Opinião

Inconstitucionalidade na lei que institui o piso salarial da enfermagem

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4 de outubro de 2022, 15h04

A Lei Federal nº 14.434, de 4 de agosto de 2022, que institui os pisos salariais nacional aos profissionais de enfermagem, é originária do Projeto de Lei nº 2.564, de 2020, de iniciativa do senador Fabiano Contarato (PT-ES). Sem adentrar no mérito político da matéria, é importante observar a inconstitucionalidade formal da referida lei federal, no tocante aos pisos salariais nacional instituídos aos profissionais de enfermagem da União, dos estados, do Distrito Federal, dos municípios e de suas autarquias e fundações, em razão do vício de iniciativa legislativa nela existente, o que será objeto de análise neste artigo.
 

Com a promulgação da Emenda Constitucional nº 124, de 14 de julho de 2022, foi acrescentado o § 12 ao artigo 198 à Constituição de 1988, pelo qual ficou estabelecido que, por meio de lei federal, poderiam ser instituídos pisos salariais nacional aos profissionais de enfermagem (enfermeiro, técnico de enfermagem, auxiliar de enfermagem e parteira) a serem observados tanto pela iniciativa privada, quanto pela União, pelos estados, pelo Distrito Federal, pelos municípios e, também, por suas autarquias e fundações:

"Art. 198. As ações e serviços públicos de saúde integram uma rede regionalizada e hierarquizada e constituem um sistema único, organizado de acordo com as seguintes diretrizes:
(…)
§ 12. Lei federal instituirá pisos salarias profissionais nacionais para o enfermeiro, o técnico de enfermagem, o auxiliar de enfermagem e a parteira, a serem observados por pessoas jurídicas de direito público e de direito privado".

Para fins de delimitação temática, o objeto de análise deste artigo se concentrará tão somente em relação a instituição dos pisos salariais nacional aos profissionais de enfermagem da administração pública direta e autárquica da União, estados, Distrito Federal e municípios.

A instituição desses pisos salariais nacional aos profissionais de enfermagem da União, dos estados, do Distrito Federal, dos municípios e de suas autarquias e fundações veio com a publicação da Lei Federal nº 14.434, de 4 de agosto de 2022, que acrescentou os artigos 15-B e 15-C à Lei Federal nº 7.498, de 25 de junho de 1986, que dispõe sobre a regulamentação do exercício da enfermagem e dá outras providências:

"Art. 15-B. O piso salarial nacional dos Enfermeiros contratados sob o regime dos servidores públicos civis da União, das autarquias e das fundações públicas federais, nos termos da Lei nº 8.112, de 11 de dezembro de 1990, será de R$ 4.750,00 (quatro mil setecentos e cinquenta reais) mensais.
Parágrafo único. O piso salarial dos servidores de que tratam os arts. 7º, 8º e 9º desta Lei é fixado com base no piso estabelecido no caput deste artigo, para o Enfermeiro, na razão de:
I – 70% (setenta por cento) para o Técnico de Enfermagem;
II – 50% (cinquenta por cento) para o Auxiliar de Enfermagem e para a Parteira.
Art. 15-C. O piso salarial nacional dos Enfermeiros servidores dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios e de suas autarquias e fundações será de R$ 4.750,00 (quatro mil setecentos e cinquenta reais) mensais.
Parágrafo único. O piso salarial dos servidores de que tratam os arts. 7º, 8º e 9º desta Lei é fixado com base no piso estabelecido no caput deste artigo, para o Enfermeiro, na razão de:
I – 70% (setenta por cento) para o Técnico de Enfermagem;

II – 50% (cinquenta por cento) para o Auxiliar de Enfermagem e para a Parteira".

Acontece que a Lei Federal nº 14.434 é originária do Projeto de Lei nº 2.564/2020, de iniciativa do senador Contarato, e, por isso, surge a seguinte questão: a referida lei seria formalmente inconstitucional por vício de iniciativa, ao dispor sobre o aumento de remuneração de cargos, funções ou empregos públicos na administração direta e autárquica, e, assim, contrariar a regra de reserva de iniciativa legislativa do presidente da República estabelecida no artigo 61, § 1º, inciso II, alínea "a", da Constituição de 1988?

