Dobradinha mortal

Condenação é anulada nos EUA porque promotor também era auxiliar do juiz

Autor

27 de setembro de 2021, 11h21

O Tribunal de Recursos Criminais do Texas anulou a condenação à pena de morte de Clinton Lee Young, porque um dos promotores que o acusaram de homicídio também trabalhava como auxiliar do juiz que presidiu o julgamento.

Reprodução
De acordo com a decisão, o promotor Weldon Ralph Petty prestava serviços remunerados ao juiz John Hyde e a alguns de seus colegas no fórum do Condado de Midland, no Texas (EUA), na época em que integrou a equipe de três promotores que processaram o réu.

No fórum, a principal função de Petty era auxiliar os juízes a responder a pedidos de habeas corpus. Ele examinava os pedidos, fazia pesquisas de fatos e de legislação, apresentava recomendações e propunha ordens judiciais aos juízes.

No caso de Young, ele se opôs à concessão de habeas corpus, ao mesmo tempo em que integrava a acusação, segundo a decisão per curiam (pelo tribunal como um todo) do Tribunal de Recursos Criminais do Texas. A decisão diz, entre outras coisas:

"Petty participou ativamente da equipe de acusação. Basicamente, ele atuou como assessor jurídico da equipe que estava processando o réu e, provavelmente, escreveu todas as petições do caso. Ele também apareceu no fórum diversas vezes, durante os procedimentos do julgamento, para fazer alegações sobre questões jurídicas particulares." 

"A má conduta do juiz e do promotor, na forma de um relacionamento de emprego não revelado entre o juiz que presidiu o julgamento e o promotor que atuou no julgamento, deslegitimou todo o procedimento, desde o começo. Consequentemente, pouca confiança pode ser colocada na justeza dos procedimentos ou no resultado do julgamento do réu. Foi negado ao réu os direitos do devido processo a um juiz imparcial e a um julgamento justo."

Young foi condenado em 2001 e sentenciado à pena de morte em 2003. Ele e um amigo foram acusados de roubar o carro de um traficante, e ele, de matá-lo. Young insistiu no julgamento e em dois recursos posteriores que quem matou o traficante foi seu amigo David Page. Ele estaria dormindo no carro depois de consumir metanfetamina.

Porém, os promotores fizeram um acordo de delação premiada com Page, que serviu de testemunha contra Young no julgamento. Page pegou uma pena menor, por sequestro.

Para o bem do Ministério Público, quem salvou Young — e iniciou os procedimentos que o tiraram do corredor da morte — foi uma promotora.

A nova chefe da Promotoria do Condado de Midland, Laura Nodolf, que foi eleita para o cargo em 2016, descobriu por acaso, quando trabalhava no orçamento da Promotoria com a ajuda de um diretor do Judiciário local, que Petty também trabalhava para o fórum criminal do condado, ao mesmo tempo em que exercia suas funções de promotor.

Ela enviou notificações a cerca de 300 prisioneiros, entre os quais Young, informando-os que Petty trabalhou nos pedidos de habeas corpus deles e explicou a questão do conflito de interesses de seu funcionário. Os dois chefes da Promotoria do condado anteriores sabiam que Petty prestava serviços ao fórum criminal, mas fizeram vistas grossas.

O tribunal de recursos deixou na mão da Promotoria a decisão de voltar a processar Young criminalmente — ou não. Laura Nodolf se recusou a fazê-lo, por uma questão de conflito de interesses, e repassou o caso para a Promotoria de outro condado de Dawson, de acordo com o Texas Tribune e o Jornal da ABA (American Bar Association).

Segundo a decisão, os fatos estabelecem violações das "Regras Disciplinares de Conduta Profissional do Texas". Por isso, Petty foi investigado, mas ele se aposentou e, em abril, renunciou a sua licença para advogar, para evitar as consequências de um processo disciplinar. O juiz John Hyde, que presidiu o julgamento, morreu em 2012.

Autores

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!