Opinião

Tema 72: contribuições previdenciárias sobre licença-maternidade

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5 de dezembro de 2022, 11h10

A Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN), órgão que defende os interesses fazendários do governo federal, tem adotado alguns argumentos bastante intrigantes nas ações que discutem a (in)constitucionalidade da contribuição previdenciária sobre a licença-maternidade, por parte das empregadas.

O tema tem ganhado força no judiciário federal após a conclusão do julgamento do Tema 72 pelo Supremo Tribunal Federal, que autorizou a exclusão da contribuição previdenciária patronal sobre os valores pagos às empregadas enquanto afastadas em razão de licença-maternidade. A partir de então, passou-se a discutir a possibilidade de também as empregadas restituírem ou deixarem de recolher a sua parte da contribuição previdenciária sobre o salário-maternidade recebido.

Um destes argumentos utilizados pelo representante do Fisco Federal nas defesas dos processos é o de que, caso não ocorra a correspondente contribuição da empregada ao INSS durante a licença-maternidade (ou que estes valores sejam eventualmente restituídos através da ação ajuizada), este período não deverá ser contado (ou excluído) para fins de aposentadoria. Logo, demorará mais tempo para a empregada se aposentar.

Num primeiro olhar, essa linha de raciocínio pode nos parecer bastante racional e lógica. O direito previdenciário (na maioria das vezes) não acolhe quem não contribui. Ou seja, sem recolhimento, não há direito ao benefício. Ponto final.

Contudo, o Direito, lato sensu, é uma ciência ampla e complexa, que demanda ao seu operador que analise a problemática jurídica sob diversos aspectos, que podem ser racionais, lógicos, exatos, como também subjetivos, relativos, humanos. Tudo está interligado aos preceitos e valores constitucionais que nossa Carta Magna visa proteger, e acima de tudo, a nossa natureza humana e às leis naturais que são inerentes a nossa espécie.

Impor que uma mãe trabalhadora, que assume a mais nobre das missões de uma mulher: gerar uma vida, demorará mais quatro ou seis meses (por filho gerado) para se aposentar, nos parece um castigo bastante pesado àquelas que tanto têm lutado para garantir seus direitos nas últimas décadas. Sim, é exatamente isto que quer dizer a PGFN nos processos que discutem a não incidência de contribuição previdenciária a cargo da empregada sobre o período de licença-maternidade: o tempo que a mãe empregada estiver em licença-maternidade para cuidado do filho recém-nascido não será computado para fins de aposentadoria, caso não houver contribuição previdenciária.

Imaginem uma mãe, ao tomar a complexa decisão de ter um, dois, três filhos ou quantos filhos o seu planejamento familiar permitir. Diversos são os questionamentos que ocorrem a sua cabeça nos dias de hoje: Como vai ficar minha carreira? Como meu companheiro vai me ajudar? Será que vou conseguir pagar as contas? Tenho maturidade para ser mãe? Como vou conciliar as tarefas do dia-a-dia e os cuidados com a criança?

Agora imaginem, além de todas estas dúvidas, o fardo de ter que lidar com a questão de trabalhar mais quatro, oito, doze meses ou o tempo que for preciso para se aposentar, dependendo quantos filhos tiver. Chegaremos, quem sabe, ao cúmulo de "desestimular" as gestações, a geração de novas vidas, a perpetuação da espécie, numa verdadeira atividade extrafiscal das contribuições previdenciárias pagas pelas empregadas: o controle populacional através da oneração tributária sobre a gestante.

Se pensarmos mais analiticamente ainda no assunto, chegaremos ao absurdo de instituir indiretamente um "imposto sobre a gravidez" ou uma "contribuição sobre a maternidade", uma vez que aquelas mulheres que decidirem ser mães, terão apenas duas opções no contexto apresentado: contribuir (inconstitucionalmente) para a previdência social durante o período da licença-maternidade e conseguir se aposentar no tempo previsto ou retardar suas aposentadorias pelo período em que estiveram de licença para cuidado dos seus filhos recém-nascidos ou adotados.

Não me parece que este é o objetivo insculpido em nossa Constituição Federal e também não me convenço de que este é o caminho que o bom Direito e a humanidade devem seguir. A maternidade e a paternidade são duas das coisas mais fantásticas que podemos encontrar no ser humano. A boa aplicação do direito deve sempre proteger o indivíduo e suas relações. Jamais limitá-lo a seguir aquilo que nos é mais natural e inerente: procriar para sobreviver.

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