudo, em 20 de dezembro de 2022, o governo federal (talvez ciente de que para as alterações pretendidas uma Instrução Normativa da RFB não seria o instrumento adequado frente ao princípio da legalidade) publicou a Medida Provisória nº 1.147/2022 adotando, com força de lei, nova redação no enunciado do artigo 4º e parágrafos da Lei nº 14.148/2021, que institui o Perse.

Em suma, a MP nº 1.147/2022, cujo texto guarda completa equivalência com o do regulamento do órgão fazendário, pretendeu corrigir o vício presente na IN RFB nº 2114/2022, dando ao seu conteúdo a forma adequada para majoração de tributo, ou seja, a forma de lei (embora, por enquanto, só alcance a força de lei).

Contudo, pensando as espécies tributárias e a diferenciação de tratamento constitucional a que estão submetidos os variados tributos, neste ponto, no que toca ao IRPJ, importa a disposição do artigo 62, §2º, da Constituição Federal, que contém o seguinte mandamento: "Medida Provisória que implique instituição ou majoração de impostos, exceto os previstos nos artigos 153, I, II, IV e V, e 154, II, só produzirá efeitos no exercício financeiro seguinte se houver sido convertida em lei até o último dia daquele em que foi editada".

Assim, como o IRPJ não escapa às exceções previstas pela Constituição, impossível que o conteúdo da MP nº 1.147/2022, que suprime benefício fiscal e aumenta a carga tributária, seja estendido ao Imposto de Renda, pois seus efeitos encontram-se suspensos (em relação a esse imposto) até que venha a ser convertida em lei. Continuando válido e eficaz, para esse propósito, o texto original do artigo 4º da Lei 14.148/2021 após a promulgação das partes vetadas.

Feitas as ponderações acerca das alterações advindas da IN RFB nº 2114/2022, logo seguida pela MP nº 1.147/2022, mais importante serão as delimitações estabelecidas para os efeitos da Portaria ME nº 11.266, porque esse ato normativo para muitos dos contribuintes significou a exclusão completa do Perse, diante de nova listagem de Cnaes caracterizados como integrantes do setor de eventos.

Considerando que logo que foi promulgada a parte vetada da Lei 14.148/2021, com o texto original do artigo 4º, para o propósito de conceituação de pessoa jurídica integrante do setor de eventos remetia-se ao artigo 2º da Lei do Perse.

E, dado os contornos gerais, o artigo 2º, §2º, assim dispôs: "Ato do Ministério da Economia publicará os códigos da Classificação Nacional de Atividades Econômicas (Cnae) que se enquadram na definição de setor de eventos referida no §1º deste artigo".

Disso resultou a Portaria ME nº 7.163/2021, que justificou sua existência exatamente no artigo 2º, §2º, da Lei 14.14/2021. Veja:

"O MINISTRO DE ESTADO DA ECONOMIA, no uso da atribuição que lhe confere o inciso II do parágrafo único do artigo 87 da Constituição, e tendo em vista o disposto no §2º do artigo 2º da Lei nº 14.148, de 3 de maio de 2021, resolve:
Artigo 1º Definir os códigos da Classificação Nacional de Atividades Econômicas (Cnae) que se consideram setor de eventos nos termos do disposto no §1º do artigo 2º da Lei nº 14.148, de 3 de maio de 2021, na forma dos Anexos I e II."

A distinção começa aqui.

Com a edição da MP 1.147/2022, em 20 de dezembro de 2022, alterou-se o artigo 4º da Lei 14.148/2021 para em seu caput, parte final, constar o seguinte: "incidentes sobre o resultado auferido pelas pessoas jurídicas pertencentes ao setor de eventos nas atividades relacionadas em ato do Ministério da Economia".

Deste modo, a Portaria ME nº 11.266/2023, ato posterior, não mais justifica sua existência no artigo 2, §2º, da Lei 14.148/2021, como fez a Portaria ME 7.163/2021, mas sim no próprio artigo 4º, fruto do novo texto incluído pela MP 1.147/2022:

"O MINISTRO DE ESTADO DA ECONOMIA, substituto, no uso da atribuição que lhe confere o inciso II do parágrafo único do artigo 87 da Constituição, e tendo em vista o disposto no artigo 4º da Lei nº 14.148, de 3 de maio de 2022, resolve:
Artigo 1º Esta Portaria define os códigos da Classificação Nacional de Atividades Econômicas (Cnae) abrangidos pelo disposto no artigo 4º da Lei nº 14.148, de 3 de maio de 2021."

Disso é imperativo concluir que se, por força do artigo 62, §2º, da Constituição, ficam paralisados os efeitos da MP nº 1.147/2022 até ter sido convertida em lei porque majora IRPJ ao suprimir benefício fiscal do Perse, do mesmo modo ficam suspensos os efeitos da Portaria ME 11.266/2023 em relação ao IRPJ, uma vez que é a própria medida provisória que fundamenta sua existência, ao alterar o artigo 4º da Lei 14.148/2021. Sem efeito a MP nº 1.147/2022 é expandida sua ineficácia à Portaria ME 11.266/2023 (porque precário, neste aspecto, o ato do qual deriva).

Sobre a parte final do caput do artigo 4º da Lei 14.148 resultar em majoração de imposto apta a atrair a aplicação do artigo 62, §2º, da Constituição Federal, isso é óbvio. Afinal dessa disposição adveio a Portaria ME 11.266/2023, que excluiu 50 Cnaes anteriormente listados pela Portaria ME 7.163/2021.Significando o fim, a extinção, dos benefícios para aquelas pessoas jurídicas que foram excluídas da nova listagem.

Afastada a Portaria ME nº 11.266/2023, em relação ao IPRJ continua a produzir efeito a Portaria ME 7.163/2021, editada com base no artigo 2, §2º, da Lei 14.148, o que garante às pessoas jurídicas inicialmente enquadradas no Perse o direito de gozar do benefício de alíquota zero IRPJ durante todo o período de 60 meses ou até que a MP 1.147/2022 venha a ser convertida em lei (apenas no exercício seguinte de sua conversão, aplicando-se o princípio da anterioridade).