A resposta para tal questão, portanto, necessita da compreensão de como a doutrina e a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal têm interpretado a regra do artigo 61, § 1º, inciso II, alínea "a", da Constituição de 1988, e, por outro lado, como o Senado Federal, a Câmara dos Deputados e o próprio presidente da República se pronunciaram sobre a constitucionalidade da iniciativa legislativa do Projeto de Lei nº 2.564/2020 no que se refere à instituição dos pisos salariais nacional aos profissionais de enfermagem da administração pública direta e autárquica da União, estados, Distrito Federal e municípios.

Cláusula de reserva de iniciativa do chefe do Poder Executivo
O termo iniciativa legislativa possui dois sentidos. O primeiro representa o ato processual pelo qual, mediante a respectiva proposta, deflagra-se no Poder Legislativo a abertura do devido processo legislativo correspondente a uma dada espécie normativa; o outro expressa a legitimidade conferida pela Constituição à determinadas pessoas, autoridades e órgãos do Estado para propor ao Poder Legislativo a formação de determinada espécie normativa.

A chamada cláusula constitucional de reserva de iniciativa legislativa ao chefe do Poder Executivo é cunhada no artigo 61, § 1º, incisos I e II, da Constituição de 1988, e, mais especificamente na alínea "a" do inciso II, quando a matéria da proposta de lei versar sobre o aumento de despesas com pessoal da administração pública direta e autárquica, nos seguintes termos:

"Art. 61. (…).
§ 1º. São de iniciativa privativa do Presidente da República as leis que:
I – fixem ou modifiquem os efeitos das Forças Armadas;
II – disponham sobre:

a) criação de cargos, funções ou empregos públicos na administração direta e autárquica ou aumento de sua remuneração;".

O artigo 64 da Constituição de 1988 estabelece, ainda, que a proposta de lei de iniciativa do presidente da República terá início na Câmara dos Deputados:

"Art. 64. A discussão e votação dos projetos de lei de iniciativa do Presidente da República, do Supremo Tribunal Federal e dos Tribunais Superiores terão início na Câmara dos Deputados".

Em sede de controle de constitucionalidade, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal desde há muito tempo tem confirmado, de forma reiterada em seus julgados, que a iniciativa de lei sobre a instituição de pisos salariais para cargos, funções ou empregos públicos na administração direta e autárquica cabe privativamente ao chefe do Poder Executivo, conforme demonstrado a seguir:

"- REPRESENTAÇÃO POR INCONSTITUCIONALIDADE. MAGISTERIO. PISO SALARIAL. EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 26, DE 28.6.87, DO ESTADO DE MINAS GERAIS. – EMENDA QUE FIXA PISO SALARIAL PARA OS INTEGRANTES DO MAGISTERIO, DE ACORDO COM SEU GRAU DE ESCOLARIDADE. MATÉRIA CUJO DOMÍNIO E O DA LEI ORDINARIA, E ONDE O PROCESSO LEGISLATIVO SÓ PODE SER DEFLAGRADO POR INICIATIVA DO CHEFE DO GOVERNO. REPRESENTAÇÃO PROCEDENTE.
(Rp 1.464, relator(a): FRANCISCO REZEK, Tribunal Pleno, julgado em 7/4/1988, DJ 12-05-1988 PP-11198, EMENT VOL-01501-01 PP-00046)". Negritos acrescentados.

"AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE — CONSTITUIÇÃO DO ESTADO DE ALAGOAS (ART. 55, XII), — SERVIDOR PÚBLICO — HABILITAÇÃO PROFISSIONAL ESPECIFICA — PISO SALARIAL PROFISSIONAL — MECANISMO DE REAJUSTE AUTOMÁTICO DE VENCIMENTOS — MEDIDA CAUTELAR DEFERIDA.
A fixação, pela Constituição do Estado, do salário mínimo profissional como piso salarial para certas categorias de servidores públicos cria um mecanismo de reajuste automático de vencimentos que parece afetar o postulado da separação de poderes, por inobservância da cláusula de iniciativa reservada para a instauração do necessário processo legislativo. Mais do que isso, essa vinculação condicionante da remuneração devida a certas categorias funcionais também parece vulnerar o próprio princípio federativo, que não tolera a subordinação da politica salarial referente ao funcionalismo público local a variação de indices fixados pela União.

(ADI 668 MC, relator(a): CELSO DE MELLO, Tribunal Pleno, julgado em 27/3/1992, DJ 19-06-1992 PP-09519, EMENT VOL-01666-01 PP-00047 RTJ VOL-00141-01 PP-00077)".

"EMENTA: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI Nº 37/92, DO ESTADO DO AMAZONAS. FIXAÇÃO DE SALÁRIO MÍNIMO PROFISSIONAL E CONCESSÃO DE GRATIFICAÇÃO A SERVIDOR PÚBLICO. INICIATIVA PARLAMENTAR. VÍCIO FORMAL. VIOLAÇÃO DO DISPOSTO NO ARTIGO 61, § 1º, II, a, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL.
A Lei amazonense nº 37/92, que dispõe sobre salário mínimo profissional de servidor público do Estado, diplomado em Engenharia, Arquitetura ou Agronomia, e cria gratificações, tendo sido votada e aprovada mediante iniciativa parlamentar, padece do vício formal de inconstitucionalidade por usurpação da competência privativa do Chefe do Poder Executivo para desencadear o processo legislativo referente a tais proposições (CF/88, artigo 61, § 1º, II, a). Ação Direta de Inconstitucionalidade julgada procedente.

(ADI 840, relator(a): MAURÍCIO CORRÊA, Tribunal Pleno, julgado em 15/10/1998, DJ 12-03-1999 PP-00002, EMENT VOL-01942-01 PP-00075)". Negritos acrescentados.

"EMENTA: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. MEDIDA CAUTELAR. CONVERSÃO EM JULGAMENTO DE MÉRITO. LEI 6.633/2015 DO ESTADO DO PIAUÍ QUE DISPÕE SOBRE O PISO SALARIAL DOS FISIOTERAUPETAS E TERAPEUTAS OCUPACIONAIS. DIREITO DO TRABALHO. EXTRAPOLAÇÃO DOS LIMITES DA DELEGAÇÃO DA COMPETÊNCIA LEGISLATIVA CONFERIDA PELA UNIÃO AOS ESTADOS POR MEIO DA LEI COMPLEMENTAR 103/2000. OFENSA AO ARTIGO 22, I E PARÁGRAFO ÚNICO DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. INCONSTITUCIONALIDADE FORMAL. PROCEDÊNCIA DO PEDIDO.
1. A jurisprudência desta Corte firmou-se no sentido de que a extrapolação dos limites da competência legislativa delegada pela União aos Estados e ao Distrito Federal, nos termos do art. 22, I e parágrafo único, representa a usurpação de competência legislativa da União para legislar sobre direito do trabalho e, consequentemente, a inconstitucionalidade formal da lei.
2. Lei estadual de iniciativa parlamentar extrapola os limites da delegação legislativa da competência legislativa privativa da União conferida aos Estados e ao Distrito Federal por meio Lei Complementar 103/2000, a qual reserva a iniciativa ao Poder Executivo de projeto de lei que visa instituir piso salarial para os empregados que não tenham piso salarial definido em lei federal, convenção ou acordo coletivo de trabalho.
3. Ação direta de inconstitucionalidade julgada procedente.

(ADI 5.344, relator(a): EDSON FACHIN, Tribunal Pleno, julgado em 11/10/2018, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-256, DIVULG 29-11-2018, PUBLIC 30-11-2018)". Negritos acrescentados.

