Opinião

Notas sobre a execução provisória da multa cominatória no CPC/2015

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17 de janeiro de 2022, 20h23

Inicialmente, o artigo 536, caput e parágrafo 1º, do Código de Processo Civil de 2015 [1] estabelece que no cumprimento de sentença que reconheça a exigibilidade de obrigação de fazer ou de não fazer o juiz poderá determinar as medidas necessárias à satisfação do credor, para a efetivação da tutela específica ou a obtenção da tutela pelo resultado prático equivalente, como a imposição de multa cominatória contra o devedor.

Com efeito, a multa cominatória possui como função impor ao devedor o cumprimento da tutela específica da obrigação ou o seu resultado prático equivalente.

Nessa ordem de ideias, a multa cominatória tem como finalidade induzir o devedor a adimplir a obrigação imposta pela decisão judicial, em respeito ao princípio da efetividade dos provimentos jurisdicionais.

Ato contínuo, a multa cominatória possui natureza patrimonial e função coercitiva.

Assim sendo, a multa cominatória torna oneroso e arriscado ao devedor o descumprimento da obrigação imposta pela decisão judicial.

Por conseguinte, é possível a execução provisória pelo credor da multa cominatória aplicada contra o devedor, em razão do descumprimento pelo devedor da tutela provisória de urgência deferida por decisão interlocutória em benefício do credor?

Destaca-se que, durante a vigência do Código de Processo Civil de 1973, o Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Recurso Especial 1.200.856  Rio Grande do Sul (Tema 743 dos Recursos Especiais Repetitivos) [2], realizado em 1º/7/2014, firmou o entendimento de que a execução provisória pelo credor da multa cominatória aplicada contra o devedor, em razão do descumprimento pelo devedor da tutela provisória de urgência deferida por decisão interlocutória em benefício do credor, depende de dois requisitos: 1) confirmação por sentença de mérito da multa cominatória aplicada contra o devedor; 2) eventual recurso interposto contra a sentença de mérito que confirmar a multa cominatória aplicada contra o devedor deve ser recebido sem efeito suspensivo.

Todavia, após a entrada em vigor do Código de Processo Civil de 2015, o entendimento firmado pelo Superior Tribunal de Justiça no julgamento do Recurso Especial 1.200.856  Rio Grande do Sul foi superado.

Isso pois o Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Recurso Especial 1.958.679  Goiás [3], realizado em 23/11/2021, interpretando o artigo 537, parágrafo 3º, do Código de Processo Civil de 2015, firmou o entendimento de que é possível a execução provisória pelo credor da multa cominatória aplicada contra o devedor, em razão do descumprimento pelo devedor da tutela provisória de urgência deferida por decisão interlocutória em benefício do credor, antes da prolação da sentença de mérito que confirmar a multa cominatória, desde que o levantamento do valor depositado pelo devedor, a título de multa cominatória, seja realizado após o trânsito em julgado da sentença de mérito prolatada favoravelmente ao credor.

Ressalta-se que o Superior Tribunal de Justiça, ao possibilitar a execução provisória pelo credor da multa cominatória aplicada contra o devedor, em razão do descumprimento pelo devedor da tutela provisória de urgência deferida por decisão interlocutória em benefício do credor, antes da prolação da sentença de mérito que confirmar a multa cominatória, prestigiou o princípio da efetividade dos provimentos jurisdicionais.

Além disso, o Superior Tribunal de Justiça, ao condicionar o levantamento do valor depositado pelo devedor, a título de multa cominatória, ao trânsito em julgado da sentença de mérito prolatada favoravelmente ao credor, prestigiou o princípio da segurança jurídica dos provimentos jurisdicionais.

Certamente, segundo o Superior Tribunal de Justiça, o artigo 537, parágrafo 3º, do Código de Processo Civil de 2015 criou um cumprimento de sentença incompleto, ao permitir o levantamento do valor depositado pelo devedor, a título de multa cominatória, somente após o trânsito em julgado da sentença de mérito prolatada favoravelmente ao credor.

Logo, o artigo 537, parágrafo 3º, do Código de Processo Civil de 2015 prestigiou, ao mesmo tempo, os princípios da efetividade e da segurança jurídica dos provimentos jurisdicionais.

Frisa-se que a execução imediata pelo credor da multa cominatória aplicada contra o devedor, em razão do descumprimento pelo devedor da tutela provisória de urgência deferida por decisão interlocutória em benefício do credor, possui como objetivo pressionar psicologicamente o devedor a cumprir a obrigação, devido à possibilidade do desfalque patrimonial.

Outrossim, a possibilidade do levantamento do valor depositado pelo devedor, a título de multa cominatória, somente após o trânsito em julgado da sentença de mérito prolatada favoravelmente ao credor, prestigiou o princípio da segurança jurídica dos provimentos jurisdicionais.

Ainda mais, não há necessidade de que o credor preste caução para o levantamento do valor depositado pelo devedor, a título de multa cominatória.

Isso porque a exigência do trânsito julgado da sentença de mérito prolatada favoravelmente ao credor, para o levantamento do valor depositado pelo devedor, a título de multa cominatória, afasta a necessidade da prestação de caução pelo credor para essa finalidade.

Diante do exposto, após a vigência do Código de Processo Civil de 2015, o entendimento firmado pelo Superior Tribunal Justiça no julgamento do Recurso Especial 1.200.856 foi superado, pois é possível a execução provisória pelo credor da multa cominatória aplicada contra o devedor, em razão do descumprimento pelo devedor da tutela provisória de urgência deferida por decisão interlocutória em benefício do credor, desde que o levantamento do valor depositado pelo devedor, a título de multa cominatória, seja realizado após o trânsito em julgado da sentença de mérito prolatada favoravelmente ao credor.

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