Opinião

Ferrari ameaça dono de salão ao pedir abstenção de uso de marca

Autores

  • Henrique Esteves Alves Ferreira

    é advogado sócio do escritório Alencar Lopes Esteves Sociedade de Advogados presidente da Comissão de Direito Empresarial da OAB-GO professor de Direito Empresarial mestre em Direito Constitucional pelo Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP/DF) e especialista em Direito Empresarial pela Fundação Getúlio Vargas (FGV/RJ).

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  • Thaynara Lacerda

    é agente de propriedade intelectual especialista em Direitos Autorais pela academia OMPI (Wipo); expertise em Gestão de Marketing/Financeiro e Expansão de Negócios. Pós-graduanda em Direito e Tecnologia.

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22 de junho de 2022, 7h03

Recentemente, um salão de beleza de pequeno porte situado na região de Paranoá, no Distrito Federal, recebeu uma inesperada notificação da Ferrari, que alegava o uso indevido da marca "Ferrari Cabeleireiros".

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Salão alvo de advogados da marca italiana
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A princípio, para compreensão do tema, que envolve uma grande indústria mundialmente conhecida e um pequeno salão de beleza de bairro, é necessário entender a diferença de Marca e Marca de Alto Renome.

Marca, segundo a lei brasileira, é todo sinal distintivo, visualmente perceptível, que identifica e distingue produtos e serviços de outros análogos, que, com o registro, garante ao seu proprietário o direito de uso exclusivo em seu segmento.

Já Marca de Alto Renome é aquela conhecida no mercado de consumo em geral, que alcançou um patamar de grande reconhecimento e reputação positiva, sendo protegida em todos os ramos de atividade, conforme artigo 125 da Lei n° 9.279/96 (Lei de Propriedade Industrial — LPI).

Logo, no contexto fático-jurídico, a Ferrari agiu conforme a lei, pois somente ela é titular da Marca de Alto Renome e, sendo assim, possui proteção especial em todas as classes (serviços/produtos) em todo o território nacional, e não somente no segmento automobilístico.

A problemática é que grande parte dos empresários, além de desconhecerem a autarquia federal, o INPI (Instituto Nacional de Propriedade Industrial e Intelectual), responsável por regularizar a titularidade desses nomes e o funcionamento do processo administrativo que protege os ativos intelectuais e industriais, não se preocupam em verificar a possibilidade de uso de sua marca e obter o registro antes de utilizá-la.

Por esse desinteresse, os comerciantes acabam cometendo contrafações por não entenderem que só é dono da Marca quem registra e, consequentemente, ficam reféns de consequências prejudiciais que poderiam ser facilmente evitadas.

As sanções para quem utiliza marca de terceiro são severas. Na esfera cível, por exemplo, pode o infrator vir a ser obrigado a interromper imediatamente o uso da marca, ter que trocar todo o seu material de trabalho e letreiro, sofrer busca e apreensão na sede da empresa e, ainda, ressarcir os titulares pelos danos causados, além do pagamento de indenizações e reparações. Ao mesmo modo, na esfera penal, utilizar-se indevidamente da Marca de terceiro é crime com pena de detenção e/ou multa.

Sendo assim, mesmo que o dono do salão retire o nome Ferrari de todas as placas e informativos (antes de um ultimato dado pelos advogados), ele estará sujeito a pagar as reparações correspondentes pela contrafação cometida.

Os cidadãos de Paranoá questionaram o porquê de apenas o salão ter sido multado e quais consequências teriam os demais comércios que utilizam o nome Ferrari em outras regiões. Infelizmente, o salão de Paranoá caiu no radar da empresa e, por isso, está sofrendo as penalidades que a Ferrari entende cabíveis. Caso outra empresa esteja, também, utilizando o nome indevidamente, estará suscetível ao mesmo processo indenizatório.

Vale registrar que, embora seja direito da proprietária da marca, os autores não necessariamente concordam com as exigências feitas, tendo em vista tratar-se de um pequeno empresário, que já adotou as providências de mudança do nome, em face de uma multinacional, que possui objetivo claro de proteger a marca, e não se enriquecer com a "multa" exigida. Confia-se que tal assunto pode ser melhor abordado através de uma conciliação entre as partes.

Outro caso que está dando o que falar é o álbum "As Patroas", lançado em 2020, que faz parte de um projeto das irmãs Maiara e Maraisa com a cantora Marília Mendonça. No ano de lançamento, o empresário chegou a pedir o registro da marca perante o INPI , na classe 41 (entretenimento e atividades culturas), entretanto, foi indeferido e, mesmo assim, continuaram sua utilização.

Após a divulgação do álbum, as cantoras chegaram a tentar um acordo extrajudicial, mas sem sucesso. Consequentemente, Daisy, titular da marca "A Patroa", entrou com uma ação judicial argumentando o uso indevido da marca pela dupla Maiara e Maraísa. No processo foi comprovado que a marca era utilizada por Daisy desde 2014.

Na semana passada foi deferida a antecipação da tutela determinando que a dupla se abstenha de utilizar a marca "A Patroa", seja no singular ou no plural, em quaisquer serviços, produtos comercializados, publicidades, por meio físico ou virtual, sob pena de multa de R$ 100 mil por cada vez que a marca for usada indevidamente.

Casos como estes têm sido cada vez mais comuns no Brasil. Com a globalização e o acesso ao mercado nacional cada mais vez mais amplo, especialmente em razão das redes e plataformas sociais, os titulares das marcas têm exercido seus direitos e exigido a abstenção da reprodução indevida com a reparação pecuniária pelo uso não autorizado.

Por isso, o papel de todo empresário, antes de escolher um nome para sua atividade, produtos, shows ou cursos, é realizar uma pesquisa de viabilidade no INPI e verificar se o nome escolhido está disponível para ser utilizado no respectivo segmento/nicho, para que se obtenha o registro e proteja seu negócio e o futuro renome que pretende obter.

Caso verifique que já exista um dono "titular" daquele nome, o empresário terá três opções: a) negociar com o proprietário a marca e solicitar a transferência de titularidade; b) alterar o nome da marca, fazendo um rebranding; ou c) obter uma licença de uso da marca pretendida.

Por fim, qualquer ação deve ser retratada ao advogado de confiança, para devidas orientações sejam realizadas em cada caso específico e o seu direito protegido.

Autores

  • é advogado, sócio do escritório Alencar Lopes Esteves Sociedade de Advogados, presidente da Comissão de Direito Empresarial da OAB-GO, professor de Direito Empresarial, mestre em Direito Constitucional pelo Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP/DF) e especialista em Direito Empresarial pela Fundação Getúlio Vargas (FGV/RJ).

  • é agente de propriedade intelectual, especialista em Direitos Autorais, pela academia OMPI (Wipo); expertise em Gestão de Marketing/Financeiro e Expansão de Negócios. Pós-graduanda em Direito e Tecnologia.

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