Opinião

Joint Tenancy e seus reflexos no Brasil

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24 de outubro de 2022, 11h13

Joint Tenancy é uma modalidade de direito de propriedade utilizada em jurisdições que adotam o direito anglo-saxão, que prevê possibilidade de um mesmo bem ser detido simultaneamente por mais de uma pessoa de forma indivisível, isto é, uma pluralidade de proprietários pode deter, concomitantemente, a propriedade integral do bem.

Este tipo de direito comumente é utilizado em conjunto com previsão que estabelece um direcionamento sucessório no sentido de que, com o falecimento de um dos proprietários, o bem passe a ser detido automaticamente pelos demais coproprietários sobreviventes, não havendo, assim, transmissão do bem para terceiros. Tal previsão é chamada de Joint Tenancy with Rights of Survivorship (JTWRS).

O JTWRS é usualmente utilizado em quotas de sociedades offshore e em contas bancárias detidas no exterior.

Sob a perspectiva sucessória, o JTWRS facilita a transferência do bem entre os proprietários (isto é, transferência das ações para os acionistas sobreviventes), uma vez que não há necessidade de abertura de inventário local (conhecido de "probate") para realizar a transferência do bem aos demais coproprietários. Via de regra, o mero envio de cópia da certidão de óbito à junta comercial da jurisdição já seria suficiente para atender às exigências, por exemplo.

Neste sentido, em conjunto com o JTWRS, a elaboração de um testamento na jurisdição também é um excelente cuidado a ser tomado, pois como não é possível prever qual dos proprietários falecerá primeiro, é necessária a elaboração de testamentos determinando a transferência da propriedade entre as partes. O testamento pertencente ao último acionista sobrevivente é o que será utilizado para abertura do probate na jurisdição.

A legislação brasileira não prevê o direito de propriedade similar ao Joint Tenancy. O instituto que mais se aproxima é o do condomínio, porém, com a relevante diferença de que os condôminos possuem uma fração do bem, enquanto no Joint Tenancy, os proprietários detêm simultaneamente todo o bem, sem fracioná-lo.

Devido à ausência de previsão do JTWRS na legislação brasileira, existem alguns cuidados a serem tomados para que não existam conflitos no momento da sucessão. Vejamos.

Como regra geral, os herdeiros são condôminos sobre os bens partilhados, na parcela estabelecida em lei e respeitando eventuais disposições testamentárias, assim, podem surgir conflitos com a existência de bens detidos no exterior sob previsão de JTWRS.

Como no JTWRS o bem pertence simultaneamente a todos os proprietários e, no falecimento de um, permanecerá com os outros, podemos ter o desrespeito aos critérios de partilha estabelecidos pela lei brasileira, uma vez que herdeiros que não pertencem à joint tenancy podem não receber o bem e aqueles que fazem parte podem não receber o percentual correto.

A cláusula de JTWRS se acomoda melhor à legislação brasileira quando instituído entre cônjuges, uma vez que essa propriedade simultânea pode ser equiparada ao bem comum do casal, previsto pela legislação brasileira e sua sucessão pode ser garantida ao cônjuge sobrevivente via testamento.

Existem alguns pontos de atenção em determinadas situações que, comumente, preveem cláusula de JTWRS como, por exemplo, na constituição de uma Private Investment Company (PIC), situação em que o detentor dos recursos a serem incorporados na sociedade deseja incluir seus herdeiros como acionistas. Nesta hipótese, caso a inclusão dos herdeiros na sociedade ocorra de forma gratuita, tal transferência de patrimônio sob a ótica brasileira estará sujeita à tributação do Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD). Porém, no momento do falecimento do instituidor da PIC, não teremos a tributação do ITCMD na divisão do bem em razão da ausência de lei complementar sob a perspectiva brasileira e na jurisdição onde está localizado o bem, conforme já mencionado, a transferência ocorrerá de forma automática.

Ainda, considerando o mesmo exemplo acima, caso os recursos destinados a compor o patrimônio da PIC sejam integralizados por cada um dos acionistas, não existirá a sujeição ao ITCMD devido à ausência de transmissão de participação a título gratuito.

Como visto, a definição de JTWRS deve ser cuidadosamente analisada considerando o patrimônio existente, regime de casamento, os interesses do (s) proprietário (s) do bem e o alinhamento dos aspectos sucessórios para evitar tributações indevidas e conflitos entre herdeiros no momento da sucessão.

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