Com empate, STJ suspende decisão sobre suspensão de segurança em tema penal
16 de novembro de 2022, 21h37
Por causa da ausência justificada de quatro ministros integrantes da Corte Especial, o Superior Tribunal de Justiça suspendeu nesta quarta-feira (16/11) o julgamento que vai decidir o cabimento da suspensão de segurança em casos criminais.
A suspensão de segurança é o pedido cabível contra liminares concedidas em mandados de segurança nas ações movidas contra o poder público ou seus agentes. Seu deferimento permanece válido até o trânsito em julgado da ação principal.
Essa contracautela só pode ser invocada para evitar grave lesão à ordem, à saúde, à segurança e à economia públicas. A competência para decidir se a liminar deve ser suspensa é do presidente do tribunal. No STJ, os recursos contra essa decisão são julgados pela Corte Especial.
O caso apreciado nesta quarta-feira dividiu o colegiado. Trata-se da ordem de bloqueio de R$ 18,6 milhões em ativos de uma empresa de medicina diagnóstica no âmbito de uma ação penal que investiga desvio de verbas destinadas ao combate à Covid-19 no Distrito Federal. Desse montante, R$ 10,2 milhões foram apreendidos em contas bancárias.
A pessoa jurídica seria o meio pelo qual seus sócios e funcionários, todos denunciados, teriam cometido fraudes em licitação e em contratos. A empresa ajuizou mandado de segurança no Tribunal Regional Federal da 1ª Região para levantar o bloqueio e liberar a verba.
No MS, a empresa alegou que não praticou crime e que os valores constritos têm origem lícita, razão pela qual estão ausentes os requisitos para sequestro judicial. A desembargadora Maria do Carmo Cardoso concedeu a segurança em 17 de dezembro de 2021.
O Ministério Público do DF, então, ajuizou a suspensão de segurança. Apenas seis dias depois, o então presidente do STJ, ministro Humberto Martins, deferiu o pedido liminarmente porque a liberação do valor poderia causar grave risco à saúde e à economia. Ele entendeu que estava presente o risco de não ressarcimento aos cofres públicos de valores destinados à saúde do Distrito Federal.
Até o momento, outros quatro ministros acompanharam essa posição: Nancy Andrighi, Herman Benjamin, Francisco Falcão e Raul Araújo. Para eles, a suspensão de segurança é cabível no âmbito de processos criminais em situações excepcionais, como no caso.
Abriu a divergência o ministro João Otávio de Noronha, para quem não cabe a suspensão. Ele foi acompanhado por outros quatro ministros: Laurita Vaz, Maria Thereza de Assis Moura, Mauro Campbell e Benedito Gonçalves.
O julgamento foi interrompido porque o ministro Luis Felipe Salomão estava ausente para participar de compromisso como corregedor Nacional de Justiça, e porque outros três magistrados precisaram se ausentar ao final da sessão: Og Fernandes, Paulo de Tarso Sanseverino e Maria Isabel Gallotti.
Esse processo está em julgamento desde 16 de março e já passou por dois pedidos de vista — o que tornou a vista coletiva. Presidiu o julgamento o ministro Jorge Mussi.
Não cabe
O cabimento da suspensão de segurança em processos criminais é contestado porque não está previsto na Lei 8.437/1992, nem no Regimento Interno do STJ. Além disso, seu juízo é eminentemente político: a suspensão só pode ser pedida em favor do Estado — o que, no processo penal, significa atender à acusação.
Há precedentes no Supremo Tribunal Federal que admitem a suspensão de segurança em temas penais. Os mais recentes são altamente controversos, alvos de críticas na comunidade jurídica: as decisões do ministro Luiz Fux na presidência do STF nos casos do júri da Boate Kiss e do HC que soltou o traficante André do Rap.
Para a divergência inaugurada pelo ministro Noronha, esses são casos terríveis e merecem censura pelo uso da suspensão. Neles, a canetada da presidência do STF significou a suspensão da liberdade dos réus. Abrir esse precedente, em sua avaliação, seria temerário.
Segundo ele, a suspensão de segurança só serve para casos cíveis ou administrativos porque tem caráter político e escopo de preservar a máquina pública. Mesmo que, na origem, o MP-DF impute a prática de crimes contra a administração pública, não serve para ser aplicada em matéria penal.
"Sentenças penais são individuais. Então, é preciso tomar muito cuidado com a delicadeza dessas decisões. O tema é muito delicado e importa em criar instrumento de restrição à liberdade por decisão monocrática de presidente de tribunal. Isso me preocupa", disse ele ainda em março, quando o processo começou a ser julgado pela Corte Especial.
Ao votar na mesma linha, a ministra Maria Thereza de Assis Moura entendeu que não há fundamento para considerar o caso excepcionalíssimo, a menos que se considere a empresa culpada antes mesmo do julgamento de mérito nas instâncias ordinárias. "Aqui, o Ministério Público usa a suspensão de segurança como sucedâneo de recurso."
Cabe, sim
Se é possível a suspensão de segurança em casos excepcionalíssimos, então o STJ também pode usá-la, segundo o ministro Humberto Martins. Em voto-vista lido em abril, a ministra Nancy Andrighi afirmou que o caso gera o risco de prejuízo milionário para o setor público da saúde no DF.
É nesse ponto que reside a excepcionalidade para a suspensão de segurança: ela mantém o bloqueio dos valores para permitir a futura recomposição dos cofres públicos, caso haja condenação no processo criminal.
"Se esses recursos forem desbloqueados, eles não retornarão", resumiu o ministro Herman Benjamin nesta quarta. Para ele, o uso do mandado de segurança foi o meio que a empresa encontrou para "atropelar a ordem das coisas no processo penal". "Por um milagre esses valores não foram levantados", criticou.
Ao acompanhar o relator, o ministro Raul Araújo seguiu a mesma linha e acrescentou que, "se cabe mandado de segurança em matéria penal, cabe a suspensão de segurança, pois é inerente ao regime processual especial do mandado de segurança".
SS 3.361
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