Opinião

Responsabilidade técnica e vínculo: exigência na fase de habilitação da licitação

Autor

  • Alberto Carvalho

    é advogado graduado em Direito pela Faculdade Baiana de Direito pós-graduado em Direito Tributário pelo Ibet pós-graduando em Licitações e Contratos Administrativos pela Faculdade Baiana de Direito e sócio do PPF Advocacia.

12 de agosto de 2022, 16h08

Para que a administração pública possa formalizar a aquisição de bens ou serviços, deve respeitar uma série de procedimentos previstos em lei, tendo como finalidade buscar sempre a melhor proposta estimulando a competitividade entre os concorrentes, e oferecendo iguais condições de participação.

Sendo assim, a licitação é um procedimento prévio à aquisição dos bens e serviços de interesse da administração pública, que visa a contratação mais vantajosa possível não só do ponto de vista econômico como também de qualidade.

Dentre as fases da licitação, a que interessa para a presente análise é a fase de habilitação, na qual os interessados em apresentar suas propostas disponibilizam informações básicas de regularidade jurídica e fiscal, além da comprovação da qualificação econômico-financeira e técnica para a potencial contratação, cujas regras devem estar devidamente previstas no edital.

Como nessa fase ainda não há qualquer confirmação da possível contratação, as exigências previstas no edital devem se restringir a comprovações mínimas de que o interessado tem condições de ofertar o bem ou serviço, sem trazer exigências desarrazoadas que frustrem a participação do maior número de interessados possíveis.

Ocorre que, existem certos dispositivos atualmente previstos em lei que podem trazer restrições ilegítimas à participação de determinados interessados, caso mal interpretados.

É o caso do previsto no artigo 30, § 1º, I, da Lei 8.666/1993, que trata das regras para fins de comprovação da aptidão técnica, estabelecendo que as empresas interessadas em participar da licitação devem "possuir em seu quadro permanente, na data prevista para entrega da proposta, profissional de nível superior ou outro devidamente reconhecido pela entidade competente, detentor de atestado de responsabilidade técnica (…)".

Da interpretação literal do referido dispositivo, pode se chegar ao entendimento equivocado de que já na fase de habilitação, onde não há qualquer confirmação da contratação, o interessado já tenha que possuir profissional vinculado ao seu quadro de funcionários e que inclusive já esteja vinculado à empresa como responsável técnico perante conselho profissional, para que possa incluí-lo como integrante da equipe técnica indicada para a potencial prestação do serviço.

Tal interpretação, no entanto, é manifestamente equivocada, pois significaria dizer que, antes mesmo de ser divulgado o resultado da licitação, os interessados já precisariam contratar e pagar antecipadamente por um profissional, além de providenciar a inclusão de tal profissional como responsável técnico perante o conselho profissional, antecipando todos os custos financeiros decorrentes da potencial contratação, sem qualquer garantia da efetiva contratação.

Ou seja, para aqueles interessados em participar da licitação e que não fossem declarados vencedores, a adoção de todas essas providências ainda na fase de habilitação geraria um prejuízo desnecessário, sendo prejudicial para a própria administração pública, pois passaria a contar com um número menor de interessados nas licitações realizadas.

Tanto o referido dispositivo trazia confusão quanto à obrigatoriedade de que o profissional já possuísse vínculo com a empresa antes mesmo da assinatura do contrato, que a nova lei de licitações e contratos (Lei nº 14.133/2021), em seu artigo 67, inciso I, passou a exigir apenas a "apresentação de profissional, devidamente registrado no conselho profissional competente(…)", retirando expressamente a regra prevista na legislação anterior de que o profissional já deveria integrar o quadro permanente da empresa na fase de habilitação.

Ainda que possam existir interessados que já possuam em seu quadro de funcionários profissionais devidamente registrados como responsáveis técnicos da empresa, é comum que para a participação em uma licitação os interessados busquem profissionais específicos fora do seu quadro de funcionários que formalize o compromisso de ser o futuro responsável técnico pela execução do contrato, caso o interessado seja vencedor da licitação e assine o contrato.

Para tanto, basta que o profissional que ainda não pertença ao quadro de funcionários do interessado formalize o seu compromisso através de uma declaração escrita, de que em caso do interessado ser declarado como vencedor da licitação, irá promover o registro da sua responsabilidade técnica pelo serviço e integrar o seu quadro técnico.

Nesse ponto, vale ressaltar a título exemplificativo o previsto na Lei 6.496/77, que instituiu a "Anotação de Responsabilidade Técnica" na prestação de serviços de engenharia, de arquitetura e agronomia.

Em seu artigo 1º, a referida lei estabelece que "todo contrato, escrito ou verbal, para a execução de obras ou prestação de quaisquer serviços profissionais referentes à Engenharia, à Arquitetura e à Agronomia fica sujeito à 'Anotação de Responsabilidade Técnica' (ART)".

Da análise do referido dispositivo fica clara a exigência de que apenas em caso de formalização de um contrato de prestação de serviço, deve ser registrada a Anotação da Responsabilidade Técnica do profissional pelo serviço específico que será prestado em nome da pessoa jurídica contratante.

Considerando que na fase de habilitação da licitação ainda não há qualquer contrato assinado, mas sim mera expectativa de contratação, não há sequer como o profissional indicado para compor a equipe técnica registrar previamente a sua responsabilidade técnica pelo potencial serviço, mas tão somente declarar seu compromisso de promover a anotação da sua responsabilidade técnica no caso do interessado ser vencedor da licitação.

Como não poderia ser diferente, por diversas vezes o Tribunal de Contas da União (TCU) já decidiu não haver necessidade de que os responsáveis técnicos do potencial serviço a ser prestado pertençam ao quadro permanente dos interessados, nem tampouco que tal exigência possa ser feita já na fase de habilitação:

"É irregular, para fins de habilitação técnico-profissional, a exigência de que o responsável técnico pela obra pertença ao quadro permanente de funcionários da licitante (artigos 3º, § 1º, inciso I, e 30, § 1º, inciso I, da Lei 8.666/1993). Acórdão 1.084/2015-TCU-Plenário.
A comprovação do vínculo profissional do responsável técnico com a licitante, prevista no art. 30 da Lei 8.666/1993, deve admitir a apresentação de cópia da carteira de trabalho (CTPS), do contrato social do licitante, do contrato de prestação de serviço ou, ainda, de declaração de contratação futura do profissional detentor do atestado apresentado, desde que acompanhada da anuência deste. Acórdão 1.446/2015 — TCU — Plenário.

É ilegal a exigência de que o responsável técnico conste de quadro permanente da licitante em momento anterior à data prevista para a entrega das propostas, nos termos do art. 30, § 1º, inciso I, da Lei 8.666/1993." Acórdão 3.014/2015-TCU-Plenário.

Conclui-se assim, que é ilegítima a exigência de que para participação em uma licitação, o interessado, já na fase de habilitação, tenha que apresentar para compor sua equipe técnica, profissional já pertencente ao seu quadro de pessoal e com responsabilidade técnica registrada, bastando a promessa escrita e assinada pelo profissional de que se compromete a ser o futuro responsável técnico pela execução do contrato, no caso da empresa ser vencedora do certame.

Autores

  • é advogado em Salvador, pós-graduado em Direito Tributário pelo Instituto Brasileiro de Estudos Tributários (Ibet), pós-graduando em Licitações e Contratos Administrativos pela Faculdade Baiana de Direito (FBD) e sócio do PPF Advocacia.

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