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Thiago Almeida: Relatório da Unctad e contexto internacional

11 de julho de 2022, 16h04

Por Thiago Ferreira Almeida

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Em julho de 2022, a Conferência das Nações Unidas para o Comércio e Desenvolvimento (United Nations Conference on Trade and Development — Unctad) publicou o mais novo relatório anual sobre o fluxo de investimentos internacionais no mundo [1].

O sistema econômico internacional encontra-se em um estágio de saída progressiva da pandemia Covid-19, acompanhado de forte inflação de preços e energia, bem como os agravantes econômicos decorrentes da guerra na Ucrânia, iniciada em 24 de fevereiro de 2022.

Dessa forma, o relatório da Unctad de 2022 sintetiza a situação internacional, no que se refere ao fluxo dos investimentos aos países conforme a sua exposição direta ou indireta quanto a três crises: alimentos, combustível e finanças. Países do Norte da África e Oriente Médio, como Egito e Líbano, que dependem da importação do trigo russo e ucraniano, sobre diretamente com o primeiro fator de crise supra mencionado [2].

A questão energética é diretamente sentida na Europa, dependente da produção russa, como o caso da Alemanha e Itália [3].

Na questão das finanças, a crise do Covid-19 deixou inúmeros países em desenvolvimento em situação de alto déficit de suas contas públicas. Ao contrário dos países desenvolvidos, com capacidade para lançar planos de investimento público no setor econômico e em infraestrutura, como no caso dos pacotes anunciados pelos Estados Unidos [4] e União Europeia [5], diversas nações em desenvolvimento ainda se encontram em dificuldade na compra de vacinas e na sustentação de suas economias frente à ruptura das cadeias de produção internacionais.

No que se refere ao crescimento econômico mundial, a guerra na Ucrânia provocou a redução do crescimento para 2022, descontinuando a trajetória de retorno de 2021. Quanto aos investimentos, apesar do retorno do crescimento dos investimentos estrangeiros diretos (Foreign Direct Investments — FDIs), o relatório da Unctad aponta que três quartos do total de crescimento encontra-se concentrado nos países desenvolvidos. Tais investimentos decorrem de fusões e aquisições e de retornos financeiros de suas multinacionais. No grupo dos países em desenvolvimento, quase a totalidade do crescimento de FDI concentra-se na Ásia, com menor participação na América Latina e África.

Quanto aos investimentos verdes, que envolvem energias renováveis e projetos direcionados à adaptação e mitigação dos efeitos da mudança climática global, a maioria dos investimentos verdes privados concentram-se em projetos de mitigação e a minoria em adaptação. Enquanto que nos países desenvolvidos os investimentos privados são a maioria, nos países desenvolvidos tais projetos necessitam de alguma espécie de participação pública. Além disso, 60% dos projetos sustentáveis encontram-se nos países desenvolvidos, o que demonstra a necessidade de estruturas de financiamento internacional dos países desenvolvidos aos em desenvolvimento, a fim de reduzir as disparidades sócioeconômicas e proporcionar a transição para investimentos de baixo carbono a nível global. Aplicar projetos verdes somente em partes do planeta não significa a redução dos efeitos causadores da mudança climática.

Analisando o fluxo de entrada de FDI nos países (FDI inflows), conforme apresentado no relatório da Unctad, tais investimentos se concentram nos países desenvolvidos e na Ásia. Dentre as 20 maiores economias que receberam FDIs em 2021, os Estados Unidos lideram a posição, seguidos pela China, Hong Kong, Cingapura e Canadá. O Brasil destaca-se na 6ª posição, seguido pela Índia (7ª), África do Sul (8ª), Rússia (9ª), México (10ª) e Alemanha (11ª).

Por outro lado, quanto aos países que mais enviaram investimentos direitos para outros países (FDI outflows) em 2021, os Estados Unidos encontram-se em primeira posição, seguido pela Alemanha, Japão, China, Reino Unido. O Brasil ocupa a 16ª.

Apesar das discussões sobre mudança climática concorrerem com as necessidades de curto prazo de geração de energia, devido ao aumento dos preços dos combustíveis e rupturas do fornecimento de gás russo no continente europeu, é necessário reconhecer a urgência de se adotar projetos de ampliação da produção energética renovável, a substituição por transportes de baixa emissão de carbono e a adoção de projetos sustentáveis.

A questão energética, portanto, encontra-se vinculada diretamente com a proteção ambiental e sustentabilidade. A decisão do governo alemão de estender a utilização da energia nuclear, alterando os planos de encerramento anunciados em 2011, demonstra os efeitos de curto prazo da demanda energética decorrentes da guerra da Ucrânia, bem como a desconsideração dos compromissos europeus com a mudança climática [6].