O decreto federal sobre mercado de carbono: avanço ou estagnação?
1 de junho de 2022, 19h31
A Política Nacional sobre Mudança do Clima (PNMC), instituída pela Lei nº 12.187/2009, previa, em seu artigo 11, parágrafo único, que um decreto federal estabeleceria as diretrizes para uma economia de baixo carbono. Tal decreto, por sua vez, veio apenas no último dia 19 de maio, quase 13 anos após sua previsão.
O Decreto Federal nº 11.075, de 19 de maio de 2022, no entanto, visa apenas o estabelecimento de procedimentos para a elaboração dos Planos Setoriais de Mitigação das Mudanças Climáticas e institui o Sistema Nacional de Redução de Emissões de Gases de Efeito Estufa (Sinare). Diz-se "apenas", pois se esperava maior profundidade e regulamentação sobre o tema.
Para fins de análise, o decreto pode ser dividido em duas partes, a que "estabelece procedimentos" e a que institui o Sinare.
Estabelecimento de procedimentos
Em sua primeira parte, o decreto somente traz diretrizes para a confecção dos chamados Planos Setoriais de Mitigação das Mudanças Climáticas, com definições conceituais sobre o que é considerado crédito de carbono, crédito de metano, crédito certificado de redução de emissões etc. (artigo 2). Questões importantes, mas protocolares num decreto regulamentador.
Além disso, centraliza a competência para propor os planos setoriais nas mãos do Ministério do Meio Ambiente, do Ministério da Economia e dos ministérios setoriais relacionais (artigo 3º), mas não especifica quais são os setores, não ficando claro se são aqueles setores previsto na PNMC, quais sejam: geração e distribuição de energia elétrica; transporte público urbano e sistemas modais de transporte interestadual de cargas e passageiros; indústria de transformação e de bens de consumo duráveis; indústrias químicas fina e de base; indústria de papel e celulose; mineração, na indústria da construção civil; serviços de saúde; e agropecuária. O que pode gerar certo desconforto aos setores interessados nesse mercado, uma vez que dependem de uma ação política, sujeita a muitas variáveis.
O decreto, no entanto, não prevê nenhuma meta específica para os planos setoriais, ficando a critério de cada plano o seu estabelecimento (artigo 4º). A não previsão de metas na norma reguladora pode trazer insegurança jurídica, uma vez que são incertas e modificáveis ao longo do tempo. Um simples anexo a norma poderia, ao menos, estabelecer um parâmetro para essas metas (no sentido do que vem sendo adotado para as normas de saneamento).
O que não restou regulamentado pelo decreto, e que era o mais esperado, é justamente o Mercado Brasileiro de Redução de Emissões (MBRE), previsto no artigo 9º da PNMC. Ou seja, ainda não temos um mercado brasileiro de carbono, mas temos um norte para tal.
Instituição do Sinare
O artigo 8º do decreto instituiu um importante e necessário sistema para registro de todas as ações relativas a um mercado de carbono, o chamado Sinare (Sistema Nacional de Redução de Emissões de Gases de Efeito Estufa). No entanto, as regras ainda serão estabelecidas pelo Ministério do Meio Ambiente e da Economia, por meio de ato conjunto (artigo 8º, § 1º). Ou seja, tais regras estarão sujeitas à discricionariedade desses órgãos governamentais, uma vez que serão atos administrativos, e não definições legais, o que seria mais adequado e seguro. Ainda, por conta de sua competência (artigo 8º, § 5º), toda a implementação e operacionalização do sistema ficará sob responsabilidade do Ministério do Meio Ambiente, de forma que se espera um fortalecimento de tal órgão para fins de cumprimento dessa e outras políticas públicas.
Luz no fim do túnel
Portanto, analisando o Decreto Federal nº 11.075, pode-se dizer que há uma luz no fim do túnel sobre a regulamentação efetiva de um mercado de carbono para o Brasil. Ainda que o decreto não seja plenamente eficaz, dependendo de outras normativas e planos, nota-se um mínimo de esforço. Talvez a proximidade das eleições tenha pressionado a sua publicação para melhorar imagem do Brasil, mas o frenesi causado pela divulgação pode "virar uma chave" no entendimento do governo federal sobre a importância desse instrumento para o clima do planeta.
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