Opinião

O setor elétrico e a economia dos recursos descentralizados e distribuídos

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19 de maio de 2022, 17h00

O advento tecnológico inerente às novas formas de produzir (e consumir) energia nos dias atuais; a evolução da transição energética mundial; a necessária modernização setorial no Brasil e o liberalismo que privilegia a capilaridade das informações, bem como os recursos descentralizados e distribuídos.

Analisaremos como estes temas se entrelaçam.

Quando folheamos os jornais em busca das notícias sobre a transição da matriz energética no mundo não estamos apenas atrás de informação para aumentar nossa intelectualidade socialmente responsável; na realidade, o tema se mantém aquecido nas rodas de todos os setores energéticos pela sua relevância estratégica no mundo corporativo, pela crescente conscientização do uso racional dos recursos esgotáveis e pelo incremento das tecnologias que hoje permeiam os segmentos produtivos da economia.

Por isto, não causa estranheza a veiculação de que, até o final de 2021, foram acrescidos no planeta, quase 257 gigawatts (GW) de energias renováveis, aumentando a provisão desta modalidade em 9,1%, como mostra o levantamento apresentado no início de abril pela Agência Internacional de Energia Renovável (Irena, na sigla em inglês). O dado se revelou um pouco mais tímido do que aquele obtido em 2020, de 260 GW. Constou, então, como destaque a informação relativa à energia fotovoltaica que, sozinha, foi responsável por mais da metade do implemento das renováveis com um recorde de 133 GW, seguida por 93 GW de energia eólica, sendo 21 GW de geração offshore.

Entretanto, não nos apressemos em pular para as conclusões: a expressiva inserção de energia renovável que foi mencionada acima ainda não permite o pleno "abandono" da utilização dos combustíveis fósseis — notadamente por questões de segurança energética/confiabilidade sistêmica. E, se fosse tão simples, haveria que se descumprir relações jurídicas formalmente constituídas, implementar variantes expressivas no modelo setorial (termelétricas) e formatar outras premissas que abarcam, inclusive, interesses geopolíticos/estratégicos para algumas nações do globo. Sigamos.

Aportamos, assim, num aspecto importante (e sensível para discutir): modelagem x migração. Não é novidade que a estrutura setorial (enfocando, no momento, o caso brasileiro) já vem dando sinais de desgaste há tempos. E, não raro, observamos a consultoria especializada (notadamente daqueles egressos das escolas de engenharia e economia) dedicada em formular proposições com maior racionalidade econômica e competitividade. Como seria, por exemplo, a substituição da formação de preços por modelo pelos bids de geração. Contudo, como se daria a inserção responsável e segura dos elementos que foram expostos acima? Uma entrada mais vigorosa das energias limpas vis-à-vis o convívio com suas intermitências, já que não se pode inobservar a confiabilidade energética? E a correta alocação dos custos entre os ambientes de comercialização cativo e livre? A questão está longe de ser elementar. Abaixo, seguirão alguns insights:

Na temática jurídico-econômica, acessaremos a escola de pensamento que elege o cliente /adquirente como o agente soberano das relações de consumo: a escola austríaca de economia, dos eminentes Ludwig Von Mises, Carl Menger, Murray Rothbard e Friedrich Hayek.

Assim como tais pensadores, nos atina como razoável que qualquer modelo de atendimento ao consumidor deveria ter como foco principal as prementes necessidades do mesmo, oferecendo-lhe melhores opções de escolha entre prestadores de serviço, maior qualidade na entrega e valores mais atraentes a serem cobrados por tais.

Desta feita, embora já se vislumbre algumas iniciativas promissoras em sede legislativa no Brasil (p.ex. Projeto de Lei 414/21) — outrora devidamente implantadas em países mais desenvolvidos na abertura de seus mercados — ainda estamos, aproximadamente, 20 anos atrasados em relação a uma concepção de mercado liberalizado e com balanço alocativo condizente (entre os ambientes de comercialização).

Modelos de distribuição ideais (pujantes em energia renovável, devidamente recepcionados por uma ótima gama de geração distribuída) ainda não conversam com o número de 80 milhões de unidades consumidores brasileiros no mercado cativo de energia, ou seja, sob a tutela das distribuidoras.

Enquanto isso, o mercado livre brasileiro, embora com uma quantidade bem inferior de agentes, representa 32% de toda a energia consumida no país, segundo dados da Abraceel obtidos em seu sítio eletrônico.

Dessa forma, não é demasiado depreender que o principal problema apontado (alto engessamento) somente será superado com o tripé fundamental à implementação das cidades do futuro: universalização de eletricidade limpa e barata, inteligência coordenada das redes, bem como o desenvolvimento de novas tecnologias que tenham como foco principal o consumidor.

Apenas a título de ilustração da necessidade dessa corrida; quando a Aneel formulou a primeira normativa sobre geração distribuída (ainda em 2012), o consumidor conheceu o sistema de compensação de energia elétrica, possibilitando que cada cliente pudesse gerar sua energia a partir de fontes renováveis ou cogeração qualificada, exportando o excedente para rede de distribuição local. O modelo ganhou maturidade e hoje temos a Lei nº 14.300/22. Note-se: com dez anos de atraso, mas a agora, finalmente, temos a disciplina legal.

Pelo exposto, podemos concluir que o nosso país depende de uma aceleração tecnológica, abertura expressiva do mercado — até mesmo para criar um ambiente mais competitivo — que, inevitavelmente irá abrandar os preços e, assim, privilegiar o consumidor.

É possível ver boas sinalizações de futuro, portanto, no sentido das alternativas limpas (alinhadas à sustentabilidade e aos princípios do ESG), além da operacionalização sistêmica de maneira descentralizada e distribuída entre todos os personagens da cadeia, desde os provedores, consumidores ou prosumers. E para não excluir o Estado da equação; a este incumbirá a formulação de base legal adequada para propiciar estabilidade e previsibilidade e fomentar, assim, o ambiente de negócios, gerar empregos e aquecer a economia.

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