Opinião

Compensação tributária com créditos decorrentes de sentença judicial

Autor

  • Vitor Flores

    é advogado na Advocacia Tavares Novis mestre em Direito Tributário pela PUC-SP LLM em Tributação Internacional pela Universidade de Leiden (Holanda) e especialista em IFRS certificado pelo ICAEW (Reino Unido).

26 de abril de 2022, 6h11

Os créditos tributários, reconhecidos em sentença judicial ilíquida, quando usados para compensar débitos tributários, resultam num ganho para o contribuinte; porém esse ganho, quando tributável, deve ser oferecido à tributação não quando a compensação é declarada, mas apenas quando ela é homologada. Sustentaremos esse argumento neste artigo.

Quando o Superior Tribunal de Justiça — STJ decidiu que as compensações não devem ser consideradas "pagamento" para efeitos fiscais, ele partiu da premissa de que as compensações podem, ou não, ser homologadas pelo Fisco. Essa incerteza torna impossível subsumir a "compensação" à hipótese de "pagamento" delineada no Código Tributário Nacional  CTN, artigo 138. De acordo com esse dispositivo, as penalidades decorrentes da falta de pagamento de tributos devem ser excluídas, sempre que o contribuinte pagar espontaneamente os tributos e juros de mora antes de uma fiscalização. Ao avaliar esse caso, a Corte seguiu o raciocínio de que como a "compensação ainda depende de homologação, não se chega à conclusão de que o contribuinte ou responsável tenha, espontaneamente, denunciado o não pagamento de tributo" (STJ, REsp 1.657.437, julgado em 2017). O Conselho Administrativo de Recursos Fiscais – Carf aparenta, hoje, ter se alinhado ao STJ (CARF, CSRF, Acórdão 9101-005.884, julgado em 2021).

Se a "compensação" é tomada como um "pagamento duvidoso", nos parece coerente reconhecer que as dúvidas também acompanharão o crédito tributário reconhecido judicialmente, sempre que a sentença for ilíquida. Nesses casos, o contribuinte pode optar por desistir da execução e liquidação judiciais do indébito, e usar o crédito para administrativamente compensar débitos tributários. Nesses casos, caberá à Receita Federal do Brasil  RFB julgar se aceita, ou não, a compensação formulada. Esse juízo depende tanto da avaliação tanto da certeza, quanto do valor (liquidez) do crédito.

Se o crédito é incerto, nos parece concluir que ganho associado ao reconhecimento do crédito pleiteado também deve ser reputado contingente. Logo, coerente com o critério adotado pelo STJ, nos parece que esse ganho somente deve ser tributado quando a Autoridade Fiscal homologar a compensação.

Contudo, não é assim que pensa a RFB. Na Solução de Consulta 183 de 2021, a Coordenação-Geral de Tributação  Cosit, decidiu que "na hipótese de compensação de indébito decorrente de decisões judiciais transitadas em julgado nas quais em nenhuma fase do processo foram definidos pelo juízo os valores a serem restituídos, é na entrega da primeira Declaração de Compensação, na qual se declara sob condição resolutória o valor integral a ser compensado, que o indébito e os juros de mora sobre ele incidentes até essa data devem ser oferecidos à tributação pelo IRPJ". Ou seja, os ganhos com a recuperação do indébito devem integrar o lucro tributável logo quando o contribuinte apresenta sua Declaração de Compensação  Dcomp, e não quando esta é homologada. A mesma conclusão foi aplicada à CSLL.

De acordo com a RFB, a recuperação tributos deve, ou não, ser incluída no lucro tributável, a depender do caso. O ganho com a recuperação deve ser reconhecido como uma receita, sempre que, no passado, o pagamento indevido tenha sido computado como uma despesa dedutível. Quando a despesa não tiver reduzido o lucro tributável, por exemplo, quando o contribuinte se sujeitava ao Lucro Presumido, a sua recuperação não deve ser tributada.

Esse entendimento já se encontrava explícito em seu Ato Declaratório Interpretativo — ADI 25 de 2003. A novidade introduzida pela Solução de Consulta 183 de 2021 é quanto ao momento em que a receita com a recuperação do indébito tributário deve ser reconhecida no lucro tributável. Como vimos, ela entende que o momento é aquele em que o contribuinte entrega a primeira Declaração de Compensação  Dcomp. Todavia, se levarmos em consideração o critério jurídico esposado pelo STJ, o momento deve ser aquele em que a Dcomp é deferida. Afinal, se ela não for deferida, não terá havido pagamento de tributos, logo o ganho não terá se materializado.

Baseado nesse entendimento, o Tribunal Regional Federal  TRF da 3ª Região Fiscal decidiu que "a disponibilidade jurídica ou econômica da renda, como fato gerador do IRPJ e da CSLL, ocorrerá somente no momento da homologação da compensação pelo Fisco e que, portanto, somente nesse momento será devido o IRPJ e a CSLL" (TRF, Apelação Cível 5004691-74.2019.4.03.6114, julgada em 2020).

Esse julgamento nos parecer coerente com a jurisprudência existente do STJ e, em nossa opinião, deve prevalecer sobre aquele manifestado na Solução de Consulta 183 de 2021.

Autores

  • é advogado na Advocacia Tavares Novis, mestre em Direito Tributário pela PUC-SP, LLM em Tributação Internacional pela Universidade de Leiden (Holanda) e especialista em IFRS certificado pelo ICAEW (Reino Unido).

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