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Município pode criar critérios adicionais para escolha de conselheiro tutelar

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9 de maio de 2022, 11h48

O município detém competência legislativa suplementar em temas de infância e juventude, podendo ampliar o alcance normativo da legislação federal e estabelecer requisitos adicionais para a candidatura ao cargo de conselheiro tutelar.

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ReproduçãoMunicípio pode criar critérios adicionais para escolha de conselheiro tutelar, diz TJ-SP

Assim entendeu o Órgão Especial do Tribunal de Justiça de São Paulo ao declarar a constitucionalidade de uma lei de Mogi das Cruzes, que estabelece como requisito indispensável para o exercício da função de conselheiro tutelar residir no município há, no mínimo, quatro anos. Na ADI, a Procuradoria-Geral de Justiça alegou que a exigência não seria razoável.

Entretanto, por maioria de votos, a ação foi julgada improcedente. Além de defender a competência do município para criar critérios adicionais para a escolha de conselheiros tutelares, o relator do acórdão, desembargador Evaristo dos Santos, disse que o requisito instituído pela lei impugnada é adequado à natureza do cargo, atendendo ao princípio da razoabilidade.

"O artigo 133 do Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei 8.069/90) estabelece três requisitos para a candidatura a membro do conselho tutelar (reconhecida idoneidade moral, idade superior a 21 anos, residir no município). Ocorre que referido rol não é restritivo. Por força do artigo 30 da CF, o município detém competência para suplementar a norma federal, ampliando o alcance normativo de tais requisitos, máxime para atender a interesse local", explicou.

Santos citou precedentes do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que o artigo 133 do ECA não é taxativo, uma vez que apenas estabeleceu requisitos mínimos para os candidatos ao conselho tutelar. "Inequívoca a competência do município para suplementar a norma federal, estipulando requisitos adicionais e ampliações normativas para a candidatura a membros do conselho tutelar", completou.

Por outro lado, o magistrado ressaltou que o requisito adicional instituído pela lei municipal deve ser compatível com a legislação federal e atender a interesse local. Neste cenário, ele considerou legítima a opção de Mogi das Cuzes de estabelecer, para os que pretendem compor o conselho tutelar local, a necessidade de morar na cidade há no mínimo quatro anos, com a devida comprovação.

"O ECA, em seu artigo 133, inciso III, estabeleceu residir no município como requisito para a candidatura a membro do conselho tutelar. O dispositivo permite interpretação a justificar a exigência de certo prazo residindo no município, evitando turistas, moradores eventuais, dentre outros, assim como, para viabilizar, ao candidato, maior conhecimento de problemas e das condições locais, antes do interessado tratar de assunto tão delicado, como o de zelar pelo cumprimento dos direitos da criança e do adolescente no município", frisou.

O relator ainda observou que os conselheiros tutelares são agentes públicos, e seus atos devem ser considerados atos administrativos, inclusive sujeitos ao impedimento constitucional do acúmulo remunerado de funções públicas (artigo 37, XVI e XVII, da Constituição Federal).

"Ademais, desempenham atividade de enorme relevância a toda sociedade. Por vezes, sua importância é, na prática, equivalente à de um magistrado, tamanha a magnitude de sua interferência na vida familiar e na proteção a crianças e adolescentes. Ora, à luz dessas considerações, mostra-se legítima e razoável a exigência impugnada", disse Santos.

Para o desembargador, o tempo de residência no município qualifica, sim, o candidato ao exercício da função de conselheiro tutelar, na medida em que garante mais conhecimento acerca das particularidades locais, permitindo atuação especializada e direcionada aos eventuais beneficiários do serviço.

"A legislação em questão, é importante observar, não está a impor novo requisito de ingresso ao conselheiro tutelar. Apenas amplia efeitos normativos de condição pré-existente, tal, como se pressupõe, à luz da doutrina e da jurisprudência aqui referida, seja a intenção do legislador federal. Daí, inviável ao Judiciário adentrar em aspectos de escolha administrativa, como o fator tempo", acrescentou.

Dessa forma, Santos afirmou que não cabe ao Poder Judiciário apontar eventual justiça ou injustiça no critério adotado, o que é de competência do legislador municipal, que, para fixar o parâmetro adequado, detém a possibilidade de estudar e entender melhor a realidade local.

"O estabelecimento de período mínimo de residência mostra-se razoável e harmônico com a qualificação do candidato à função em questão. Entendo que o município exerceu regularmente sua competência legislativa suplementar ao definir período mínimo de residência na localidade, não havendo afronta a dispositivos constitucionais, ao contrário, data maxima venia, observaram-se os da razoabilidade, da proporcionalidade, e do interesse público, dentre outros", concluiu.

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2179016-79.2020.8.26.0000

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