Opinião

O fundamental papel da advocacia perante a diversidade na Justiça brasileira

Autor

  • Patrícia Vanzolini

    é advogada criminalista mestre e doutora pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo professora da Universidade Presbiteriana Mackenzie e do Complexo Educacional Damásio de Jesus e presidente da OAB-SP (triênio 2022-2024).

8 de fevereiro de 2022, 11h08

As pautas sobre paridade de gênero, equidade racial e inclusão são amplamente discutidas na esfera pública, mas o que se vê, na realidade, é uma enorme lacuna entre conceito e prática. Para que haja mudanças reais, as iniciativas em favor da igualdade de oportunidades devem partir de todos os setores, perpassando pelos mais diferentes grupos da sociedade.

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Nesse sentido, os operadores do Direito — profissionais fundamentais na defesa do Estado democrático de Direito, da Constituição, dos interesses do cidadão, na garantia da justiça social e dos direitos humanos — têm a função de construir uma agenda coletiva que jogue luz para a importância da pluralidade em todos os espaços, e que sirva de referência à sociedade brasileira. Afinal, sem igualdade, a democracia se torna seletiva.

No caso do Poder Judiciário, não é diferente quando falamos em desigualdade entre gênero e raça nos postos mais altos na magistratura. A despeito de campanhas de conscientização e dos diversos movimentos sociais que lutam por condições isonômicas, a realidade é irrefutável: em muitos tribunais espalhados pelo país, mulheres e não brancos não chegam a nem 10% dos desembargadores.

A participação parda e negra nos tribunais, por exemplo, segundo a "Pesquisa sobre Negros e Negras no Poder Judiciário", do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), publicada em setembro de 2021, aponta que apenas 2,4% dos magistrados do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) são negros. É a prova cabal do racismo estrutural e institucional da nossa sociedade. A invisibilidade desses grupos é gritante. O que se espera do Judiciário não ocorre na própria casa da justiça: igualdade perante a lei.

Somente com políticas concretas e urgentes é possível mudar esse panorama a curto prazo. Por isso, é importante a participação da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) — entidade com histórico de luta pela democracia e defesa da cidadania – na transformação desse contexto. Uma mudança possível e imediata, na qual a advocacia tem o poder de decisão, é a composição de lista sêxtupla para o preenchimento das vagas ao Quinto Constitucional que respeitem os princípios de equivalência entre homens e mulheres, de diversidade e de equidade racial para a formação das listas sêxtuplas.

Com a garantia de que um quinto das vagas para desembargador será ocupada por advogadas e advogados, ou pelo Ministério Público, é dever da classe promover os seus pares, considerando os diversos estratos sociais. Em defesa da representatividade, a OAB-SP está implantando a regra de formação da lista sêxtupla, obedecendo preceitos para inserção de todos os grupos. Será a primeira lista na história da entidade, que completa 90 anos em 2022, a respeitar a pluralidade.

Mas a questão está além da paridade no Quinto Constitucional; está no pilar da atuação da OAB-SP em proporcionar a isonomia, ou seja, as mesmas oportunidades a todas as advogadas e advogados nas comissões, colegiados e cargos diretivos da entidade, por meio de um programa de inclusão que permeará todas as esferas da instituição, de forma horizontal. É dever da entidade cessar essa discrepância na ocupação de cargos de direção. Apesar de as mulheres representarem mais de 50% dos inscritos na OAB-SP, é a primeira vez, em 90 anos, que uma mulher é eleita presidente. Outro dado estarrecedor: segundo o censo realizado pelo Centro de Estudos da Relações de Trabalho e Desigualdades (Ceert) em parceria com a Aliança Jurídica pela Equidade Racial, em 2018, somente 1% da advocacia de grandes escritórios é negra, sendo que 56,2% da população brasileira se declara como preta ou parda, de acordo com a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) de 2019. Esses percentuais têm de estar estampados nos quadros de direção da Secional.

As iniciativas da OAB referentes à paridade, igualdade racial, inclusão de pessoas com deficiência e de pessoas LGBTQIA+ têm de servir de exemplo aos cidadãos. Elas devem extrapolar o âmbito da instituição e servir de parâmetro na construção de uma sociedade mais justa.

Em nove décadas da Seção de São Paulo da Ordem dos Advogados do Brasil, a sociedade mudou drasticamente. Da nossa parte, a OAB-SP vai espelhar esse novo mundo, mais inclusivo e diverso.

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