Sem deduções

Associação ao tráfico exige estabilidade e permanência concretas

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27 de agosto de 2023, 7h47

A existência do crime de associação para o tráfico de drogas não pode, em regra, ser deduzida ou inferida apenas pela forma como os agentes perpetraram os crimes específicos ou do seu modus operandi. É imprescindível a demonstração concreta da estabilidade e da permanência da associação criminosa como crime autônomo em relação aos fins visados.

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FreepikHomens foram presos quando tentavam fugir de Santarém para Belém

Dessa forma, a 4ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1) absolveu dois homens condenados por associação ao tráfico e reduziu as penas impostas a eles — de 13 anos e nove meses de prisão em regime fechado para seis anos e dois meses em regime semiaberto.

A defesa recorreu contra a sentença proferida pela 1ª Federal da Seção Judiciária de Santarém (PA), que condenou a dupla por associação e tráfico de drogas. Em abril de 2021, os homens foram presos em uma ação que flagrou a tentativa de envio de 85,9 kg de cocaína para a Grécia. Após denúncia anônima, a droga foi encontrada em um casco de navio. A dupla foi presa, de acordo com os autos, quando tentava fugir para Belém.

No recurso, os advogados sustentaram a inexistência de elementos de prova que relacionassem a dupla aos crimes e que não se pode admitir uma condenação "baseada em conjecturas e ilações".

O relator, juiz federal Marcelo Elias Vieira, afastou a possibilidade de ilegalidade das provas. O magistrado lembrou que o artigo 240 do Código de Processo Penal brasileiro permite a busca pessoal, desde que existam fundadas suspeitas acerca da prática de infração penal. "No caso, considero que as fundadas razões existiram, bem como que não se trata de intervenção policial aleatória (o que vem sendo rechaçado pelos precedentes do Superior Tribunal de Justiça)", disse. 

Contudo, o relator ponderou que elementos da investigação apresentados no processo não se mostraram suficientes para caracterizar uma associação para o tráfico de drogas, pois os critérios de estabilidade e permanência não foram comprovados na ação.

"O crime de associação para o tráfico de drogas não pode ser inferido pelo modo como foi praticado, visto que tem que estar configurado um vínculo duradouro e estável entre os seus integrantes, por meio de uma estrutura organizada, com divisão de tarefas, devendo estar presente o dolo de se associar com estabilidade e permanência para a configuração do delito do artigo 35 da Lei nº 11.343/2006", disse o relator.

Para o magistrado, em nenhum momento da fundamentação, a sentença demonstrou a existência de um vínculo psicológico com o tráfico de drogas, nem a divisão de tarefas que evidenciassem a associação estável e permanente entre os acusados para o narcotráfico.

"A instrução deve deixar evidenciado o ajuste prévio dos agentes, no intuito de formar um vínculo associativo no qual a vontade de se associar seja distinta da vontade de praticar o(s) crimes(s) visado(s). A associação, crime autônomo em relação aos fins visados, deve ser demonstrada independentemente da eficácia dos seus objetivos."

Ao reajustar as penas, o relator considerou a primariedade dos réus. A condenação dos acusados foi reduzida para seis anos e dois meses de prisão, em regime semiaberto, e 625 dias-multa na razão de 1/30 do salário-mínimo vigente no momento do crime.

A defesa dos réus foi feita pelos advogados Anderson Domingues, Rondinelly Maia Abranches Gomes, Karina Nunes de Vincenti Domingues, Guilherme Felipe Batista Vaz e Katiana Pereira Lobato.

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Processo 1002940-49.2021.4.01.3902

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