Princípio da Insignificância

TJ-RS nega recurso do MP contra absolvição por furto de carne vencida

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9 de julho de 2022, 16h48

O Supremo Tribunal Federal admite, em casos excepcionais, a aplicação do princípio da insignificância quando, a despeito da reincidência do agente, as circunstâncias denotem a ausência de lesividade da conduta e a irrelevância da ofensa ao bem jurídico tutelado.

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MP recorreu de absolvição de homens que furtaram 50 fatias de queijo, 14 unidades de calabresa, nove unidades de presunto e cinco unidades de bacon no interior do RS
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Com base no entendimento firmado pelo STF no julgamento do HC 181.389, de relatoria do ministro Gilmar Mendes, o colegiado da 6ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJ-RS) decidiu confirmar sentença que absolveu dois homens acusados de furtar peças de carne vencidas no setor de descarte de um supermercado na cidade de Uruguaiana. 

A decisão foi provocada por recurso do Ministério Público que alegou que no caso não poderia ser aplicado o princípio da insignificância pelo fato de os acusados apresentarem registros policiais por envolvimentos em crimes da mesma natureza. 

O Parquet defendeu que a aplicação do princípio da insignificância demanda que o delito tenha sido praticado por indivíduos que não façam do crime seu meio de vida. 

Ao analisar o caso, o relator da matéria, desembargador Sérgio Miguel Achutti Blattes registrou que o recurso do MP "causa espécie". "O órgão ministerial oferece denúncia contra os acusados pelo fato de eles terem subtraído determinada quantidade de gêneros alimentícios vencidos, alocados no setor de descarte do hipermercado BIG, na cidade de Uruguaiana", pontuou. 

O julgador critica a atuação do MP e questiona qual lesão (ou ameaça de lesão) ao bem jurídico se pode minimamente vislumbrar no caso. "Afinal, o bem jurídico tutelado, o patrimônio da vítima, não foi — e nem poderia ser — aviltado pela ação dos denunciados no caso em tela. O próprio representante do estabelecimento comercial, nessa toada, fez questão de consignar no âmbito do inquérito policial que todos os gêneros alimentícios subtraídos seriam descartados", afirmou. 

O desembargador lembrou que em casos como esse não podem ser ignorados sob a ótica jurídico-social e citou dados sobre a insegurança alimentar que acomete o Brasil. 

"Nesse contexto, não identifico, sob qualquer ótica atrelada à humanidade, à razoabilidade, aos princípios constitucionais vigentes e à própria legislação penal, motivos para reformar a absolvição sumária prolatada em favor dos apelados", apontou ao negar recurso do MP. 

Entenda o caso
O furto de peças de carne vencidas ocorreu em agosto de 2019. Na ocasião, policiais militares receberam uma denúncia de que dois homens haviam entrado em área restrita de um supermercado e revirado o setor de descartes. 

Eles foram abordados pela autoridade policial e detidos em posse de  50 fatias de queijo, 14 unidades de calabresa, nove unidades de presunto e cinco unidades de bacon. Todos os produtos estavam vencidos e iriam ser descartados.

Eles foram liberados e posteriormente indiciados pela Polícia Civil e denunciados pelo Ministério Público. Em novembro de 2020, a Defensoria Pública do Rio Grande do sul alegou o princípio da insignificância.A alegação foi acolhida pelo juiz André Atalla. Na decisão, ele absolveu os réus.

O Ministério Público, contudo, recorreu ao Tribunal de Justiça em setembro de 2021, alegando, entre outras coisas, que "não se pode usar o princípio da insignificância e do crime bagatelar como estímulo e combustível à impunidade".

Diante do recurso, o defensor público Marco Antonio Kaufmann, na época, apresentou as contrarrazões da apelação feita pelo MP: "tristes tempos em que LIXO (alimento vencido) tem valor econômico. Nesse contexto, se a mera leitura da ocorrência policial não for suficiente para o improvimento do recurso, nada mais importa dizer."

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5010886-02.2020.8.21.0037

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