Licitações e Contratos

O diálogo competitivo na Lei 14.133/21: regulamentação e prática

Autor

  • Jonas Lima

    é sócio de Jonas Lima Advocacia especialista em Direito Público pelo IDP especialista em compliance regulatório pela Universidade da Pensilvânia ex-assessor da Presidência da República (CGU).

11 de março de 2022, 8h00

Quase um ano após a promulgação da nova Lei de Licitações, a modalidade licitatória de diálogo competitivo teve menção ou tratamento em cerca de 200 regulamentações pelos estados, municípios e até entes do Poder Judiciário e do Poder Legislativo, tendo sido criadas comissões ou atribuídas às comissões de licitação e contratação a condução da nova modalidade licitatória.

Spacca
Mas a prática está demonstrando uma ausência quase completa de sua utilização, que teve como primeiro caso o Diálogo Competitivo n° 01/2021, do Ministério da Economia, com objetivo de contratação de solução para o desenvolvimento de medidas sustentáveis à eficiência energética dos prédios situados na Esplanada dos Ministérios.

O que explicaria o aparente "desuso" do diálogo competitivo até o presente momento?

Para entender melhor o cenário, é essencial revisar os termos da Lei nº 14.133/2021, que assim dispôs, em seu artigo 6º, inciso XLII: "(…) Diálogo competitivo: modalidade de licitação para contratação de obras, serviços e compras em que a Administração Pública realiza diálogos com licitantes previamente selecionados mediante critérios objetivos, com o intuito de desenvolver uma ou mais alternativas capazes de atender às suas necessidades, devendo os licitantes apresentar proposta final após o encerramento dos diálogos".

Em primeira análise, parece não se tratar de texto tão fechado em sua amplitude e isso também não fica perceptível pela mera inclusão dessa modalidade licitatória no rol do artigo 28, inciso V, da mesma lei.

Ocorre que o enquadramento detalhado, adiante, na mesma lei, traz as feições que o legislador idealizou para essa modalidade licitatória no Brasil:

"Artigo 32. A modalidade diálogo competitivo é restrita a contratações em que a Administração:
I – vise a contratar objeto que envolva as seguintes condições:
a) inovação tecnológica ou técnica;
b) impossibilidade de o órgão ou entidade ter sua necessidade satisfeita sem a adaptação de soluções disponíveis no mercado; e
c) impossibilidade de as especificações técnicas serem definidas com precisão suficiente pela Administração;
II – verifique a necessidade de definir e identificar os meios e as alternativas que possam satisfazer suas necessidades, com destaque para os seguintes aspectos:
a) a solução técnica mais adequada;
b) os requisitos técnicos aptos a concretizar a solução já definida;
c) a estrutura jurídica ou financeira do contrato;".

Analisando esse texto legal, percebe-se que, ao contrário do que ocorre nos Estados Unidos e em parte considerável dos países da Europa, entre eles Reino Unido, França e Alemanha, que permitem o uso dessa modalidade não apenas para parcerias público privadas (PPPs) e certos projetos particularmente complexos, mas também para outras demandas amplas dos entes públicos, o Brasil limitou o âmbito de sua aplicação.

De outro lado, pelo curso desse primeiro ano da nova Lei de Licitações, a Administração Pública continuou trilhando o caminho das audiências e das consultas públicas, aparentemente mais informais, flexíveis e rápidas que o procedimento do diálogo competitivo, previsto no artigo 32, §1º, da nova Lei de Licitações.

Ainda, seguindo a tendência iniciada em 2014, do uso do poder de compra do estado contra o desenvolvimento nacional sustentável, na verdade, como motor de concentração de mercados, sob o rótulo de contratações "centralizadas" (monopolizadas), que deixam mercados relevantes inteiros, por vários anos, "na mão" do "contratado único" (o próprio estado praticando ato com efeito que vai além daqueles da cartelização de mercado), essa via tem sido utilizada para alegada solução de problemas das demandas rotuladas como de grande porte, tudo em nome de "economicidade imediata", sem que se atente para os efeitos destrutivos disso a médio e longo prazo.

Parece mais fácil, enfim, fechar todo o mercado em licitações cada vez mais gigantescas e inacessíveis a pequenas, médias e até outras grandes empresas, alegando que isso trará a solução para uma determinada demanda, normalmente, com a propaganda de que a contratação X ou Y trará Z milhões de economia.

Em outra frente, as contratações com objetos ligados a "inovação", por sua vez, estão seguindo passos pelas outras normas já existentes no ordenamento jurídico brasileiro.

E como se depreende do contexto inicialmente ponderado, quanto à "impossibilidade de o órgão ou entidade ter sua necessidade satisfeita sem a adaptação de soluções disponíveis no mercado" e à "impossibilidade de as especificações técnicas serem definidas com precisão suficiente pela Administração", na prática, essas situações têm sido resolvidas com as consultas e as audiências públicas.

Enfim, parece estranho, mas o país importou determinado instituto interessante, teve uma onda de duas centenas de regulamentações com textos da lei federal copiados e colados, com alguns ajustes, mas a prática está indicando que, até o momento, essa nova modalidade de licitação parece ter sido colocada em desuso.

Esse é um primeiro diagnóstico, para o momento presente. Mas não se sabe o que vem adiante.

Autores

  • Brave

    é advogado especialista em licitações e contratos, pós-graduado em Direito Público pelo IDP e Compliance Regulatório pela Universidade da Pensilvânia e sócio do escritório Jonas Lima Sociedade de Advocacia.

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!