Direito fundamental

STF veta pagamento de salário inferior ao mínimo para servidor em horário reduzido

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8 de agosto de 2022, 21h17

Por maioria, o Plenário do Supremo Tribunal Federal decidiu que é proibido o pagamento de remuneração em valor inferior ao salário mínimo a servidor público, mesmo em caso de jornada reduzida de trabalho. A decisão se deu na sessão virtual encerrada na última sexta-feira (5/8), no julgamento de recurso extraordinário com repercussão geral (Tema 900). A tese de repercussão geral fixada foi a seguinte: "É defeso o pagamento de remuneração em valor inferior ao salário mínimo ao servidor público, ainda que labore em jornada reduzida de trabalho".

Reprodução STF
Para Toffoli, Constituição estendeu aos servidores o direito ao salário mínimo
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O recurso foi apresentado por quatro servidoras públicas do município de Seberi (RS). Aprovadas em concurso público, elas cumprem jornada de 20 horas semanais e ingressaram com ação de cobrança para receber a diferença entre a remuneração mensal e o salário mínimo.

Em primeira instância, o pedido foi julgado improcedente, com o argumento de que elas recebiam valor pouco superior a meio salário mínimo e, ao prestarem o concurso público, sabiam da carga horária e da remuneração. O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJ-RS) manteve a decisão.

Direito fundamental
No STF, prevaleceu o entendimento do relator, ministro Dias Toffoli. Ele destacou que o artigo 7º, inciso IV, da Constituição garante o direito fundamental ao salário mínimo, capaz de atender às necessidades básicas dos trabalhadores e às de sua família. O artigo 39, parágrafo 3º, estendeu esse direito aos servidores públicos, sem nenhum indicativo de que poderia ser flexibilizado para pagar menos que o valor fixado por lei, mesmo em caso de jornada reduzida ou previsão em legislação infraconstitucional.

Segundo Toffoli, no caso concreto, são servidoras públicas concursadas, situação que impõe vedações constitucionais à acumulação remunerada de cargos, empregos e funções públicas (artigo 37, incisos XVI e XVII) e, dependendo do regime, proíbe o exercício cumulativo de outra atividade.

Em razão dessas vedações, e admitindo-se remuneração inferior ao salário mínimo e proporcional à jornada, os servidores e empregados públicos nessa situação seriam obrigados a prover seu sustento unicamente com meio salário mínimo por mês, o que violaria os dispositivos da Constituição e lhes imporia uma condição de precariedade incompatível com o princípio da dignidade da pessoa humana.

Ônus da escolha
Para o ministro, a Administração Pública, ao fixar a carga horária em tempo reduzido, deve assumir o ônus de sua escolha e não pode impor ao servidor ou empregado público o peso de viver com menos do que aquilo que o próprio poder público considera o mínimo necessário a uma vida digna.

Esse entendimento, a seu ver, aplica-se apenas ao servidor público estatutário com jornada reduzida, não se estendendo a contratações temporárias ou originadas dos vínculos decorrentes das recentes reformas trabalhistas, até mesmo em razão da natureza distinta do vínculo com a administração pública.

Acompanharam o relator os ministros Luiz Fux (presidente do STF), Gilmar Mendes, Ricardo Lewandowski, Edson Fachin e Alexandre de Moraes e as ministras Cármen Lúcia e Rosa Weber.

No caso concreto, o Plenário deu provimento ao recurso extraordinário, devolvendo os autos ao TJ-RS para continuidade de julgamento, a fim de que sejam decididas as demais questões contidas no recurso, observando-se os parâmetros decididos pelo Supremo no recurso.

Divergência
Ficaram vencidos os ministros Luís Roberto Barroso, André Mendonça e Nunes Marques. Ao abrir divergência, Barroso considerou que, quando o servidor cumpre jornada inferior a oito horas diárias e 44 horas semanais, a remuneração deveria ser proporcional ao tempo trabalhado. Assim, haveria isonomia com servidores com remuneração semelhante que cumprem a jornada integral e os trabalhadores da iniciativa privada.

Em seu voto, o ministro defendeu que fosse vedado o pagamento de remuneração inferior ao salário mínimo apenas quando o estatuto profissional do servidor impusesse restrição significativa à liberdade de trabalho, impedindo o exercício de outras atividades para complementar sua renda. Nesses casos, seria assegurado o recebimento do salário mínimo, ainda que a jornada fosse reduzida.

Repercussão
Para os advogados Paulo Freire e João Arantes, que integram a equipe do escritório Cezar Britto & Advogados Associados, a decisão do Supremo é extremamente acertada, uma vez que a Administração Pública não pode pagar remuneração inferior a um salário mínimo aos servidores, independentemente da carga horária, pois isto feriria a isonomia em relação ao setor privado. “É que, diferentemente deste último, cujo objetivo, em última análise, além de promover emprego e renda, é gerar lucro, à Administração, embora não lhe seja proibido lucrar, incumbe zelar pelos interesses dos administrados. Nesse caso, reduzir a remuneração de servidores da saúde não parece ser de interesse da população em geral, especialmente num momento de emergência sanitária – pois ainda vivemos sob os efeitos da pandemia da COVID 19 – em que a relevância do trabalho destes profissionais se acentua”, destacaram. 

RE 964.659

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