Logo, tanto a doutrina constitucionalista quanto a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal reconhecem que o vício de iniciativa parlamentar, nesse caso de lei federal que institui piso salarial a servidores públicos da administração direta e autárquica, configura inconstitucionalidade formal e não passível de ser sanada nem mesmo pela sanção presidencial:

"A violação à reserva de iniciativa revela conduta inconstitucional que não pode sequer ser convalidada com a sanção do chefe do executivo se a iniciativa invadida era dele." (CUNHA JÚNIOR, 2008, pág. 909).
"EMENTA: MEDIDA CAUTELAR EM AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. IMPUGNAÇÃO DA LEI Nº 12.354, DE 04.12.98, DO ESTADO DO PARANÁ, QUE DEU NOVA REDAÇÃO AO § 1º DO ARTIGO 10 DA LEI Nº 7.051, DE 04.12.78, AMPLIANDO AS EXCEÇÕES À RESERVA DE EXCLUSIVIDADE DE NOMEAÇÃO DOS SERVIDORES DO GRUPO OPERACIONAL 'TAF' PARA OS CARGOS EM COMISSÃO NO ÂMBITO DA COORDENAÇÃO DA RECEITA DO ESTADO. ALEGAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE FORMAL, POR VÍCIO DE INICIATIVA, E MATERIAL, POR OFENSA AO ARTIGO 37, II E V, DA CONSTITUIÇÃO.
1. Os partidos políticos com representação no Congresso Nacional têm legitimidade ativa universal para propor ação direta de inconstitucionalidade, não incidindo, portanto, a condição da ação relativa à pertinência temática.
2. Inconstitucionalidade formal reconhecida em face do vício de iniciativa da Lei impugnada, de origem parlamentar, que não é convalidado nem mesmo pela sanção do Chefe do Poder Executivo. Precedentes.
3. Não reconhecimento de inconstitucionalidade material em face do artigo 37, II e V, no superficial exame cabível em juízo liminar. Ressalva de hipótese prevista no texto constitucional: ADIMC nº 1.791-PE.
4. Medida cautelar deferida para suspender a eficácia da lei impugnada, com efeito ex nunc, até o final julgamento da ação direta.

(ADI 1.963 MC, relator(a): MAURÍCIO CORRÊA, Tribunal Pleno, julgado em 18/3/1999, DJ 07-05-1999 PP-00001 EMENT VOL-01949-01 PP-00036)". Negritos acrescentados.

Como se pronunciaram Senado, Câmara e Executivo
Na ordem constitucional brasileira o controle de constitucionalidade preventivo, aquele que acontece antes da promulgação da espécie normativa, é exercido pelo Poder Legislativo através das respectivas Comissões de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados e do Senado, bem como pelo Poder Executivo no exercício da sua prerrogativa de veto (cf. artigo 66, § 1º, da Constituição de 1988).

O Senado como casa iniciadora do processo legislativo, em Parecer nº 317, de 2021-PLEN/SF (BRASIL, 2020), se pronunciou do seguinte modo sobre a constitucionalidade do Projeto de Lei nº 2.564/2020:

"A instituição de pisos salariais para empregados celetistas insere-se no campo temático do Direito do Trabalho. Normas com esse conteúdo estão entre aquelas de iniciativa comum, prevista no art. 61 da Constituição Federal. Cabe ao Congresso Nacional legislar sobre o tema, nos termos do art. 48 da mesma Carta. Dadas as circunstâncias notórias de pandemia, a matéria é submetida diretamente ao Plenário desta Casa.
Observados esses pressupostos, em seu aspecto trabalhista, a proposta não apresenta vícios de natureza constitucional, nem de ilegalidade. Tampouco apresenta problemas regimentais ou de técnica legislativa.
No que se refere aos servidores da União, Estados, Distrito Federal e Municípios, suas autarquias e fundações, precisamos iniciar um grande projeto nacional de valorização dos profissionais de saúde. Cremos que, a exemplo do que foi feito em relação aos professores, com a Lei nº 11.738, de 16 de julho de 2008, que instituiu 'o piso salarial profissional nacional para os profissionais do magistério público da educação básica', o momento é oportuno para que Enfermeiros, Técnicos e Auxiliares em Enfermagem e Parteiras recebam a devida valorização. Nesse sentido, a União pode instituir mecanismos de compensação aos entes menos favorecidos econômica e fiscalmente".

