Opinião

A interpretação conforme a autonomia do Direito

Autor

  • Alexandre José Trovão Brito

    é advogado em São Luís especialista em Direito Penal e Processo Penal pelo Complexo Educacional Damásio de Jesus e membro da Comissão de Direitos Humanos da OAB Seccional Maranhão.

28 de setembro de 2021, 13h32

No Brasil, assistimos ao convênio de justiceiros entre o Ministério Público e o Poder Judiciário. Ora, o estilo acusatório de processo penal não admite jogadas ensaiadas entre os órgãos de persecução penal. Temos uma definição muita clara dos espaços de poder de cada instituição.

Na operação "lava jato", em nome do combate aos crimes praticados pelos réus, admitiu-se a subversão dos direitos e garantias fundamentais. Permitiu-se o atropelo dos princípios constitucionais. Prisões preventivas se arrastaram no tempo, acusados permaneceram custodiados durante um longo período para que fossem forçados a delatar seus comparsas etc.

O devido processo, a imparcialidade e a presunção de inocência são os founding fathers of law. Em bom português, eles são os pais fundadores do Direito. Eles valem. Devem ser respeitados. Os princípios são os fios condutores da autoridade do Direito.

O que estamos fazendo com o Direito no Brasil? Estamos criando uma era do pós-Direito, ou seja, uma realidade na qual não existem mais leis, apenas opiniões. De outro lado, não podemos reduzir a ordem jurídica a um simples repositório de textos legais. Os textos foram criados para vincular a atuação dos agentes públicos e dos cidadãos.

Por isso minha proposta é realizar uma interpretação conforme a autonomia do Direito. O que isso significa? Vale dizer que a interpretação das leis e da Constituição deve levar em consideração a autoridade do Direito e não instâncias como a moral, a política e a economia. O Direito deve ter o máximo grau de obediência. É isso que o faz ser Direito.

Durante muito tempo a força dos exércitos prevaleceu sobre códigos de paz. A partir do momento em que o Direito passou a ter força vinculante, a força das armas passou a obedecer aos códigos jurídicos. A paz, o desenvolvimento e a segurança foram conquistas civilizacionais da humanidade. E elas foram pavimentados pelos nossos códigos legais.

As revoluções foram forjadas em nome do Direito. Os códigos legais foram criados para civilizar os indivíduos pertencentes às comunidades de cidadãos. Não vejo nada no mundo que não passe pelo filtro do Direito. Ele nos acompanha antes do nascimento (v.g. os direitos do nascituro) até depois da morte (v.g. o inventário).

Voltando ao tema dos direitos e das garantias fundamentais, o que nos sustenta enquanto civilização é o respeito aos procedimentos, aos protocolos e aos nossos códigos legais. O Direito não pode ser abandonado em nome de inclinações pessoais dos agentes estatais.

Outro fator importante para a viabilização da ordem jurídica é o apego dos nossos cidadãos à lei e à constituição. Não se faz um ordenamento jurídico apenas com bons códigos. O respeito às normas exige boas doses de republicanismo e de participação política no cenário institucional do país.

Portanto, não podemos esquecer aquilo que nos formou enquanto comunidade político-jurídica: o Direito. Ele está em tudo, sempre esteve. Trata-se de um pilar institucional do mundo. Assim como um médico não pode esquecer a anestesia em procedimentos cirúrgicos, os juristas não podem esquecer dos seus instrumentos de trabalho, vale dizer, as leis e a Constituição.

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