Opinião

Suprema Corte dos EUA altera produção de provas internacionais, inclusive no Brasil

Autores

  • Gabriela Ruiz

    é advogada do escritório Kobre & Kim especializado em disputas e investigações internacionais tanto de empresas como de pessoas físicas.

  • Martin De Luca

    é advogado do escritório Kobre & Kim especializado em disputas e investigações internacionais tanto de empresas como de pessoas físicas.

  • Scott Nielson

    é advogado do escritório Kobre & Kim especializado em disputas e investigações internacionais tanto de empresas como de pessoas físicas.

23 de agosto de 2022, 7h07

A Suprema Corte dos Estados Unidos decidiu recentemente no caso ZF Automotive US, Inc. v. Luxshare Ltd. que a produção de provas ou discovery prevista na Seção 1.782 do Código norte-americano não pode ser concedida quando o único procedimento estrangeiro é uma arbitragem internacional privada.

A Seção 1.782 permite que partes em processos no exterior utilizem os mecanismos de discovery dos tribunais americanos para obter documentos ou testemunhos de pessoas nos EUA. Na decisão, a Scotus destacou certos fatores que devem ser considerados ao determinar se a produção de provas pode ser autorizada em arbitragens investidor-Estado.

Embora o caso ZF Automotive v. Luxshare possa ser visto como uma limitação ao uso da produção de provas internacional, ainda há uma série de opções que litigantes podem considerar.

Nos últimos anos, um número crescente de litigantes tem apresentado pedidos com base na Seção 1.782 para utilização em processos brasileiros. A produção de provas pode ser valiosa para partes brasileiras porque o processo para isso no Brasil tende a ser lento e limitado.

O vasto campo para a produção de provas nos EUA pode surpreender os litigantes brasileiros, tribunais domésticos, tribunais arbitrais e agências reguladoras. De acordo com a Seção 1.782, as partes envolvidas em uma disputa têm condições de buscar diversos tipos de produção de provas nos EUA, como registros bancários, depoimentos de testemunhas-chave e registros de mídias sociais naquele país, ou até mesmo brasileiros que estão em visita em determinadas circunstâncias.

Já no Brasil é necessário especificar cada documento. A justiça move-se lentamente e as partes tendem a recorrer de decisões adversas referentes à obtenção de provas. Portanto, fazer um pedido nos EUA pode ser crucial para alterar o resultado do litígio.

No caso ZF Automotive v. Luxshare, a corte americana indicou que certos fatores podem ser avaliados, incluindo se o painel de arbitragem recebe financiamento governamental, se o processo e a decisão final são confidenciais e se o Estado esteve envolvido na formação do tribunal arbitral.

Embora a corte tenha determinado que a produção de provas não pode ser concedida quando o único processo estrangeiro é uma arbitragem internacional privada, o tribunal deixou a porta aberta para a arbitragem investidor-Estado em certas circunstâncias. Os litigantes brasileiros poderão buscar a produção de provas nos EUA para utilização em alguns procedimentos arbitrais. Por exemplo, uma parte que busca utilizar a produção de provas num processo penal previsto na Seção 1.782 pode fazê-lo, mesmo que essa parte também esteja envolvida num processo arbitral que não satisfaça de outra forma o teste estabelecido em ZF Automotive v. Luxshare.

Além do uso convencional, aquelas provas obtidas nos EUA podem ser utilizadas em processos criminais contra partes adversas. Vítimas de delito tem o direito de fornecer documentos às autoridades. Dependendo do tipo de delito, as vítimas podem procurar reparação através das autoridades criminais, de procuradores ou das autoridades antitruste.

Uma das vantagens de obter a produção de provas é ajudar no avanço de investigações que se encontrem estagnadas. Por exemplo, se uma determinada investigação brasileira for iniciada, esta pode justificar o início de investigações noutras jurisdições relevantes.

A produção de provas nos EUA pode muitas vezes ter alcance amplo, chegando a exigir que uma pessoa ou entidade que se encontra nos EUA recolha e produza documentos armazenados fora do referido país. Outra característica da Seção 1.782 é que o âmbito da produção de provas permitido é amplo em comparação a outras jurisdições.

Enquanto alvos da produção de provas sob a Seção 1.782 podem tentar limitar a sua utilização através de uma ordem protetiva com o argumento de serem documentos confidenciais, os advogados podem lidar com estas limitações por meio de um cuidadoso planejamento antecipado e de negociação.

Ainda que o uso de provas dos EUA em arbitragem internacional privada possa estar fora dos limites no futuro, a porta ainda está aberta no contexto da arbitragem investidor-Estado. As partes que litigam em múltiplos foros — como uma combinação de um procedimento criminal (iniciado ou sendo contemplado) e uma arbitragem internacional privada — podem utilizar a produção de provas prevista na Seção 1.782.

A utilização de provas obtidas nos EUA em processos criminais no estrangeiro é também outra opção para vítimas não-estadunidenses de delitos, uma vez que pode ajudar no avanço de investigações aparentemente esgotadas. Por último, um planejamento prévio ponderado pode ajudar a abordar proativamente as tentativas de determinada parte de limitar a utilização da produção de provas através de uma ordem de proteção.

O âmbito da produção de provas nos EUA é amplo e continuará a evoluir nos próximos meses e anos. No longo prazo é improvável que esse instrumento perca as vantagens quando comparadas com o processo em outras nações, como o Brasil.

Para os litigantes no Brasil que busquem evidências que possam alterar o curso de determinado litígio, trabalhar com advogados familiarizados com os litígios brasileiro e estadunidense para planejar e executar uma estratégia transnacional agressiva é fundamental com o objetivo de maximizar o valor e acelerar o sucesso da causa.

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  • é advogada do escritório Kobre & Kim, especializado em disputas e investigações internacionais tanto de empresas como de pessoas físicas.

  • é advogado do escritório Kobre & Kim, especializado em disputas e investigações internacionais tanto de empresas como de pessoas físicas.

  • é advogado do escritório Kobre & Kim, especializado em disputas e investigações internacionais tanto de empresas como de pessoas físicas.

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