Em que pese o acerto da análise da constitucionalidade sobre a iniciativa geral em relação a instituição de pisos salariais aos profissionais da enfermagem contratados sob o regime celetista, o mesmo não pode ser dito para o caso dos servidores públicos da União, dos estados, do Distrito Federal, dos municípios e de suas autarquias e fundações, ante a expressa previsão constitucional de iniciativa ser privativa ao presidente da República (cf. artigo 61, § 1º, inciso II, alínea "a", da Constituição).

Na condição de casa revisora, a Câmara dos Deputados também se manifestou favoravelmente sobre a constitucionalidade do referido projeto de lei em relação a iniciativa parlamentar (BRASIL, 2021), nos seguintes termos:

"II.3. Pressupostos de constitucionalidade
Observamos que inexiste qualquer objeção quanto aos pressupostos de constitucionalidade do Projeto de Lei nº 2.564, de 2020, bem como dos projetos apensados.

As proposições atendem aos preceitos constitucionais formais concernentes à competência legislativa da União, às atribuições do Congresso Nacional e à legitimação de iniciativa parlamentar, nos exatos termos dos artigos 22, inciso I; 48; 59, inciso III; e 61, todos da Constituição da República".

Já o presidente da República nada mencionou sobre a constitucionalidade ou não da iniciativa parlamentar, conforme a Mensagem nº 439, de 4 de agosto de 2022 (BRASIL, 2022), na qual foi encaminhada ao Congresso Nacional as razões do veto apenas ao Artigo 15-D da Lei nº 7.498, de 25 de junho de 1986 (que estabelecia o Índice Nacional de Preços ao Consumidor — INPC para atualização anual dos piso salarial).

Conclusão
Certamente que o modelo de Estado constitucional e democrático de direito, pautado no princípio da separação dos poderes como um de seus pilares, tem no estabelecimento de normas constitucionais sobre o processo legislativo uma importante garantia de limitação ao exercício arbitrário ou irresponsável do poder político através do Estado.

Dito isso, tem-se por ilegítima a atividade legislativa do Estado que não respeita as regras constitucionais sobre o processo legislativo.

É manifesto o equívoco cometido pelo Senado Federal, como casa iniciadora do Projeto de Lei nº 2.564/2020, ao admitir a constitucionalidade da iniciativa parlamentar para a instituição de pisos salariais nacional aos profissionais de enfermagem da administração pública direta e autárquica da União, estados, Distrito Federal e municípios, sob o argumento de estar legislando sobre matéria de direito do trabalho, conforme o artigos 22, inciso I; 48 e 61 da Constituição de 1988.

Com efeito, ao tratar sobre pisos salariais nacional para todos os profissionais da enfermagem a serem observados tanto pelas pessoas jurídicas de direito privado quanto pelas pessoas jurídicas de direito público, o Senado não legislou tão somente sobre matéria de direito do trabalho, mas também sobre o aumento de remuneração de cargos, funções ou empregos públicos na administração direta e autárquica da União, dos Estado, do Distrito Federal e dos municípios, o que é matéria de iniciativa reservada ao Presidente da República, nos termos do artigo 61, § 1º, inciso II, alínea "a", da Constituição.

E como matéria de iniciativa legislativa reservada ao presidente da República o Projeto de Lei nº 2.564/2020, que deu origem a Lei Federal nº 14.434, não poderia ter iniciado no Senado, mas sim na Câmara dos Deputados, de acordo com a redação do artigo 64 da Constituição de 1988.

