Opinião

A resposta penal ao racismo no esporte

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19 de junho de 2022, 6h09

No último dia 18 de maio, foi aprovado no Senado o Projeto de Lei nº 4.566/21, que promove alterações importantes nos crimes de injúria racial e de racismo — dentre outras, com a inclusão de penas específicas no caso de eventos esportivos, como o futebol, no qual, infelizmente, o racismo tem sido uma prática constante, tanto no Brasil como no exterior.

O PL prevê, entre outras medidas, a transferência do delito de injúria racial do Código Penal (artigo 120, § 3º) para a Lei de Racismo (inclusão do artigo 2º-A na Lei 7716/89); o aumento da pena do delito de injúria racial (de 1 a 3 anos de reclusão passa para 2 a 5 anos); e a inclusão de mais uma qualificadora no crime de racismo (artigo 20 da Lei 7716/89), para, em caso de cometimento no contexto de atividades esportivas, religiosas, artísticas ou culturais destinadas ao público, prever pena de 2 a 5 anos de reclusão e proibição de frequência, por 3 anos, a locais destinados a práticas esportivas, artísticas ou culturais destinadas ao público.

O projeto traz ainda a inclusão de causa de aumento de pena (de um terço até metade) se os crimes de injúria racial e racismo, além dos outros previstos na Lei 7.716/89, ocorrerem em contexto ou com intuito de descontração, diversão ou recreação; a inclusão de causa de aumento de pena (de um terço até metade) se os crimes de injúria racial e racismo forem praticados por funcionário público no exercício de suas funções ou a pretexto de exercê-las; e a obrigatoriedade de a vítima dos crimes de racismo estar acompanhada de advogado ou defensor público, em todos os atos processuais, cíveis e criminais.

O projeto de lei foi encaminhado à Câmara dos Deputados, onde, no último dia 6 de junho, houve parecer do deputado Antônio Brito (PSD-BA) por sua aprovação. Agora, aguarda deliberação em plenário.

O racismo, infelizmente, é um problema estrutural em nosso país. Por isso, todas as ações contra essa lamentável prática de discriminação são muito importantes. A resposta penal ao racismo é, sem dúvida, importante — apesar de outras formas de resposta serem tão ou até mais importantes, como, por exemplo, políticas de afirmação.

Nesse contexto, o aumento da pena do crime de injúria racial é uma medida de bastante vigor para o combate ao racismo: não só estabelece um patamar de pena elevado, como também elimina a possibilidade de incidência do benefício de "suspensão condicional do processo" (hoje cabível para esse crime), mecanismo de solução consensual do processo.

Há um problema, porém, na aplicação da pena (exaltada pelos parlamentares) de proibição de frequência a locais de práticas esportivas, artísticas ou culturais. A pena se aplica apenas ao crime de racismo, pois está inserida como um parágrafo (§ 2º-A) desse crime em específico (artigo 20-A). Com isso, ela não poderá ser aplicada em caso de injúria racial.

A distinção é importante porque são duas condutas distintas: na injúria, a ofensa é direcionada a um indivíduo específico; no racismo, a uma coletividade. Isso se reflete na prática porque, nos recentes episódios de discriminação vistos em jogos de futebol, por exemplo, houve injúria racial praticada por torcedores e atletas a determinadas pessoas (jogadores). Daí que, nesses casos, a pena de proibição de frequentar determinados lugares não poderia ser aplicada.

Há, também, previsão da obrigatoriedade de a vítima estar acompanhada de advogado ou defensor público, em todos os atos processuais, cíveis e criminais — que replica a regra que existe na Lei Maria da Penha (artigo 27). Isso, contudo, deve ser visto com reticência, seja porque o Ministério Público já é o órgão do Estado que tem por incumbência tutelar os interesses da vítima, seja porque, na prática, tal regra é de difícil concretização (a exemplo do que se vê nos processos de violência doméstica).

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