Opinião

O feminino no CNMP: as razões que devem motivar a indicação de mulheres

Autor

  • Carmela Grüne

    é advogada trabalhista mestre em Direitos Sociais e Políticas Públicas e membro do Instituto dos Advogados Brasileiros no qual é a representante titular no Rio Grande do Sul.

1 de fevereiro de 2022, 17h06

Recentemente, a Folha de S.Paulo publicou uma matéria produzida pelo jornalista Marcelo Rocha abordando a possibilidade de a composição do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) ser apenas masculina.

Rocha [1] relata que o órgão tem hoje 11 integrantes, todos do sexo masculino, restando três cadeiras a serem preenchidas para o biênio 2021-2023. Duas dessas vagas serão indicadas pelo Conselho Federal da OAB, que, em razão da pandemia e das eleições das seccionais, já alterou por duas vezes a datada da sabatina dos candidatos [2].

Sem definição da próxima data para a sabatina, os candidatos aos cargos de conselheiros no CNMP indicados pela advocacia aguardavam a posse da nova diretoria, que assumiu a gestão do Conselho Federal da OAB [3] nesta terça-feira (1º/2), tendo na presidência o advogado Beto Simonetti, na vice-presidência, Rafael de Assis Horn, como secretária-geral Sayury Silva de Otoni, como secretária-geral adjunta Milena da Gama Fernandes Canto e como tesoureiro Leonardo Pio da Silva Campos, além de mais conselheiros e conselheiras de 27 seccionais.

Dentro das candidaturas a serem indicadas para o CNMP, apenas duas mulheres participam do pleito que, conforme já dito, é majoritariamente masculino, Carmela Grune, "quem vos escreve", e Sandra Krieger Gonçalves (que busca a sua recondução no CNMP porque já atua como conselheira).

Nessa conjuntura, me encontro num lugar de fala em que ainda somos a minoria a ocupar espaços de poder e tomada de decisão. Uma vez que o CNMP é um órgão essencial à Justiça, conforme artigo 130-A, parágrafo 2º, da Constituição Federal [4], tem o dever de contribuir no aperfeiçoamento do regime democrático, sendo urgente colocar no plano prático o artigo 5, caput, da Constituição Federal [5], para que saiamos do discurso da igualdade formal para uma igualdade material.

Para tanto, é preciso refletir que não há democracia quando os espaços deliberativos não são igualitários, ou seja, quando não enxerga a pluralidade étnico-racial como de gênero no âmbito institucional. Basta acessar a composição atual do CNMP: não vemos mulheres, pessoas com outras identidades de gênero LGBTQIA+, negras, indígenas ou pessoas com deficiência [6].

A representatividade institucional deve ser a pauta do CNMP, porque é fundamental pensar na formação de políticas institucionais humanistas e inclusivas [7], que reavaliem a forma de condução de casos (reconhecimento fotográfico [8]; os arquivamentos de inquéritos de pessoas negras mortas por policiais [9]; a reiteração de condutas empresariais violadoras de direitos humanos [10] etc.).

Se desejamos enxergar a diversidade representada nas instituições, é necessário oportunizar que os espaços deliberativos de tomada de decisão sejam ocupados, levando em consideração a pluralidade que compõe a sociedade brasileira, composta não somente por homens brancos.

Ofertar a possibilidade da entrega da força de trabalho de pessoas de todos os gêneros, respeitando a diversidade étnico-racial, é urgente no âmbito das instituições que tem no condão o dever de atuar na defesa do Estado democrático de Direito, do interesse público e da dignidade humana pautada numa cultura antirracista, entre os casos, que combata o genocídio da população negra no Brasil.

Também é urgente pensar na perspectiva feminina pautada em ações e intervenções necessárias para o combate à violência de todos os tipos, desde a institucional à doméstica. Como a implementação de políticas institucionais no âmbito do CNMP direcionadas à Agenda 2030 da ONU [11], que foi tema do parecer que fiz em conjunto com Roberto Saraiva e Aline Eggers e que foi objeto de recomendação da OAB-RS ao Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região.

Nessa etapa da campanha, estou realizando contatos individuais com os conselheiros federais da OAB, na expectativa de os sensibilizar sobre a importância da minha indicação para ser conselheira do CNMP.

De modo a intervir positivamente nas ações do CNMP, destaco que atuo advogada trabalhista, sou mestre em Direitos Sociais e Políticas Públicas, implementei mais de 600 iniciativas voltadas à participação cidadã na gestão pública em defesa da Constituição Federal, do protagonismo cívico e do interesse público.