Por essas razões, conclui-se pela inconstitucionalidade formal da Lei Federal nº 14.434, de 4 de agosto de 2022, por vício de iniciativa legislativa parlamentar.


Referências:
BRASIL. Câmara dos Deputados. Parecer de plenário pela(s) Comissão(ões) de Trabalho, Administração e Serviço Público, Seguridade Social e Família, Finanças e Tributação e Constituição e Justiça e Cidadania ao Projeto de Lei Nº 2.564, de 2020. Relatora: deputada federal Carmem Zanotto. Brasília, DF: Câmara dos Deputados, 2021. Disponível em https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra?codteor=2164558. Acesso em 11 set. 2022.

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil, de 05 de outubro de 1988. Brasília, DF: Presidência da República, 1988. Disponível em: http://planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 11 set. 2022.

BRASIL. Emenda Constitucional nº 124, de 14 de julho de 2022. Institui o piso salarial nacional do enfermeiro, do técnico de enfermagem, do auxiliar de enfermagem e da parteira. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/Emendas/Emc/emc124.htm. Acesso em: 11 set. 2022.

BRASIL. Lei nº 14.434, de 4 de agosto de 2022. Altera a Lei nº 7.498, de 25 de junho de 1986, para instituir o piso salarial nacional do Enfermeiro, do Técnico de Enfermagem, do Auxiliar de Enfermagem e da Parteira. Brasília, DF: Presidência da República, 2022. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2019-2022/2022/Lei/L14434.htm. Acesso em: 11 set. 2022.

BRASIL. Lei nº 7.498, de 25 de junho de 1986. Dispõe sobre a regulamentação do exercício da enfermagem, e dá outras providências. Brasília, DF: Presidência da República, 1986. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L7498.htm. Acesso em: 11 set. 2022.

BRASIL. Mensagem nº 439, de 4 de agosto de 2022. Brasília, DF: Presidência da República, 2022. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2019-2022/2022/Msg/Vep/VEP-439-22.htm. Acesso em: 12 set. 2022.

BRASIL. Senado Federal. Parecer nº 317, de 2021-PLEN/SF. De Plenário, sobre o Projeto de Lei nº 2.564, de 2020, do senador Fabiano Contarato, que altera a Lei nº 7.498, de 25 de junho de 1986, para instituir o piso salarial nacional do enfermeiro, do técnico de enfermagem, do auxiliar de enfermagem e da parteira. Relatora: senadora Zenaide Maia. Brasília, DF: Senado Federal, 2020. Disponível em: https://legis.senado.leg.br/sdleg-getter/documento?dm=9043103&ts=1660243558123. Acesso em: 11 set. 2022.

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 840. Relator: min. Maurício Côrrea, publicado em 12/3/1999. Disponível em: https://jurisprudencia.stf.jus.br/pages/search/sjur110886/false. Acesso em: 13 set. 2022.

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 5344. Rel.: min. Edson Fachin, publicado em 30/11/2018. Disponível em: https://jurisprudencia.stf.jus.br/pages/search/sjur395462/false. Acesso em: 13 set. 2022.

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Medida Cautelar na Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 668. Rel: min. Celso de Mello, publicado em 19/6/1992. Disponível em: https://jurisprudencia.stf.jus.br/pages/search/sjur116882/false. Acesso em: 13 set. 2022.

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Medida Cautelar na Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 1963. Rel.: min. Maurício Côrrea, publicado em 7/5/1999. Disponível em: https://jurisprudencia.stf.jus.br/pages/search/sjur108831/false. Acesso em: 13 set. 2022.

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Representação nº 1464. Rel.: min. Francisco Rezek, julgado em 7/4/1988. Disponível em: https://jurisprudencia.stf.jus.br/pages/search/sjur115559/false. Acesso em: 13 set. 2022.

CUNHA JÚNIOR, Dirley. Curso de direito constitucional. 2ª ed. Salvador: Editora JusPODIVM, 2008.

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