Desastre de Mariana

TRF-1 não conhece de suspeição do juiz que atuou no caso Samarco

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3 de fevereiro de 2022, 20h11

A constatação de que um juiz é suspeito para julgar uma causa não é matéria de ordem pública. Portanto, tem prazo de preclusão de 15 dias para ser alegada e não pode ser usada como substitutivo de recurso para desafiar todas as decisões já tomadas.

Saulo Cruz
Para o TRF-1, pedido fora de prazo pela suspeição do magistrado tem feições de substitutivo de recurso ordinário
Saulo Cruz

Com esse entendimento, a 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região não conheceu da arguição de suspeição ajuizada contra o juiz Mário de Paula Franco Júnior na atuação dos processos relacionados ao desastre ambiental de Mariana (MG).

Como juiz titular da 12ª Vara Federal de Minas Gerais, Franco Júnior foi o responsável por implementar um sistema simplificado de indenização para os atingidos pelo rompimento da Barragem do Fundão, em 2015. Em dezembro, ele foi promovido a juiz federal titular e, desde então, não atua mais no caso.

A arguição foi suscitada por Ministério Público Federal, o Ministério Público de Minas Gerais, e as Defensorias Públicas da União, de Minas Gerais e do Espírito Santo em abril de 2021. No mesmo mês, o magistrado despachou não reconhecendo a própria suspeição. Em maio, a desembargadora Daniele Maranhão Costa, do TRF-1, negou o afastamento do juiz.

Em julgamento na quarta-feira (2/2), a relatora do caso apontou que o pedido foi feito pelos MPs e Defensorias fora do prazo de 15 dias previsto pelo artigo 146 do Código de Processo Civil e contado a partir do momento em que há ciência sobre o fato.

A suspeição teria sido constatada pela conduta do magistrado em reunião entre comissões de atingidos pela tragédia e o setor jurídico da Fundação Renova, formada pelas mineradoras responsáveis para reparação de danos. Essa reunião aconteceu em 21 de janeiro de 2021. A suspeição só foi mais de 60 dias mais tarde.

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Rompimento de barragem da Samarco causou tragédia ambiental em 2015
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Substitutivo de recurso
A desembargadora Daniele Maranhão destacou que a argumentação sobre a suspeição do juiz Mario de Paula Franco Junior já foi trazida em diversos recursos ordinários dos MPs e Defensorias, contra as decisões tomadas sobre o caso. Todas elas foram mantidas pelo TRF-1 com base na ausência de irregularidades e na necessidade de dar efetividade ao processo reparatório.

"Após interpor agravos de instrumento, os quais tiveram rejeitados os pedidos de tutela antecipada, assim como impetrar mandado de segurança, agora tentam desabonar a conduta do magistrado para continuar com suas insurgências contra um modelo de indenização simplificado que tem se mostrado um sucesso perante os atingidos, os quais são, ou deveriam ser, o motivo maior da busca por uma solução adequada, embora já tardia", criticou.

A conclusão final é de que, ultrapassado o prazo estipulado pela lei, está preclusa a oportunidade de se arguir o incidente de suspeição. A votação na 5ª Turma do TRF-1 foi unânime, conforme a posição da relatora.

O sistema indenizatório
O sistema indenizatório simplificado implementado pelo juiz Mario de Paula Franco Junior usa a técnica de matriz de danos para o cálculo de indenização em massa. Grupos específicos de vítimas recebem pagamentos pré-determinados de forma simplificada, com a burocracia e a comprovação de sua condição de afetados pela tragédia muito reduzidas.

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Reparação dos danos tem sido feita a partir de sistema indenizatório simplificado
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Ele já foi referendado pelo Tribunal Regional Federal da 1ª Região, mas é, desde sempre, contestado pelo MPF e defensorias locais. Além disso, corre processo movido por 202 mil vítimas brasileiras do desastre de Mariana na Justiça da Inglaterra, com pedido de indenização e críticas à atuação do Judiciário brasileiro no caso.

Para a desembargadora Daniele Maranhão, as investidas dos MPs e Defensorias contra esse sistema mostram a intenção de retirar dos atingidos o pleno exercício de seus direitos, sob uma pretensa necessidade de reparação integral dos danos.

"Embora elogiável a iniciativa das instituições de justiça e, mais ainda, o sucesso na obtenção de um acordo voltado à reparação dos danos ao meio ambiente e aos atingidos pelo desastre, não se pode pretender obstaculizar a busca individual da satisfação do crédito de cada um", afirmou a relatora.

Apesar dos avanços — segundo o Conselho Nacional de Justiça, em janeiro de 2021 mais de 5 mil pessoas haviam aderido ao novo sistema indenizatório —, seis anos depois do rompimento da Barragem do Fundão ainda há muito a ser alcançado em termos de reparação.

Está em andamento negociação para repactuação e definição de um novo acordo entre Estado, vítimas e as mineradoras responsáveis. A previsão é que a última audiência pública seja feita em fevereiro de 2022.

1017945-29.2021.4.01.3800

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