Juros sobre juros

Falta de prova pericial em caso de contrato do SFH é cerceamento de defesa

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2 de junho de 2022, 19h49

Em caso de débito vinculado ao Sistema Financeiro de Habitação (SFH), saber se o sistema de amortização implicou ou não cobrança de juros sobre juros é "matéria técnica que demanda a produção de prova nesse sentido". Do contrário, ocorre cerceamento de defesa.

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ReproduçãoCaso envolve contrato de compra e venda de imóvel pelo SFH no valor de R$ 170 mil

Esse entendimento foi adotado pelo desembargador Rubens de Oliveira Santos Filho, da 4ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça do Mato Grosso (TJ-MT), para acolher preliminar de cerceamento de defesa pela falta de prova pericial em contrato vinculado ao SFH.

Assim, foi anulada a sentença de primeiro grau e determinada a produção da prova técnica.

O caso é de um contrato de compra e venda de imóvel pelo SFH firmado em setembro de 2016, no valor de R$ 170 mil. Os autores da preliminar recorreram à Justiça para pedir uma perícia contábil, alegando excesso nos juros, já que o capital emprestado virou uma dívida de cerca de R$ 751 mil.

Na primeira instância, o pedido foi negado. O juízo entendeu que não havia necessidade de prova técnica, pois considerou que o contrato não apresentava ilegalidades relacionadas a juros, correção e capitalização. Ao TJ-MT, os apelantes defenderam que a sentença deveria ser anulada por não ter sido dado o devido direito ao contraditório.

Cerceamento de defesa
Em sua decisão, o relator Rubens de Oliveira Santos Filho afirmou que negar a perícia técnica ao caso configura "cerceamento de defesa". Isso acontece quando uma parte é impedida de produzir prova que compete a ela e, por isso, tem contra si uma decisão fundamentada justamente nessa falta de prova.

Para o desembargador, a perícia é necessária para identificar a veracidade das arguições dos apelantes sobre a possibilidade de cobrança indevida.

"Na ação revisional, em regra não se revela imprescindível a perícia contábil quando a matéria abordada nos autos for exclusivamente de direito, pois para o exame dos pedidos basta a mera leitura do contrato, salvo se o juiz entender o contrário — princípio do livre convencimento motivado", explicou ele.

"Todavia, tratando-se de débito vinculado ao SFH — Sistema Financeiro de Habitação, saber se o sistema de amortização implicou ou não na cobrança de juros sobre juros é matéria técnica que demanda a produção de prova nesse sentido".

O magistrado afirmou que o caso julgado, por se tratar de "excussão da garantia fiduciária vinculada à aquisição de imóvel com a finalidade de moradia das partes", exige um maior cuidado no trâmite, a fim de garantir o pleno direito à ampla defesa.

Ele também explicou que a relação de consumo autoriza ao magistrado inverter o ônus probatório a favor do consumidor, para que o banco traga aos autos todo o procedimento de execução extrajudicial da garantia fiduciária e as notificações dos leilões. O objetivo da medida é apurar se a excussão do imóvel respeitou os termos da Lei 9.514/97.

Por isso, além de determinar a produção de prova pericial e acolher a preliminar de cerceamento de defesa, o desembargador determinou a juntada do procedimento de execução extrajudicial e as notificações dos leilões relacionados ao caso.

A parte apelante foi representada na ação pelo advogado Orlando Anzoategui Jr., da banca Anzoategui Advogados. Para ele, a importância da decisão do TJ-MT é "muito pontual". 

"Muitas decisões têm decidido sem ao menos fazer a realização da perícia, que é crucial para mensurar e constatar a existência ou não de irregularidades e abusividades nos valores e encargos contratuais, sem a qual é impossível o juízo auferir se ocorreu ou não a ilegalidade", comentou o advogado.

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1000831-47.2019.8.11.0078

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