Parece mas não é o fim da discussão: PIS/ Cofins e taxa da administradora de cartão
11 de abril de 2022, 6h33
O Plenário do Supremo Tribunal Federal, no último dia 21 de março, ao apreciar o Tema 1.024 da repercussão geral, fixou a seguinte tese: "É constitucional a inclusão dos valores retidos pelas administradoras de cartões na base de cálculo das contribuições ao PIS e da Cofins devidas por empresa que recebe pagamentos por meio de cartões de crédito e débito".
Na discussão analisada pelo Supremo, os contribuintes defendiam haver retenção em percentual variável pelas administradoras, quando o pagamento é efetuado mediante cartões de crédito e débito, a título de remuneração pelo serviço prestado e, portanto, a empresa não receberia a totalidade do valor pago pela mercadoria vendida. O valor retido, então, não poderia ser considerado faturamento para fins de incidência do PIS e da Cofins. A Corte, por sua vez, concluiu pela necessidade de tributação das referidas taxas na origem, por constituírem custo operacional das empresas, integrando o seu faturamento. Essa decisão impacta especialmente as empresas optantes pelo regime tributável do lucro presumido, as quais apuram as contribuições pela sistemática cumulativa.
O tema pendente de julgamento pelo STJ, de outro lado, é mais relevante às empresas optantes pelo lucro real, sujeitas à apuração dos tributos pela sistemática não cumulativa. Por este regime de tributação, é assegurado ao contribuinte o direito de deduzir do tributo devido os créditos de PIS e CofinsOFINS compreendidos no valor dos insumos utilizados na prestação de serviços e na produção ou fabricação de bens ou produtos destinados à venda, nos termos do artigo 3º das Leis nºs 10.637, de 2002 e 10.833, de 2003.
A partir do julgamento do Recurso Especial nº 1.221.170/PR (Temas 779 e 780) pelo Superior Tribunal de Justiça, sob a sistemática dos recursos repetitivos, ficou definido que, para fins de creditamento na forma do artigo 3º das leis supramencionadas, consideram-se insumos os produtos essenciais ou relevantes para o desenvolvimento da atividade desempenhada pela empresa, seja direta ou indiretamente. Conforme entendimento firmado pela Corte Superior, esses critérios devem ser examinados dentro do chamado "teste da subtração", de modo a verificar a importância do bem para a realização da atividade empresarial, mediante a impossibilidade de sua retirada ou, no mínimo, a perda de qualidade.
A Receita Federal, contudo, tem entendido pela impossibilidade de empresas atuantes no ramo comercial apurarem créditos na modalidade de insumos, os quais seriam restritos aos bens e serviços utilizados/desgastados efetivamente na produção de bens destinados à venda e na prestação de serviços, de modo que apenas os gastos diretamente relacionados ao processo produtivo gerariam créditos de PIS/Cofins, conferindo interpretação similar à sistemática de crédito físico do IPI.
O regime de créditos vinculado à técnica da não-cumulatividade, em se tratando do PIS e da Cofins, não encontra na Constituição perfil idêntico ao do IPI. No âmbito da não-cumulatividade do IPI, cujas balizas foram delimitadas no artigo 153, §3º, inciso II, da CF/88, o crédito é restrito ao valor do imposto cobrado nas operações anteriores e, por consequência, o conceito de insumo no caso do referido imposto alcança, fundamentalmente, matérias-primas, produtos intermediários e materiais de embalagem.
O artigo 195, §12, do texto constitucional, ao consagrar expressamente a não cumulatividade do PIS e da Cofins, deve servir necessariamente o vetor interpretativo de maior relevância para a interpretação constitucionalmente adequada de tais contribuições e seus respectivos créditos, sem margem de liberdade atribuída ao legislador para estabelecer contornos jurídicos diversos a essa sistemática.
Conforme parâmetros estabelecidos pelo STJ, no caso do PIS e da Cofins insumo é todo custo e despesa incorridos com a aquisição de bens ou serviços essenciais, vale dizer, imprescindíveis à consecução da atividade empresarial. O conceito de insumo é casuístico, variando conforme a atividade exercida no caso concreto, dispensando expressa previsão legal. Ou seja, o rol do artigo 3º das Leis nºs 10.637/02 e 10.833/03 é exemplificativo.
O Fisco, ao vincular o crédito de PIS/Cofins apenas aos dispêndios diretamente empregados no processo produtivo, nos quais as taxas administrativas de cartão de crédito/débito não se encaixariam, afronta a tese repetitiva firmada pelo STJ. A essencialidade e relevância do dispêndio deve ser analisada casuisticamente, em atenção à atividade econômica desenvolvida pelo contribuinte, podendo alcançar gastos direta ou indiretamente a ela relacionados. Qual modelo de negócios atualmente funcionaria sem uma máquina de cartão de crédito?
Os atuais modelos de negócios tornam indispensável a contratação de sistema de pagamento via cartão de crédito e débito para a concretização de suas vendas, inclusive para fornecer ao consumidor a opção de pagamento parcelado, majoritariamente utilizada no Brasil, além de funcionar como forma de evitar furtos e roubos. Esses métodos de pagamento ganham ainda mais relevância diante do crescimento do comércio eletrônico, potencializado pela pandemia da Covid-19, haja vista a utilização, na maioria das vendas, do método de pagamento via cartão. Sem a oferta ao consumidor da utilização do pagamento via cartão de crédito ou débito, pouca ou quase nenhuma operação seria realizada.
É, inquestionavelmente, um gasto indispensável à percepção de receita, materializando uma conexão entre o exercício da atividade econômica desenvolvida, o processo produtivo para auferir receita própria e o serviço contratado da administradora. Os valores pagos a título de taxas de administração às operadoras de cartões de crédito e débito são despesas, custos, ou, numa intelecção mais abrangente, insumos indissociáveis e inerentes à atividade operacional das empresas, especialmente das varejistas, devendo ser autorizado o creditamento para o PIS e para a Cofins, nos termos do artigo 3º, inciso II, das Leis nºs 10.637/2002 e 10.833/2003. É o que se espera do aguardado julgamento pelo STJ.
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