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STJ decide federalizar investigação de chacina do "maio sangrento" de 2006

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11 de agosto de 2022, 7h51

A incapacidade do Ministério Público de São Paulo de investigar a chacina do Parque Bristol, ocorrida na capital paulista em maio de 2006, e o risco de responsabilização internacional do Brasil pela violação de direitos humanos levaram o Superior Tribunal de Justiça a determinar a federalização do caso.

Marcos Oliveira/Agência Senado
Chacina ocorreu no contexto de reação aos ataques do PCC em 2006
Marcos Oliveira/Agência Senado

Na tarde desta quarta-feira (10/8), a 3ª Seção do tribunal, por unanimidade de votos, julgou procedente o pedido de deslocamento de competência suscitado pelo então procurador-geral da República, Rodrigo Janot, em 2016.

A chacina do Parque Bristol é um dos casos mais emblemáticos do chamado "maio sangrento" de 2006, quando mais de 500 pessoas foram mortas no estado de São Paulo em crimes atribuídos a grupos de extermínio com participação de policiais e agentes públicos.

Edivaldo Barbosa de Andrade, Fábio de Lima Andrade, Israel Alves de Souza, Eduardo Barbosa de Andrade e Fernando Elza foram mortos num contexto de reação aos ataques promovidos pelo primeiro comando da capital (PCC) às forças de segurança.

Os crimes de maio nunca foram devidamente apurados, o que levou a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) a, em 2021, acolher a denúncia contra o Brasil, por violação de garantias constitucionais. O país está sob risco de responsabilização internacional pela omissão.

É esse contexto que, segundo o ministro João Otávio de Noronha, relator do caso no STJ, que permite que o deslocamento de competência seja feito. As investigações serão assumidas pela Polícia Federal, sob supervisão do Ministério Público Federal de São Paulo.

Gláucio Dettmar/Agência CNJ
"Difícil acreditar que não se possa desvendar este crime", disse o ministro Noronha
Gláucio Dettmar/Agência CNJ

Impunidade
"Esse caso mostra algo muito peculiar. Uma impunidade. Todo mundo diz que foram agentes policiais, mas não se consegue chegar a esses agentes policiais. No atual momento das técnicas investigativas, é difícil acreditar que não se possa desvendar este crime", pontuou o ministro João Otávio de Noronha nesta quarta-feira.

Para ele, todos os requisitos para o deslocamento de competência estão atendidos: há grave violação dos direitos humanos, há necessidade de assegurar o cumprimento de tratados internacionais dos quais o Brasil é signatário, e há incapacidade do estado de São Paulo de levar a cabo a persecução penal.

Ao acompanhar o relator, o ministro Rogerio Schietti pontuou que a chacina do Parque Bristol se insere em um contexto de política de eliminação daqueles que teriam violado as leis penais. "Nítida a desídia estatal e uma implícita (ou explícita) adesão ou acomodação com tais práticas irracionais e ilegais do estado".

Vai adiantar?
A votação na 3ª Seção foi unânime, mas gerou algumas dúvidas entre os julgadores. O ministro Ribeiro Dantas questionou se será proveitoso, 16 anos depois, federalizar as investigações para resolver um crime tão antigo.

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No "maio sangrento", mais de 500 pessoas foram assassinadas como retaliação
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"Passados tantos anos entre uma coisa que aconteceu em 2006, quando sequer se estava no presente ciclo de violência que hoje infelizmente o país vive, e hoje, acho que dificilmente se chegará a resultados mais auspiciosos. Espero estar errado", disse.

"Aqui talvez a federalização tenha um efeito mais pedagógico e moral, até para efeitos de reparação histórica das memórias das pessoas, e principalmente, também a responsabilidade internacional a que o país está sujeito", disse o ministro Joel Ilan Paciornik. "Esses fatos têm se repetido aqui", lamentou.

Os desembargadores convocados Olindo Menezes e Jesuíno Rissato também admitiram ter dúvidas sobre a efetiva resolução do crime. Para o ministro Noronha, parte da culpa é do STJ, já que o incidente de deslocamento de competência está na corte, parado, desde 2016. Além disso, ele só é possível diante da inércia estatal, o que leva tempo.

"As provas estão colhidas. Elas estão lá. E poderão ser reexaminadas, e aí se verdadeira a acusação de que houve inércia ou não, os novos peritos poderão trazer à baila", disse o relator. "Esse caso repercute muito mal para a imagem do país", complementou.

IDC 9

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