"Farinha do mesmo saco"

Em aviso para 2022, TSE pune por vídeo impulsionado com discurso negativo

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26 de maio de 2022, 13h24

A veiculação de vídeo com impulsionamento pago pelas redes sociais cujo conteúdo traga críticas indiretas e genéricas feitas por candidato a disputa eleitoral fere o parágrafo 3º do artigo 57-C da Lei das Eleições (Lei 9.504/1997), conduta que deve ser punida com multa.

Abdias Pinheiro/SECOM/TSE
TSE deve deixar claro que não vai aceitar impulsionamento de conteúdo negativo na na internet, disse ministro Alexandre
Abdias Pinheiro/SECOM/TSE

Com esse entendimento, o Tribunal Superior Eleitoral manteve a condenação imposta ao deputado federal Heitor Freire (PSL), que concorreu à prefeitura de Fortaleza em 2020, pelo uso indevido de propaganda eleitoral impulsionada na internet.

O julgamento foi resolvido por maioria de votos, a partir do voto divergente do ministro Alexandre de Moraes, em um claro alerta para as candidaturas das eleições de 2022. A previsão de uma corrida eleitoral tensa permeou os votos que formaram a maioria.

No vídeo, Freire aparecia em uma feira livre fazendo referência à oferta do produto farinha na cidade de Fortaleza, com repetição do termo "tudo farinha do mesmo saco". O Tribunal Regional Eleitoral do Ceará aplicou multa de R$ 18 mil pelo uso do conteúdo para atacar opositores.

Relator no TSE, o ministro Carlos Horbach observou que, embora o parágrafo 3º do artigo 57-C da Lei das Eleições restrinja o uso do impulsionamento de conteúdo na internet para promover ou beneficiar candidatos ou suas agremiações, a interpretação do tribunal cearense foi exagerada.

Isso porque a fala sobre "farinha do mesmo saco" não é suficiente para configurar dizeres em desfavor dos adversários, os quais sequer são nomeados. "A mensagem, apesar de irônica, destacou o recorrente como a melhor opção. Não há propaganda eleitoral", concluiu o relator.

Abriu a divergência o ministro Alexandre de Moraes. Para ele, o conteúdo negativo está configurado, já que a propaganda não exalta as qualidades do candidato. Em vez disso, acaba por ofender os demais, ao qualifica-los como "farinha do mesmo saco".

A escolha desse termo faz referência, ainda, à classificação generalizada de "velha política" que foi usada pelas milícias digitais nas eleições de 2018 e 2020, segundo o voto divergente. "Não é um elogio. É propaganda dirigida a terceiros. Se não é elogio, é propaganda negativa", concluiu.

Rosinei Coutinho/SCO/STF
Ministro Ricardo Lewandowski citou preocupação do TSE com propaganda impulsionada artificialmente na internet
Rosinei Coutinho/SCO/STF

Recado para 2022
"Eu me preocupei muito com esse caso, porque estamos às vésperas do início de uma campanha eleitoral que promete ser animada, principalmente nas redes sociais. A Justiça Eleitoral deve fixar de maneira clara aos tribunais, juízes, partidos e candidatos que não vai admitir impulsionamento de propaganda eleitoral negativa", afirmou o ministro Alexandre.

O ministro Ricardo Lewandowski acompanhou a divergência, inclusive por uma questão de política judiciária, também de olho na campanha eleitoral que se avizinha. "Esta corte especializada tem uma especial preocupação com campanha feita de forma difamatória pela internet, sobretudo artificialmente impulsionada", citou.

Segundo o ministro Benedito Gonçalves, quando o candidato diz "farinha de outro saco", os eleitores locais sabem de quem está falando. O ministro Mauro Campbell concordou com a multa, apesar de não haver especificamente ofensa a outro (pessoa específica), mas a outrem (pessoa alheia à comunicação).

O ministro Sergio Banhos concordou com as análises. E o ministro Fachin completou afirmando que a fala tem caráter negativo porque vilipendia indistintamente todas as outras candidaturas. "Há uma distinção nítida quando assenta que determinado candidato é o novo, e os outros são a velha política. Isso carrega um juízo de valor. Em meu modo de ver, desborda àquele limite aceitável", afirmou.

A multa total a ser paga por Heitor Freire é de R$ 36 mil porque, no impulsionamento do vídeo, houve outra irregularidade: ele deixou de indicar o CNPJ da campanha ou CPF do candidato responsável, conforme exige o artigo 29, parágrafo 5º da Resolução 23.610/2019.

0600161-80.2020.6.06.0002

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