Opinião

Considerações sobre a exigência de passaporte da vacina pelos museus de SP

Autor

  • Raquel Grazzioli

    é advogada do escritório Rubens Naves Santos Júnior Advogados e atua em demandas consultivas com foco em Terceiro Setor Direito Administrativo e setores estratégicos.

17 de janeiro de 2022, 9h17

O chamado passaporte sanitário, ou passaporte da vacina, é uma medida que vem sendo adotada por estados e municípios por meio da qual se exige a comprovação da vacinação contra a Covid-19 como condicionante ao acesso a determinados lugares.

Na cidade de São Paulo, em 27 de agosto de 2021 foi publicado o Decreto Municipal nº 60.488, que estabeleceu a necessidade do passaporte da vacina para acesso a estabelecimentos e serviços pertencentes ao setor de eventos, tais como shows, feiras, congressos e jogos, com público superior a 500 pessoas. À época se exigiu, no mínimo, a comprovação da primeira dose da vacina.

Mais recentemente, no último dia 7, foi editado o Decreto nº 60.989, que ampliou a exigência para estabelecimentos que promoverem festas e bailes, inclusive clubes ou casas noturnas, independentemente da quantidade de pessoas. Além disso, em razão do avanço da vacinação em São Paulo, passou a ser exigida a comprovação das duas doses da vacina.

Aos demais estabelecimentos que não integram o setor de eventos, o decreto somente recomenda a adoção do passaporte da vacina para acesso das pessoas às suas dependências [1]. Portanto, pelo menos por ora, não há obrigatoriedade da exigência para museus e demais equipamentos culturais.

Em outras cidades, a determinação da prefeitura foi mais rígida. No Rio de Janeiro, por exemplo, o Decreto nº 49.894/2021 estabelece a comprovação de vacinação contra a Covid-19 como critério para acesso a todos os estabelecimentos e locais de uso coletivo, incluindo expressamente "locais de visitação turísticas, museus, galerias e exposições de arte, aquário, parques de diversões, parques temáticos, parques aquáticos, apresentações e drive-in".

Justamente em razão da importância da vacinação, o ideal é que houvesse uma legislação clara e expressa aplicável aos museus, inclusive para fortalecer a adoção da medida e evitar questionamentos de pessoas não vacinadas que desejam visitar os espaços.

Vale apontar que importantes equipamentos culturais do estado de São Paulo estão seguindo a orientação mais cautelosa e segura para a saúde dos seus funcionários e visitantes e exigindo a comprovação do passaporte da vacina como condição de entrada.

A jurisprudência, até o momento, tem se posicionado de forma favorável à exigência do passaporte da vacina.

O estabelecimento de restrições indiretas como forma de impulsionar a vacinação foi enfrentando pelo Supremo Tribunal Federal no âmbito das Adins nº 6.587 e nº 6.586. Na oportunidade, o STF decidiu que a vacinação forçada é inconstitucional, por se tratar de medida invasiva que contraia o direito à inviolabilidade do corpo humano, mas admitiu a vacinação compulsória por meio de restrições indiretas, como "restrição ao exercício de certas atividades ou à frequência de determinados lugares".

Na mesma direção, na ADPF 756/DF, o STF suspendeu despacho do Ministério da Educação que havia impedido as universidades federais de exigir o passaporte da vacina de alunos, em observância à autonomia das instituições de ensino e dever de promoção da saúde.

Por sua vez, o ministro Humberto Martins, presidente do STJ, indeferiu pedido de Habeas Corpus no qual o paciente alegava constrangimento ilegal decorrente da Portaria nº 25/2021, editada pelo TRT 3ª Região, que estabelece como requisito para a entrada no prédio do tribunal a apresentação de comprovante de vacinação. Decisões semelhantes também foram dadas pelo TJ-SP [2].

Portanto, a limitação de acesso a determinados locais, sejam eles públicos ou privados, é legítima e possui amparo na Constituição Federal, que prevê a saúde como direito social de todos e dever do Estado (artigo 6º e 196 da Constituição Federal).

A falta de menção expressa aos museus e equipamentos de São Paulo nos Decretos Municipais nº 60.488 e nº 60.989, conforme dito, pode dar margem a indesejados questionamentos de pessoas não vacinadas que desejam visitar os espaços, inclusive por via judicial. Diante do avanço da variante ômicron, é mais do que desejável a edição de normativa que fortaleça a posição dos museus que implementaram a exigência do passaporte vacinal.

 


[1] "Artigo 3º — Fica recomendado a todos os estabelecimentos no Município de São Paulo que solicitem, para acesso das pessoas às suas dependências, comprovante de vacinação contra Covid-19, nos termos do artigo 2º deste decreto."

[2] O Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJ-SP), em duas oportunidades, indeferiu em sede limitar pedidos de Habeas Corpus, fundada na alegação de suposta coação e constrangimento legal a ser praticada pelo Prefeito de São Paulo (HC nº 2202717-35.2021.8.26.0000 e nº 2201581-03.2021.8.26.0000). 

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    é advogada do escritório Rubens Naves, Santos Júnior Advogados e atua em demandas consultivas com foco em Direito Administrativo, Terceiro Setor e outros setores estratégicos.

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