Todas as ações implementadas a partir do meu trabalho como editora do Jornal Estado de Direito, originariamente impresso, que alcançou a marca de 50 mil exemplares, distribuídos gratuitamente em todo Brasil; atualmente, pela internet, alcança um público médio de 70 mil leitores mensais.

Por essa rede de articulistas, no período da pandemia da Covid-19, reuni renomados juristas do Brasil e do exterior, em defesa da Constituição Cidadã para recomendar cem conselhos a processos pendentes de julgamento no Supremo Tribunal Federal pelo projeto Conselhos de Dom Quixote à Administração da Justiça Brasileira, iniciativa que contou inclusive com a participação de ministros de STF, STJ, TST e STM [12].

Um dos projetos que coordeno, mais laureado e de reconhecimento internacional, é o Direito no Cárcere, o qual há 11 anos contribui na garantia de direitos das pessoas presas, como o direito à memória, à educação, ao trabalho e ao esporte, por meio de palestras, de oficinas de literatura, de música, de pintura, de cinema, além de doações de materiais para revitalização dos espaços e melhorias nas condições de higiene e do meio ambiente prisional.

Acredito que trabalhar com o sistema prisional, com o estímulo à participação da sociedade para dar conselhos sobre temas pendentes de julgamento no STF, mostra o meu potencial, a minha contribuição e determinação em trabalhar com temas tão relevantes, polêmicos e necessários o enfrentamento para o fortalecimento da democracia no Brasil.

De nada adianta discutir leis e projetos se ficarmos apenas no plano teórico e não for implementada à prática. É com a informação, a formação, a intervenção e o direcionamento que mudamos a mentalidade e a cultura avança.

São mais de 16 anos dedicados à implementação de técnicas e metodologias de estímulo à participação cidadã, no cuidado das pessoas que se encontram a margem de políticas sociais, contribuindo para a mudança de cultura e na criação de oportunidades para todos. Entre as láureas que já recebi:

— Láurea de agradecimento concedida pela Ordem dos Advogados do Brasil, seccional Rio Grande do Sul, em defesa das prerrogativas especialmente pela atuação na Comissão de Direitos Humanos Sobral Pinto (2021);

— Láurea de agradecimento outorgada pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil pela atuação e pelo comprometimento com as causas democráticas e com o direito de defesa (2021);

— Voto de louvor concedido pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, em reconhecimento ao valoroso trabalho prestado à entidade, em favor da advocacia e da cidadania, que essa representa, contribuindo para o fortalecimento do Estado democrático de Direito (2019);

— Investigadora honorária do Instituto Jurídico Interdisciplinar da Faculdade de Direito da Universidade do Porto (2019);

— Homenagem no evento de 23 anos da Operação Força Tarefa da Brigada Militar na Cadeia Pública de Porto Alegre pelos relevantes trabalhos prestados (2018);

— Homenagem pela colaboração na colorização da Cadeia Pública de Porto Alegre, na qual foram doados mais de 32 mil litros pela Distribuidora de Tintas Progresso, numa ação conjunta com os projetos Direito no Cárcere e Vó Chica (2018);

— Homenagem pela participação e contribuição para a primeira edição da coletânea "Negras Palavras Gaúchas" (2018);

— Prêmio Ajuris de Direitos Humanos 2017, menção honrosa Projeto Direito no Cárcere na 10ª edição;

— Prêmio Ajuris de Direitos Humanos João Abílio Rosa 2015  Menção honrosa pelo Instituto Cultural Estado de Direito na 8ª edição;

— Prêmio Ajuris de Direitos Humanos João Abílio Rosa 2015  Menção honrosa pelo jornal Estado de Direito na 8ª edição;

— Medalha da Cidade de Porto Alegre. (2014), Projeto Direito no Cárcere;

— Prêmio Diversidade RS, da Secretaria de Estado de Cultura do Governo do Estado do Rio Grande do Sul, categoria Cultura dos Direitos Humanos. (2014), Projeto Jornal Estado de Direito;

— Prêmio Legislativo de Direitos Humanos da Câmara Municipal de Porto Alegre (2014), Projeto Direito no Cárcere;

— Prêmio Porto Alegre Amanhã Edital do Fumproarte (2014), Projeto Oficina de Expressão Lá vem a Luz, do qual foi produtora executiva;

— Prêmio Juíza Patrícia Acioli de Direitos Humanos, categoria Práticas Humanísticas (2013), Projeto Direito no Cárcere;

— Prêmio Estadual de Direitos Humanos da Secretaria de Justiça e Direitos Humanos do Governo do Estado do Rio Grande do Sul, categoria Divulgação dos Direitos Humanos (2013), Projeto Jornal Estado de Direito;

— Prêmio Agente Jovem da Cultura, do Ministério da Cultura (2012), Projeto Samba no Pé & Direito na Cabeça.

