Cruzadas eleitorais

Trump e DeSantis disputam posição de enviado de Deus para governar os EUA

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9 de novembro de 2022, 7h51

Antes mesmo de concluídas as eleições de 2022, o ex-presidente Donald Trump e o governador da Flórida, Ron DeSantis, que concorre à reeleição no momento, já começaram a disputar o voto cristão-evangélico-branco para a eleição presidencial de 2024. Ambos são republicanos, de forma que a disputa se refere às eleições primárias, em que o candidato do partido para concorrer à Presidência será escolhido.

Isac Nóbrega/PR
Donald Trump leva vantagem por cortejar os evangélicos há mais tempo do que o rival
Isac Nóbrega/PR

DeSantis começou a fazer o que Trump já faz há muito tempo: formar alianças com pastores evangélicos, que propagam a mensagem de que um ou outro é o enviado de Deus para governar os Estados Unidos, e é a figura messiânica que vai salvar o país da esquerda satânica e de forças demoníacas (tais como as que promovem liberalismo, direitos civis, direitos dos LGBTs, direito ao aborto e o "deep state" – enfim, é "O Salvador" ("The Savior").

("Deep State" é uma expressão que define uma organização influente ou órgãos governamentais que estariam envolvidos em "manipulações secretas" ou "controle de políticas governamentais". Desde que se tornou presidente, Trump usou muitas vezes essa expressão para se referir ao FBI e outros órgãos de investigação, que acusava de promover uma "caça às bruxas" sempre que era investigado por alguma má-conduta).

Um novo vídeo voltado para a base evangélica da direita — ou aos evangélicos brancos, porque os negros tendem a votar em democratas — declara que "DeSantis foi ungido por Deus para salvar o país, nessa conjuntura crítica". Porém, Trump também "foi ungido por Deus", diz a concorrência. E o ex-presidente, que costuma atribuir apelidos pejorativos a seus adversários, chamou DeSantis e DeSanctimonious em comício recente ("sanctimonious" significa hipócrita, farisaico, santimonial ou santarrão).

A mensagem que DeSantis está enviando a seus possíveis eleitores é a de que a "América" (como os "americanos" se referem aos Estados Unidos da América) "foi fundada como uma nação cristã". E que os crentes devem vestir a "armadura de Deus para lutar contra as forças da esquerda" — em substituição à expressão bíblica "forças do mal", segundo o site Raw Story.

Porém, Trump leva uma ampla vantagem nessa corrida pelas almas evangélicas, pois começou a cortejá-las desde sua primeira campanha eleitoral, pregando tudo o que queriam ouvir. E continuou a fazê-lo durante todo seu governo, convidando grupos de pastores para rezar na Casa Branca e pousando com uma Bíblia na mão para uma foto oficial.

E saiu bem mais forte na corrida para 2024. Já em janeiro de 2021, logo depois da invasão do Congresso por seus seguidores, o pastor evangélico Kim Clement e um grupo de aliados de Trump criaram um roadshow (um espetáculo itinerante), que chamam de "The Great Re-Awakening Tour" (algo como "turnê do grande renascimento"), para pregar o "evangelho de Trump".

Uma gravação diz: "Há um homem com o nome de Donald. Deus disse: você foi determinado, através de suas preces, para influenciar a nação. Vou abrir essa porta que você pediu e, quando chegar o tempo da eleição, você será eleito".

Em um novo clipe, Clement diz a cerca de três mil pessoas em um auditório lotado, muitos com os braços levantados e os olhos fechados em oração, que canaliza a palavra de Deus: "Escutem-me, porque encontrei um homem no meu próprio coração e ele está entre vocês. Ele é um dos irmãos, mas foi escolhido para a Presidência dos Estados Unidos da América", segundo "testemunho" de um repórter do jornal The Guardian.

A audiência vibra quando uma imagem de Deus irradia a tela e se ouve: "Ouçam-me, hoje. Eu tenho tudo planejado. Encontrei um homem que irá restaurar o destino de Sião".

Durante dois dias, os crentes, que pagaram até US$ 500 por um ingresso vip, ouvem os aliados de Trump, como Michael Flynn, o "general da América" que foi condenado e preso, mas perdoado por Trump, e o empresário Mike Lindell, que discursa que forças estrangeiras estão se infiltrando nas urnas eletrônicas para subverter as eleições nos EUA. E ouvem o filho de Trump, Eric, que usa o celular para transmitir uma mensagem do ex-presidente ao vivo.

Um apresentador anuncia que está em curso a luta do bem contra o mal. E pergunta: "Quantos de vocês acreditam que Jesus é o rei e que Donald Trump é o presidente?", perpetuando a chamada "grande mentira" de que Trump ganhou a eleição de 2020, mas ela foi roubada em favor de Joe Biden, o atual presidente.

Nesses dois dias, os crentes também têm à disposição uma grande tenda de venda de produtos, que vão de camisetas com as cores da bandeira dos EUA e bonés com a inscrição "MAGA" (Make America Great Again), das campanhas de Trump, a óleo de cobra, que "melhora a saúde em nível celular".

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