Licitações e Contratos

Relevância do estudo técnico preliminar na licitação pela Lei 14.133

Autor

  • Jonas Lima

    é sócio de Jonas Lima Advocacia especialista em Direito Público pelo IDP especialista em compliance regulatório pela Universidade da Pensilvânia ex-assessor da Presidência da República (CGU).

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16 de dezembro de 2022, 9h01

Para dar fim à antiga prática de processos licitatórios que nasciam com termos de referência e pesquisas de preços já prontos, a Lei nº 14.133/2021, a Lei de Licitações e Contratos Administrativos, positivou como obrigatório para União, estados, Distrito Federal e municípios o instituto do estudo técnico preliminar, conhecido como "ETP".

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Trata-se de ferramenta de planejamento que foi se consolidando ao longo dos anos em jurisprudência dos tribunais de contas e em normas regulamentares de licitações e contratações públicas, mas que ainda não estava em texto de lei federal e de aplicação nacional, para todos os entes federativos.

Isso muda o patamar de contratações públicas do Brasil, vez que agora se tem enfática a diferenciação do estudo técnico preliminar em relação ao que tanto se misturava de pesquisa de preços como sendo uma forma de pesquisa de mercado.

Agora o processo tem etapa interna de planejamento de modo mais sequencial e metódico, com mais segurança jurídica e possibilitando aferição, por entes de controle interno e externo ou por qualquer interessado, de eventual direcionamento para marca, modelo, fabricante ou até impertinência ou inadequação da contratação pretendida.

Se observado o texto da lei, fica fácil verificar que foi criada a imposição de que se documente a realidade de mercado, as possibilidades para solução de determinada demanda e as justificativas e as conclusões para a tomada de decisão sobre aluguel como alternativa a uma compra, uma ou outra especificação de produto ou serviço, uma ou outra metodologia a ser adotada em obra pública e tantas outras demandas.

Isso é relevante para evitar o que se chamava de jogo de cartas marcadas nas licitações públicas, pois agora é preciso instruir o processo com um "estudo" que envolva elementos sobre mercado, sobre produto, custo-benefício, ciclo de vida do objeto e tantos outros aspectos a considerar na etapa de planejamento da contratação pública, seja licitada ou não.

Assim está apresentado o tema na Lei nº 14.133/2021:

“Art. 6º Para os fins desta Lei, consideram-se:
(…)
XX – estudo técnico preliminar: documento constitutivo da primeira etapa do planejamento de uma contratação que caracteriza o interesse público envolvido e a sua melhor solução e dá base ao anteprojeto, ao termo de referência ou ao projeto básico a serem elaborados caso se conclua pela viabilidade da contratação;
(…)
XXIII – termo de referência: documento necessário para a contratação de bens e serviços, que deve conter os seguintes parâmetros e elementos descritivos:
(…)
b) fundamentação da contratação, que consiste na referência aos estudos técnicos preliminares correspondentes ou, quando não for possível divulgar esses estudos, no extrato das partes que não contiverem informações sigilosas;
(…)
XXIV – anteprojeto: peça técnica com todos os subsídios necessários à elaboração do projeto básico, que deve conter, no mínimo, os seguintes elementos:
(…)
g) projetos anteriores ou estudos preliminares que embasaram a concepção proposta;
(…)
XXV – projeto básico: conjunto de elementos necessários e suficientes, com nível de precisão adequado para definir e dimensionar a obra ou o serviço, ou o complexo de obras ou de serviços objeto da licitação, elaborado com base nas indicações dos estudos técnicos preliminares, que assegure a viabilidade técnica e o adequado tratamento do impacto ambiental do empreendimento e que possibilite a avaliação do custo da obra e a definição dos métodos e do prazo de execução, devendo conter os seguintes elementos:
(…)
Art. 18. A fase preparatória do processo licitatório é caracterizada pelo planejamento e deve compatibilizar-se com o plano de contratações anual de que trata o inciso VII do caput do art. 12 desta Lei, sempre que elaborado, e com as leis orçamentárias, bem como abordar todas as considerações técnicas, mercadológicas e de gestão que podem interferir na contratação, compreendidos:
I – a descrição da necessidade da contratação fundamentada em estudo técnico preliminar que caracterize o interesse público envolvido;
(…)
§ 1º O estudo técnico preliminar a que se refere o inciso I do caput deste artigo deverá evidenciar o problema a ser resolvido e a sua melhor solução, de modo a permitir a avaliação da viabilidade técnica e econômica da contratação, e conterá os seguintes elementos:
(…)
V – levantamento de mercado, que consiste na análise das alternativas possíveis, e justificativa técnica e econômica da escolha do tipo de solução a contratar;
(…)”. (os grifos não são do original)

As novas normas legais possuem uma visível relação com algo que já era básico na doutrina e na jurisprudência: os atos administrativos precisam de motivação clara e congruente.

Isso porque antes editais surgiam com especificações prontas e nem se sabia por qual razão certa característica de produto ou serviço havia sido definida, de modo que em muitos casos o que se contratava não possuía pertinência com a demanda, como se pode ilustrar com alguns exemplos:

  • suprimentos de tecnologia da informação que não eram compatíveis com os equipamentos;
  • centrais telefônicas que não eram compatíveis com instalações de redes de cabeamento dos prédios de órgãos públicos;
  • armas que não eram compatíveis com determinados tipos de missões ou uso específico;
  • veículos que em seu uso e ciclo de vida revelavam prejuízos enormes mais adiante; e
  • licitações nacionais quando o mercado fornecedor específico de determinado objeto estava em sua maioria no exterior.

Por isso, com a inovação trazida pela Lei nº 14.133/2021, a diretriz passa a ser entender mercado e suas possibilidades e avaliar a demanda a ser atendida, para considerar a pertinência, o custo-benefício e a adequação de objeto para o que se precisa, efetivamente, de modo a se chegar à melhor contratação, que nem sempre será aquela de menor valor em reais, mas a mais vantajosa em todo o conjunto de variáveis.

Se o estudo técnico preliminar for considerado nos exatos termos da lei ele representará uma situação de página virada nas contratações públicas brasileiras.

Autores

  • é advogado especialista em licitações e contratos, pós-graduado em Direito Público pelo IDP e Compliance Regulatório pela Universidade da Pensilvânia e sócio do escritório Jonas Lima Sociedade de Advocacia.

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