Uma ode às concessões exclusivas de esgotamento sanitário
15 de dezembro de 2022, 20h35
Uma questão muito relevante, atinente ao dever de universalização dos serviços públicos de saneamento básico, é a discussão acerca da definição de critérios para revisões de concessões exclusivas de distribuição de água para inclusão de obrigações inerentes aos serviços de esgotamento sanitário, ou ainda, criar mecanismos para viabilizar a concessão exclusiva dos serviços de tratamento de esgoto ao lado dos serviços de distribuição de água já existentes.

A resolução de tais questões é fundamental para o desenvolvimento e ampliação exponencial de projetos para estruturação de infraestruturas de esgotamento sanitário, bem como a obtenção das metas de universalização. Segundo relatório do Instituto Trata Brasil, com dados oficiais de 2019, aproximadamente 100 milhões de pessoas permanecem sem acesso à coleta de esgotos. Isso significa que "49% dos esgotos que geramos, estamos jogando na natureza cerca de 5,3 mil piscinas olímpicas por dia de dejetos no meio ambiente" [1]. Segundo o mesmo relatório, a quantidade de pessoas sem acesso a água tratada ainda é grande, mas diminui para 35 milhões [2].
Vale lembrar que, segundo o novo marco do saneamento básico (artigo 11-B, da Lei Federal nº 11.445/2007, com redação dada pela Lei Federal nº 14.026/2020), "os contratos de prestação dos serviços públicos de saneamento básico deverão definir metas de universalização que garantam o atendimento de 99% da população com água potável e de 90% da população com coleta e tratamento de esgotos até 31 de dezembro de 2033". Nesse sentido, as metas relativas aos serviços de esgotamento sanitário estão bem mais distantes de serem obtidas.
Certamente, a diferença dos números relativos ao acesso a água tratada e esgoto envolve questões de prioridade, muitas vezes de ordem política. Receber água tratada — o que é o mínimo — certamente é uma modalidade de atendimento em espécie das demandas sanitárias de maior visibilidade. Contudo, de nada adianta a ilusão com o crescimento do acesso à água tratada, sem o correspondente tratamento do esgoto gerado, sob pena de o próprio e desejado consumo de água potável representar uma contingência socioambiental relevante.
Um meio possível é buscar incentivar a renegociação de contratos de concessão exclusiva para distribuição de águas, usualmente realizado por empresas estatais detentoras de convênios de cooperação com Municípios, para prever ajustes com o fito de harmonizar-se com outra concessionária exclusiva para os serviços de esgotamento sanitário. Ou, ainda, criar medidas regulatórias para impor obrigações de acesso à infraestrutura de outro prestador, segundo a doutrina internacional dos essencial facilities [3], de modo a obrigar o acesso a todo o aparato necessário para que se possa criar medidas efetivas de cobrança autônoma pelo prestador dos serviços de esgotamento sanitário.
Enfim, trata-se de um debate necessário sobre buscar meios instrumentais para efetivar essa maior imersão dos serviços de esgotamento sanitário. Por isso, uma ode às concessões exclusivas desse tipo de serviço não é somente válida, mas necessária para ampliação da cobertura sanitária integral brasileira.
[1] MONZONI, Marlo; CARREIRA, Fernanda. O Metaverso do ESG. Documento on line disponível no link: https://saneamentobasico.com.br/wp-content/uploads/2022/12/Metaverso.pdf. Acesso em 07.12.2022.
[2] Op cit.
[3] Cf. VALE, Murilo Melo. Obrigações de Serviço Público no Setor Privado. Belo Horizonte: Editora Fórum, 2022, p. 296 et seq.
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