Opinião

Alocação de riscos dos contratos de concessões: uma análise econômica

Autores

  • Pedro Lucas Santos Barreto

    é aluno do sétimo período da FGV Direito Rio estagiário na área de Regulatório do Rennó Penteado Sampaio Advogados e pesquisador Pibic–CNPq da iniciação científica "Regionalização da oferta do serviço de saneamento básico à luz das inovações trazidas pela Lei 14.026/2020".

  • Beatriz Guimarães Menezes

    é aluna do sétimo período da FGV Direito Rio estagiária da Divisão Jurídica da Confederação Nacional do Comércio e pesquisadora Pibic–CNPq da iniciação científica "Moral Tributária do Estado e dos Contribuintes".

13 de janeiro de 2022, 18h15

1) Introdução
O contrato de concessão, diferentemente dos contratos privados comuns, conta com prerrogativas de Direito Público, como os princípios do artigo 37, CF, e um prazo, em geral, de 30 a 35 anos. Assim, cabe realizar a sua análise econômica em relação à sua alocação de riscos, principalmente pelos contratos de concessão serem atos de gestão do Estado
[1].

2) Riscos nos contratos de concessões

A prestação de serviço público dos contratos em tela começa por um aporte de investimentos da parte privada que será amortizado no decorrer do contrato. Considerando o volume necessário para sua prestação, que visa a satisfazer as necessidades sociais (Carvalho Filho, 2021).

Aponta-se que os riscos inerentes à extensão e contração com a Administração corroboram a essencialidade da alocação de riscos nesses contratos, sendo esta a função principal de qualquer contrato [2]. Devido à pandemia, destacam-se como principais riscos a força maior e o caso fortuito.

A imprevisível pandemia resultou em casos envolvendo concessões como a SLS nº 0091341-55.2020.3.00.0000/DF. O STJ expôs que a queda de receita proíbe uma readequação da logística referente à prestação do serviço público, gerando um desequilíbrio econômico-financeiro no contrato.

3) Alocação de riscos
A alocação ampara-se no artigo 2º da Lei nº 8.987/95, artigo 4º, VI, da Lei de PPPs e o Capítulo III, Título III, da Lei nº 14.133/2021, esta que consolida a alocação ao possibilitá-la nos contratos administrativos. Havendo sua obrigatoriedade apenas nos contratos com valores acima de R$ 200 milhões (artigo 22, §3º, c/c artigo 6º, XXII). Na pandemia, a alocação passa a incluir caso fortuito e de força maior a ser distribuído à parte com maior capacidade de evitá-lo/absorvê-lo de forma mais econômica.

Embora seja costumeira a disposição de matriz de riscos, os contratos não puderam prever evento similar à pandemia. Não houve a alocação desse risco, resultando em litígios posteriores para que se defina a parte com maior capacidade ou absorção econômica. Após a pandemia, o costume é haver sua inclusão, citam-se as cláusulas 22 e 23 da concessão da Via Dutra.

4) Perspectiva da análise econômica do Direito
A AED sobre a alocação de riscos requer uma análise das falhas de mercado nos contratos de concessão. As falhas se referem a situações que têm por resultado uma alocação ineficiente de recursos
[3]. Assim, as imperfeições de mercado são modificações de suas competitivas, levando indivíduos privados a maximizar seus interesses, em conflito com interesses sociais.

Existem falhas nesses contratos devido à assimetria bilateral de informação, pois o Estado não possui tecnicidade para determinar o melhor preço ou a melhor técnica do serviço e a parte privada recear, por exemplo, modificações unilateralmente feitas pela Administração, mesmo com sua devida indenização. Uma forma de reequilíbrio é o reajuste de tarifas da concessionária — o ST[4] afirma que "a finalidade da cobrança da tarifa é manter o equilíbrio financeiro do contrato, possibilitando a prestação contínua do serviço público". Contudo, isso não pode ocorrer sempre, pois as tarifas se sujeitam à modicidade tarifária (artigo 6°, §1°, Lei 8.987/95), princípio segundo o qual o usuário deve ter assegurado o seu acesso ao serviço público. Desse modo, quando houver alteração das tarifas, esta não pode ser superior ao preço que as pessoas possam pagar.

Não sendo estabelecida a alocação de risco, e sem o reequilíbrio, haverá seleção adversa. A seleção adversa ocorre quando não se diferenciam os produtos bons dos ruins [5]. Com isso, os compradores escolheriam os produtos mais baratos e os vendedores dos "bons" sairiam do mercado, deixando apenas vendedores de produtos de menor qualidade. Nos contratos de concessão, isso ocorre porque as partes se encontram em assimetria bilateral de informação, o que acarretaria um aumento no custo de transação, já que as partes teriam pouco conhecimento sobre o serviço e seu preço ideal, ou sobre futuras modificações no contrato.

Caso não haja alocação de risco, ou o preço seria elevado — pois os concessionários não saberiam os riscos e elevariam o preço de seu serviço — ou, se o preço fosse baixo, apenas as concessionárias com serviços de menor qualidade entrariam no processo de licitação.

Uma forma de diminuir os riscos, por parte da Administração Pública, seria com pesquisas de mercado e consulta a empresas com bom desenvolvimento no ramo — que não participariam do processo de licitação — sobre informações de preço e qualidade do serviço. Por parte da concessionária, seria possível estabelecer os riscos que seriam da empresa e até que ponto haveria uma modificação unilateral do contrato. 

5) Conclusão
Os contratos de concessão garantem uma ampla segurança à parte privada. Entretanto, existem diversos riscos no contrato, ensejando a sua alocação de riscos, como na pandemia. Os contratos de concessão contêm falhas de mercado, principalmente acerca da assimetria bilateral de informação, o que pode acarretar a seleção adversa. Portanto, caso não haja a alocação de risco no contrato de concessão, a seleção adversa poderia acarretar em uma redução na qualidade da prestação dos serviços públicos.

 


[1] ESTORNINHO, Maria João. A Fuga para o Direito Privado: contributo para o estudo de actividade de Direito Privado para da Administração Pública. Coimbra: Almedina, 1999, p. 46.

[2] RIBEIRO, Maurício Portugal et al. Comentários à Lei de PPP — Parceria Público-Privada: fundamentos econômicos-jurídicos. São Paulo: Malheiros, p. 117, 2007.

[3] SEIDENFELD, Mark. Microeconomics Predictates to Law and Economics. Ohio: Anderson Publishing Co, 1996, p. 61.

[4] BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 431121 — São Paulo. Relator: ministro José Delgado. Data de Julgamento: 20/8/2002. Disponível em: https://jurisprudencia.s3.amazonaws.com/STJ/IT/RESP_431121_SP_20.08.2002.pdf?AWSAccessKeyId=AKIARMMD5JEAO67SMCVA&Expires=1635902655&Signature=Uu%2FuuTL%2FbXIgO4CDiuPWE8AdXSE%3D. Acesso em: 30/10/2020.

[5] PORTO, Antônio José Maristello. Análise Econômica do Direito (AED), 2021, p. 35.

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  • é aluno do sétimo período da FGV Direito Rio, estagiário na área de Regulatório do Rennó Penteado Sampaio Advogados e pesquisador Pibic–CNPq da iniciação científica "Regionalização da oferta do serviço de saneamento básico à luz das inovações trazidas pela Lei 14.026/2020".

  • é aluna do sétimo período da FGV Direito Rio, estagiária da Divisão Jurídica da Confederação Nacional do Comércio e pesquisadora Pibic–CNPq da iniciação científica "Moral Tributária do Estado e dos Contribuintes".

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