Quo vadis?

Comunidade jurídica comenta debate sobre deficiências do combate ao crime

Autor

7 de março de 2022, 14h26

Para onde deve caminhar o combate ao crime após a derrocada do modelo da "lava jato"? Foi para responder a essa pergunta que a ConJur convidou alguns dos principais nomes do Direito para um debate virtual nesta segunda-feira (7/3).

Participaram do evento o ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal; o procurador-geral da República, Augusto Aras; a desembargadora federal Simone Schreiber, do TRF-2; o advogado Walfrido Warde, autor do livro "O Espetáculo da Corrupção"; e o advogado Pierpaolo Bottini.

Na opinião de membros da comunidade jurídica ouvidos, o evento foi essencial para discutir um modelo mais eficiente e menos publicitário para enfrentar o crime no Brasil. Criticou-se, naturalmente, a adulteração do que seja o processo criminal, a espetacularização e o fato de, durante os anos recentes, ter-se dispensado a materialidade de provas para sustentar condenações.

O ex-advogado-geral da União Luís Inácio Adams comentou alguns dos principais pontos do seminário. "O evento, com tema atualíssimo e participação de importantes atores do cenário jurídico, mostrou que o sistema adotado pela 'lava jato' para combater o crime organizado e a corrupção é extremamente falho e ineficiente. A possibilidade de aperfeiçoamento da legislação é bem-vinda, mas existe um trabalho de alta relevância a ser feito na gestão do processo de investigação, como exemplificou com muita pertinência o procurador-geral da República, Augusto Aras", afirmou ele.

O advogado Lenio Streck destacou a importância da discussão para o momento vivido pelo Judiciário. "Trata-se de uma discussão que transcende o próprio tema da live. Eu dizia em 2014 que haveria um Direito ALJ ( antes da 'lava jato') e um Direito DLJ (depois da 'lava jato'). O Brasil está pagando muito caro pelo Direito DLJ. Resta saber se aprendemos com os erros do passado para saber como enfrentar esse direito que traz ainda vícios desse direito instrumentalizado por Moro e agentes do MPF. Fazendo uma paráfrase, o que fazer com o Direito 'mamãe falei'? Eis a questão. O programa transmitido pela ConJur começa a apontar caminhos!!!!", comentou.

Luiz Antonio Guimarães Marrey, ex-PGJ de SP, achou o tema muito amplo. "A impunidade dos homicídios começa com a Polícia Civil desaparelhada, com pouco efetivo em seus departamentos de homicídios, e policiais mal remunerados", opinou.

O criminalista André Callegari, por sua vez, acentuou a importância da discussão para que o sistema evite a repetição dos erros. "Importante o debate travado sobre o combate ao crime no pós-'lava-jato' porque demonstrou os desacertos da operação e os erros que não podemos repetir. Combater a corrupção significa respeitar os princípios constitucionais e assegurar a todos os mesmos direitos e garantias fundamentais".

"O bom combate se verbera pelo máximo respeito às regras. Não há Direito fora da ordem jurídica", fez coro Neri Júnior, desembargador do TRF-3.

Outro que celebrou a discussão foi o advogado Cristiano Zanin Martins, que passou anos denunciando os abusos da "lava jato" e, por isso, foi alvo de diversos ataques em sua atuação profissional. "Os expositores mostraram, com muita precisão, as mais variadas formas como os agentes da operação 'lava jato' colocaram em risco o Estado de Direito e, ainda, como usaram o poder de punir em benefício próprio, material e imaterial", comentou o advogado.

"De fato, foram inúmeras iniciativas que afrontaram o Direito, nacional e internacional, e que prejudicaram indevidamente pessoas, empresas e a própria imagem do sistema de Justiça e que, por isso, devem servir para uma reflexão densa e o aprimoramento dos sistemas de controle para que essa situação caótica jamais volte a ocorrer", completou ele.

Paulo Gustavo Gonet Branco, subprocurador-geral da República, também elogiou o evento. "Debate importante para aflorar as virtualidades relevantes do conceito de 'segurança' no processo contínuo de aprimoramento das ações das instituições no Estado democrático".

Para o advogado Henrique Ávila, ex-conselheiro do CNJ, o debate foi importante para jogar luz sobre um momento delicado do Judiciário brasileiro. "A desidratação da 'lava jato' mostrou que o Poder Judiciario e o MP sempre estiveram e continuam trabalhando contra o crime, independentemente da elevação de um ou outro personagem ao posto de herói."

O advogado Alexandre Wunderlich, por sua vez, acredita que a convergência das avaliações sobre o abuso da "lava jato" sinaliza um amadurecimento democrático e contribui para a construção de um processo penal justo.

"O modelo de justiça penal negocial é uma realidade e uma ferramenta essencial no tratamento da criminalidade empresarial e da corrupção, assim como é inexorável a necessidade do seu profundo aperfeiçoamento no Brasil. Escutar publicamente, do Procurador Geral da República, um reconhecimento pelas práticas erradas ocorridas no passado e um compromisso com a Constituição Federal, é o primeiro passo para o fiel cumprimento da legalidade", opinou. 

"O Supremo Tribunal Federal tem reconhecido excessos ocorridos em certos momentos da operação 'lava jato' e o Ministro Gilmar Mendes tem sido o porta-voz da defesa do cumprimento integral do sistema rígido de garantais constitucionais, materiais e instrumentais", completou o advogado.

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!