Opinião

Classificação tributária da mercadoria no processo de importação

Autores

  • Flávio de Mello Almada Ferreira

    é advogado especialista em direito civil e empresarial.

  • Alexandre Ferreira

    é sócio do escritório Sá e Ferreira Advogados Associados pós-graduado em Direito Imobiliário Aplicado e Direito Imobiliário Notarial pela FGV Law especialista em Direito Digital/Eletrônico pela FGV Law e vice-presidente do Tribunal de Justiça Desportiva Antidopagem em Brasília (DF).

16 de junho de 2022, 11h12

Em caso recente julgado pelo egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, discutiu-se acerca da responsabilidade pela classificação fiscal da mercadoria importada quando do seu desembaraço aduaneiro.

As etapas dos processos de importação e exportação de mercadorias vêm sendo objeto de diversas demandas perante o Poder Judiciário. Por se tratar de procedimento específico e repleto de particularidades, inúmeras discussões ainda não possuem precedentes.

No caso, a empresa importadora de mercadorias ajuizou demanda indenizatória em face do despachante aduaneiro contratado para a liberação da mercadoria importada, sob o fundamento de que houve erro na classificação tarifária do produto nos documentos apresentados para o desembaraço aduaneiro, o que ensejou a autuação da empresa importadora pelo Fisco.

A discussão girou em torno das atribuições na prestação de serviços pelo despachante aduaneiro: se a classificação tributária da mercadoria seria de sua responsabilidade ou não; e em qual momento é feita a classificação fiscal do produto importado.

Em 1ª instância, a MM. Juíza da 8ª Vara Cível da Comarca de Santos (SP) julgou a ação procedente por entender que a classificação fiscal da mercadoria seria atividade inserida nas atribuições do despachante aduaneiro.

A empresa de despacho aduaneiro recorreu da sentença, demonstrando que o despachante aduaneiro não realiza qualquer exame de mérito fiscal sobre a mercadoria da importadora, efetuando apenas trâmites formais para o desembaraço da mercadoria, diante de suas funções previstas por lei.

A análise da mercadoria para fins de classificação fiscal — a qual deve seguir os critérios da Nomenclatura Comum do Mercosul (NCM) — é realizada pela importadora quando da aquisição do produto frente ao exportador, razão pela qual a classificação fiscal já é descrita na fatura comercial emitida pela fornecedora (exportadora) à importadora, bem como no conhecimento de embarque.

Dentro do processo de importação, a função do despachante aduaneiro é de mero mandatário da importadora para o desembaraço da mercadoria, mediante a reprodução dos dados constantes na fatura comercial para os documentos de importação (Declaração de Importação e/ou Licença de Importação), obedecendo aos trâmites determinados pelos órgãos alfandegários para a nacionalização da mercadoria, a qual será entregue ao destinatário final, no caso a empresa importadora.

Em um breve resumo, a operação de importação possui o seguinte mecanismo:

1. Negociação para aquisição de mercadoria.
Partes envolvidas: Importadora e Exportadora.
2. Análise da descrição do produto, peso, quantidade, preço e classificação fiscal da mercadoria a ser importada para cálculo do valor total envolvido na operação de importação.
Partes envolvidas: Importadora e Exportadora.
3. Conclusão do negócio com emissão do certificado de origem da mercadoria e da fatura comercial, sendo que nestes documentos já deve constar a classificação tarifária
Partes envolvidas: Importadora e Exportadora.
4. Chegada da mercadoria em território nacional para desembaraço aduaneiro (nacionalização do produto). Neste momento as informações contidas no certificado de origem da mercadoria, na fatura comercial (invoice) e no conhecimento de embarque (bill of landind) são reproduzidas na Declaração de Importação (DI) e na Licença de Importação (LI) [1].
Parte envolvida: Despachante Aduaneiro como mero mandatário da Importadora.

Ao analisar o caso, o nobre desembargador relator Fabio Tabosa asseverou que não é no momento da liberação aduaneira que se promove a classificação fiscal da mercadoria, mas sim em momento anterior, quando são lavrados os documentos relativos à própria operação de importação:

"Na verdade, os documentos relativos ao despacho aduaneiro são preenchidos, no tocante à descrição da mercadoria, com todas as suas especificações, bem como à classificação tributária, com base em informações que já constam nos documentos relativos à própria operação de importação, lavrados a partir das tratativas diretas entre importador e fornecedor estrangeiro (bem anteriores ao despacho, portanto), como acabou por admitir a autora.
Como demonstrado na bem articulada apelação, a ré tomou por base, para o preenchimento da documentação destinada ao desembaraço da mercadoria, as informações existentes na Fatura Comercial e na Declaração de Origem do Produto, emitidos pelo fornecedor, e nos quais já constava, devidamente explicitada, a classificação tarifária das mercadorias" [2].

O relator concluiu que no caso, por não ser atribuição do despachante aduaneiro, o qual apenas reproduziu as informações contidas nos documentos elaborados pela importadora e exportadora, não há responsabilidade civil da empresa de despacho aduaneiro sobre o erro na classificação fiscal da mercadoria importada, devendo a própria empresa importadora responder pela autuação e multa aplicada pelo Fisco.

O julgado é extremamente importante e servirá como precedente para os próximos casos, tendo em vista que a discussão sobre a responsabilidade pela classificação tarifária da mercadoria ainda não havia sido debatida no âmbito judicial.


[1] O documento denominado como "Licença de Importação (LI)" não é necessário para todos os procedimentos de importação, somente para casos específicos.

[2] Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, Apelação Cível nº 1024403-18.2019.8.26.0562, Órgão Julgador: 29ª Câmara de Direito Privado; Julgamento ocorrido em 27/4/2022 e disponibilizado no Diário de Justiça Eletrônico do dia 3/5/2022.

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    é sócio do Sá e Ferreira Advogados e especialista em Direito Digital e Eletrônico pela FGV Law.

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    é sócio do escritório Sá e Ferreira Advogados Associados, pós-graduado em Direito Imobiliário Aplicado e Direito Imobiliário Notarial pela FGV Law, especialista em Direito Digital/Eletrônico pela FGV Law e vice-presidente do Tribunal de Justiça Desportiva Antidopagem em Brasília (DF).

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