Opinião

O jurado e o exercício da cidadania no Tribunal do Júri

Autor

  • Paula Bigoli

    é advogada especialista em Direito Penal e Processo Penal pela Faculdade Legale e em Docência e Gestão no Ensino Superior pela Universidade do Oeste Paulista (Unoeste).

26 de janeiro de 2022, 11h01

No Brasil, por disposição constitucional, o Tribunal do Júri é competente para julgar os crimes dolosos contra a vida (homicídio, induzimento, instigação ou auxílio ao suicídio, infanticídio e aborto).

Quando tratamos das citadas acusações, na primeira fase do processo um juiz togado conduzirá a instrução e, ao final, se entender que existem indícios de materialidade e autoria contra o acusado, o pronunciará, ou seja, mandará o acusado para ser julgado no plenário do júri. Durante o plenário, o juiz presidirá os trabalhos, mas o veredicto será proferido pelo conselho de sentença, composto por sete juízes leigos (jurados), sendo estes pessoas de notória idoneidade, que podem se alistar ou serem convocados pela Justiça.

Entendeu o legislador que o acusado de ter praticado um crime doloso contra a vida, por ter maior reprovação social, deveria passar pelo crivo dos seus iguais, pessoas comuns que, embora sem conhecimento específico em Direito, estariam aptas a julgar de acordo com a moral e, claro, com os elementos de prova produzidos durante o processo.

Nesse ponto, se faz essencial a reflexão sobre a importância do jurado nos processos submetidos ao Tribunal do Júri. Com a disseminação dos meios de comunicação e das redes sociais, não é incomum que se esbarre em comentários altamente punitivistas de pessoas que, com base em poucas informações, opinam sobre a punição merecida por alguém que responde por um processo criminal.

Respeitados os entendimentos contrários, tomando a liberdade de escrever em primeira pessoa, tenho que a função do jurado é de tamanha responsabilidade que não pode estar contaminada por pensamentos desse tipo.

Ao ser escolhido para compor o conselho de sentença, o jurado deve ser imparcial tal como um juiz togado, e estar disposto a despir-se de possíveis pré-conceitos e vestir-se de empatia, tentando, ao máximo, se colocar no lugar dos agentes (acusado e vítima) para compreender o contexto em que os fatos se deram.

Infelizmente, talvez por influência do pensamento punitivista já citado, o jurado pode ingressar no plenário já pré-disposto a uma condenação. Contudo, é importante a consciência de que o réu foi submetido a julgamento por haver indícios de autoria, mas o juízo de certeza será proferido por eles. Assim, é necessário estar de fato disposto a compreender as provas que lhe são apresentadas, bem como as várias interpretações que serão apresentadas pela acusação e pela defesa, a fim de que possa ponderar, por si só, o que é mais coerente.

Ainda, destaca-se que o princípio constitucional da presunção da inocência também precisa ser considerado nesse procedimento, devendo ser observado que, caso haja dúvidas se o acusado é realmente culpado, o mais seguro é que seja inocentado, pois "mais vale arriscar-se a salvar um culpado do que a condenar um inocente" (Voltaire). O jurado tem de estar ciente do peso que sua decisão terá na vida do acusado, da vítima (se sobrevivente) e dos familiares de ambos, para, só então, se colocar no papel de julgador.

Em suma, tem-se que aquele que é escolhido como jurado deve atuar com responsabilidade, estando ciente das consequências de sua decisão e disposto a, de fato, exercer a cidadania de forma consciente, julgando seus iguais da forma como gostaria de ser julgado: com atenção, cautela, e respeito.

Autores

  • é advogada, especialista em Direito Penal e Processo Penal pela Faculdade Legale e em Docência e Gestão no Ensino Superior pela Universidade do Oeste Paulista (Unoeste).

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!