Acredito estar plenamente qualificada a ocupar a função de conselheira, para prestar tão relevante serviço à sociedade, com total comprometimento e responsabilidade. No entanto, é preciso lembrar que, no total da composição de conselheiros do CNMP, são 14 vagas e a representação da pluralidade das pessoas que formam nossa nação deve ser contemplada, para além das próximas candidaturas.

Deixo aqui um vídeo que apresenta o meu trabalho na perspectiva do procurador de Justiça Gilmar Bortolotto, que atuou na comissão que fiscaliza a situação dos presídios no Brasil pelo CNMP e o relato sobre o meu trabalho pelo olhar do delegado de polícia do Rio de Janeiro Orlando Zaccone para que, desse modo, conheçam melhor quem é a Carmela Grune, candidata a conselheira no CNMP na vaga indicada pela advocacia [13].

* A autora é candidata ao CNMP. 

 


[2] Primeiramente, agendada para 13 de dezembro de 2021, conforme https://deoab.oab.org.br/assets/diarios/diario-eletronico-oab-12-11-2021.pdf?p=1636761600049, posteriormente, remarcada para o dia 28 de janeiro de 2022, de acordo com https://deoab.oab.org.br/pages/materia/385232?termo=.

[4] "§2º. Compete ao Conselho Nacional do Ministério Público o controle da atuação administrativa e financeira do Ministério Público e do cumprimento dos deveres funcionais de seus membros, cabendo lhe: I – zelar pela autonomia funcional e administrativa do Ministério Público, podendo expedir atos regulamentares, no âmbito de sua competência, ou recomendar providências; II – zelar pela observância do artigo 37 e apreciar, de ofício ou mediante provocação, a legalidade dos atos administrativos praticados por membros ou órgãos do Ministério Público da União e dos Estados, podendo desconstituí-los, revê-los ou fixar prazo para que se adotem as providências necessárias ao exato cumprimento da lei, sem prejuízo da competência dos Tribunais de Contas;  III – receber e conhecer das reclamações contra membros ou órgãos do Ministério Público da União ou dos Estados, inclusive contra seus serviços auxiliares, sem prejuízo da competência disciplinar e correicional da instituição, podendo avocar processos disciplinares em curso, determinar a remoção ou a disponibilidade e aplicar outras sanções administrativas, assegurada ampla defesa; IV – rever, de ofício ou mediante provocação, os processos disciplinares de membros do Ministério Público da União ou dos Estados julgados há menos de um ano; V – elaborar relatório anual, propondo as providências que julgar necessárias sobre a situação do Ministério Público no País e as atividades do Conselho, o qual deve integrar a mensagem prevista no artigo 84, XI".

[5] Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

[8] PERES, César. 'Reconhecimento' por foto: quando o Judiciário é coadjuvante da polícia e do MP https://www.conjur.com.br/2020-nov-30/cesar-peres-reconhecimento-fotografia. Acessado 31/01/2022.

[9] MPs de SP e RJ arquivaram 90% dos inquéritos que investigavam mortes provocadas por policiais. https://br.noticias.yahoo.com/m-ps-de-sp-e-rj-arquivaram-90-dos-inqueritos-que-investigavam-mortes-provocadas-por-policiais-113348397.html, Acessado 31/01/2022.

[10] Decreto nº 9.571 de 2018 – Estabelece as Diretrizes Nacionais sobre Empresas e Direitos Humanos. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2018/decreto/D9571.htm. Acessado 31/01/2022.

[11] A título exemplificativo de pautas que já foram sugeridas ao Poder Judiciário Trabalhista, destaco o vídeo https://www.youtube.com/watch?v=Npq4RoRNxJI trabalho.

[12] Conselhos de Dom Quixote à Administração da Justiça Brasileira  2ª Edição  Disponível em https://www.youtube.com/watch?v=FwU-a8k91Lk. Acessado 01/02/2022.

[13] Carmela Grüne é candidata a vaga de conselheira no Conselho Nacional do Ministério Público  CNMP. Disponível em https://www.youtube.com/watch?v=L-hlnfL9FVs. Acessado 01/02/2022.

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