Por ser o dolo elemento inerente à conduta descrita no tipo penal, não há que se alegar a sua ausência na infração de causar poluição ambiental, tornando área urbana ou rural imprópria à ocupação humana, se o delito decorrer do lançamento de resíduos sólidos, líquidos ou gasosos, ou detritos, óleos ou substâncias oleosas, em desacordo com leis ou regulamentos.
Com cerca de 11,5 mil habitantes, Aramari fica no agreste baiano a 120 quilômetros de Salvador. Segundo o MP, há anos o município mantém em seu território um depósito irregular de lixo, que provoca poluição ambiental, especialmente pelo lançamento de detritos. Tal prática tornou imprópria para a ocupação humana, pelos riscos à saúde, uma área semiurbana de cerca de 1.500 m².
Narra a denúncia que o prefeito, desde o seu primeiro mandato (2017-2020), é "conivente" com a administração do "lixão" e despreza as tentativas para o ajustamento de conduta com o MP, deixando de adotar conscientemente as medidas para sanear as irregularidades, "quer ao meio ambiente, quer à população em estado de vulnerabilidade social".
Reeleito e no exercício de seu segundo mandato, que vai até 2024, Fidel teve a ação por crime ambiental ajuizada contra si em abril de 2021. Na resposta à acusação, os seus advogados requereram a absolvição sumária sob a alegação de que o lixão existe há mais de 40 anos, não podendo o denunciado ser responsabilizado por ele. A defesa do prefeito também argumentou não haver dolo e prova de materialidade delitiva.
"Não há que se falar em ausência de dolo porque se trata de elemento inerente à conduta descrita no tipo penal em questão", observou a desembargadora Ivete Caldas Silva Freitas Muniz. Relatora da ação penal, a julgadora também afastou a tese de falta de prova material, porque laudo pericial apontou que o lixo coletado pela Prefeitura é depositado, sem tratamento, diretamente no solo da área citada na denúncia.
De acordo com a perícia, o local do descarte fica a 400 metros de um poço de captação de água para consumo humano, sendo constatada a existência de danos ambientais com potencial risco de contaminação às pessoas que trabalham no lixão e àquelas que consomem águas subterrâneas das proximidades. O laudo também apontou riscos à fauna, sendo necessária análise mais aprofundada quanto a possível dano à flora.
"O delito imputado na denúncia se relaciona a infração ambiental causadora, em tese, de dano de âmbito local, no município de Aramari, sendo as correspondentes atribuições de prevenção e saneamento, como é de conhecimento geral, de responsabilidade do prefeito, contexto que permite concluir pelo aperfeiçoamento da legitimidade passiva", acrescentou a relatora. Segundo ela, a denúncia preencheu as exigências dos artigos 41 e 395 do Código de Processo Penal.
O colegiado ressalvou não se verificar nos autos evidência da necessidade de se afastar cautelarmente Fidel do exercício do mandato. O próprio MP não formulou pedido nesse sentido. Na hipótese de recebimento da denúncia, o artigo 2º, inciso II do Decreto-lei 201/1967, que dispõe sobre a responsabilidade de prefeitos e vereadores, determina a manifestação fundamentada do juízo quanto ao afastamento ou não do réu do cargo.
Processo 8010909-18.2021.8.05.0000