Opinião

Responsabilidade pelo pagamento do ICMS da energia em Goiás

Autor

  • Marília Tofollis de Melo

    é advogada tributarista em Rodovalho Advogados bacharela em Direito pela UFG (Universidade Federal de Goiás) especialista em Direito Tributário pelo Ibet e especialista em ICMS pelo Ipog.

26 de novembro de 2022, 17h06

Para o regular funcionamento do setor elétrico brasileiro diversas atividades são combinadas para permitirem o fornecimento de energia elétrica ao consumidor final. A primeira delas é a atividade de geração, que consiste na transformação de outras formas de energia em energia elétrica. Em seguida, a energia produzida tem de ser transportada em altíssima tensão desde as geradoras até as subestações distribuidoras, transporte esse que se denomina transmissão. Chega-se, então, à atividade de distribuição, que envolve a ramificação para o recebimento da energia das redes de transmissão e sua disponibilização ao consumidor em tensão reduzida através de redes de distribuição.

Por fim, a comercialização dessa energia gerada pode ocorrer juntamente com a atividade de distribuição pelas próprias distribuidoras aos consumidores cativos e aos consumidores livres ou de modo isolado pelas geradoras diretamente ou pelas comercializadoras aos consumidores livres de energia, no chamado Ambiente Livre de Contratação ou Mercado Livre.

Até passado recente, a energia elétrica era produzida e distribuída por empresas sob regime de concessão estatal aos consumidores finais, que a elas estavam cativos, não podendo, destarte, negociar os preços praticados. A possibilidade surgiu para os grandes consumidores, que passaram a negociar livremente o preço da energia elétrica no Ambiente Livre de Contratação, podendo adquirir o produto de quem lhes desse maiores vantagens econômicas.

Para fins de tributação do ICMS-Energia Elétrica, o sujeito passivo direto dessa relação jurídico-tributária é o consumidor final, ou seja, o destinatário da energia elétrica. Contudo, usualmente essa responsabilidade é transferida para algum outro ator econômico envolvido nessa cadeia.

Em Goiás, o deslocamento da sujeição passiva é situação problemática que tem gerado inúmeras autuações e questionamentos judiciais. O Decreto nº 7.815/12 inseriu no Anexo VIII do RCTE/GO o artigo 30-A que atribui ao adquirente da energia elétrica no Ambiente Livre de Contratação a condição de o substituto tributário do recolhimento do ICMS-Energia Elétrica.

Acontece que uma série de impropriedades técnicas, ilegalidades e inconstitucionalidades circundam esse artigo 30-A do RCTE. A primeira e mais evidente delas é a previsão legal no Código Tributário do Estado de Goiás, Lei nº 11.651/91, de que a distribuidora de energia elétrica é que seria a substituta tributária das operações com energia elétrica.

Há severa reserva de ilegalidade no Decreto nº 7.815/12 por conflitar com dispositivo de lei em sentido estrito do CTE/GO e por atribuir substituição tributária por meio de decreto. Isso porque o Convênio nº 77/11 que autorizou a instituição de substituição tributária deveria ter sido apreciado pela Assembleia Legislativa do Estado de Goiás, que detém a competência exclusiva para análise de acordos e convênios firmados pelo Estado, e internalizado por meio de lei, conforme artigo 11, inciso IX da Constituição Estadual.

Importa considerar que não apenas a determinação de quem é o contribuinte depende de lei em sentido estrito, dada a reserva legal absoluta imposta direta e expressamente pelo art. 150, I, da Constituição Federal, como também o deslocamento da obrigação principal a um substituto tributário.

Nesse sentido são as decisões proferidas pelo Supremo Tribunal Federal nas ADI's 6.624, 6.144 e 4.281, com merecido destaque às considerações colacionadas pela redatora do acórdão, ministra Cármen Lúcia, que citando a ministra Ellen Gracie, consignou "Se admitíssemos a instituição de substituição tributária mediante ato infralegal, estaríamos permitindo que o Executivo deixasse de exigir o cumprimento da norma legal que definira o contribuinte e que o obrigara ao pagamento do tributo".

Nesse espectro, pode-se afirmar, com veemência, que existem cabais ilegalidades e inconstitucionalidades permeando o artigo 30-A do Anexo VIII do RCTE/GO ao (re)atribuir a responsabilidade do recolhimento do ICMS-Energia Elétrica ao destinatário final.

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