Opinião

E se a medida provisória do teletrabalho "caducar"?

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6 de julho de 2022, 20h26

A Medida Provisória 1.108, publicada em 28 de março deste ano, trouxe alterações significativas ao teletrabalho, especialmente em relação ao controle das jornadas de trabalho. O encerramento do prazo de vigência da MP está previsto para o próximo 25 de julho, salvo revogação ou prévia conversão em lei.

Antes da entrada em vigor da medida, a reforma trabalhista era a responsável por reger a matéria, por ter incluído na CLT dispositivos tratando do teletrabalho. Uma das previsões mais relevantes sobre esse tema era a que definia que os empregados sob esse regime seriam equiparáveis aos que exerciam trabalho externo ou cargo de confiança (função de gestão), por não estarem submetidos a controle de jornada. Consequentemente, não teriam direito ao recebimento de horas extras, adicional noturno etc.

Porém, a MP 1.108 mudou esse cenário significativamente ao definir que estarão isentos de controle de jornada de trabalho, durante os 120 dias de vigência, apenas empregados em regime de teletrabalho que prestam serviço por produção ou tarefa. Ocorre que esse enquadramento é utilizado especialmente para atividades de costura, com uma aplicação bastante restrita em relação a outras tarefas, principalmente administrativas.

Logo, a modificação levou basicamente à exigência de que a maior parte dos empregados enquadrados em regime de teletrabalho fossem submetidos a um controle de jornada, passando a ter direito, por exemplo, a horas extras  se cabíveis, é claro.

O questionamento que fica é: e se a MP "caducar"  não for convertida em lei e perder sua aplicabilidade ao término de sua vigência?

Se o Congresso não editar decreto legislativo regulamentando os efeitos da medida provisória, da mesma forma como ocorreu nas últimas MPs editadas pelo governo federal, teremos um cenário bastante instável. Nessa hipótese, se observado estritamente o que está previsto na legislação, os empregados enquadrados no regime de teletrabalho antes da entrada em vigor da medida não precisariam fazer o controle da jornada, não sendo elegíveis ao pagamento de horas extras e adicional noturno até 27 de março de 2022.

Durante o período de vigência da medida, de março a julho, teria sido necessário fazer o controle da jornada do empregado e pagar horas extras e demais verbas relacionadas à ela. Com o fim da vigência, o trabalhador deveria novamente deixar de fazer o controle dos horários de trabalho, não mais fazendo jus aos pagamentos relacionados à jornada. Quais os riscos das empresas em observar exatamente essa regulamentação? Inúmeros.

Ainda que a reforma trabalhista tenha estabelecido expressamente que não estão sujeitos a controle de jornada de trabalho os empregados em regime de teletrabalho, a jurisprudência vem indicando que essa disposição legal está sendo aplicada apenas na hipótese de efetiva impossibilidade de controle de jornada de trabalho para a atividade desenvolvida, não bastando o simples enquadramento em regime de teletrabalho, como decidiu o Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região ainda neste ano.

Desta forma, os empregadores que cumprirem estritamente o previsto na MP, durante a sua vigência, determinando que os empregados em regime de teletrabalho realizem o controle de jornada nesse período, enfrentarão os riscos de passivo trabalhista relativos à inexistência de controle de jornada de trabalho  e consequente pagamento de horas extras, intervalos e adicional noturno  em relação ao período anterior à MP e posterior ao encerramento de sua vigência, por estarem implicitamente reconhecendo a compatibilidade entre controle da jornada de trabalho e a atividade em teletrabalho.

Se a MP for convertida em uma lei que mantenha seu texto, as empresas também enfrentarão riscos trabalhistas relacionados ao controle de jornada dos empregados em teletrabalho no período anterior à mudança dessa prática. Isso porque, se não houve modificação das atividades com a entrada em vigor da MP, será possível concluir que sempre houve a possibilidade de controle da jornada de trabalho pelo empregador, que deliberadamente decidiu por não o fazer, arcando com o risco.

O que se verifica é que é significativa a insegurança jurídica causada por alterações legislativas temporárias, como são as medidas provisórias, e a ausência de previsibilidade sobre o acolhimento ou não das modificações pretendidas pelo Congresso aumentam ainda mais o risco da atividade econômica do empregador, pois esse é prejudicado com a criação de um passivo trabalhista — ainda que observada estritamente a legislação vigente.

Esse cenário de insegurança sugere às empresas que não controlam a jornada dos empregados em teletrabalho que permaneçam com a mesma prática até que a MP seja efetivamente convertida em lei  se isso efetivamente ocorrer , para evitar a majoração dos riscos já existentes e resguardar a regularidade da prática adotada até a entrada em vigor da medida provisória.

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