"Coação da população"

TJ autoriza Clube Militar e Clube Naval do Rio a aceitarem não vacinados

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24 de setembro de 2021, 15h48

Não há correlação entre a exigência de apresentação do "passaporte da vacina" contra a Covid-19 para ingresso em clubes e a contenção da disseminação do coronavírus. Afinal, a vacinação não impede o contágio pela doença.

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Clube Militar do Rio de Janeiro pode receber sócios não vacinados
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Com esse entendimento, a desembargadora do Tribunal de Justiça fluminense Elisabete Filizzola concedeu, nesta quinta-feira (23/9), liminar para permitir que os associados possam frequentar o Clube Militar e o Clube Naval do Rio de Janeiro sem comprovarem que foram imunizados contra a Covid-19.

O Decreto municipal 49.335/2021 condiciona a entrada e a permanência em determinados estabelecimentos e locais de uso coletivo à comprovação da vacinação contra Covid-19 correspondente à primeira, segundo ou única dose, a depender da idade da pessoa e o seu cumprimento do cronograma de imunização instituído pela Secretaria municipal de Saúde.

Os clubes argumentaram que o decreto isentou da exigência de apresentação do "passaporte da vacina" estabelecimentos com maior probabilidade de gerar aglomerações, como bares e shopping centers. E isso, segundo os militares, configura discriminação indevida. Eles também alegaram violação dos direitos de ir e vir, da dignidade da pessoa humana e da não interferência estatal no funcionamento das associações.

Além disso, o Clube Militar e o Clube Naval sustentaram que "a eficácia das vacinas (bem como a sua segurança) está repleta de incertezas, como comprova a atual discussão em torno da necessidade de aplicação de uma dose de reforço dos imunizantes" e que a própria Organização Mundial de Saúde "se coloca contra a obrigatoriedade da vacina, indicando que os seus países membros devem envidar esforços no sentido de orientar e conscientizar as suas populações".

Em sua decisão, a desembargadora Elisabete Filizzola apontou que a motivação do decreto não justifica a exigência do "passaporte da vacina". Com relação à incerteza quanto à evolução da epidemia, é necessário adotar medidas de isolamento social e protocolos sanitários. Mas isso não obriga as pessoas a comprovar vacinação, disse a magistrada.

Ela também avaliou que não há nítida correlação entre a "necessidade de se conter a disseminação da Covid-19, garantindo-se o funcionamento dos serviços de saúde, para preservação da saúde pública" e a proibição de não vacinados frequentarem clubes. Elisabete ressaltou que a vacinação reduz a gravidade dos que se contaminam, mas não impede a propagação do coronavírus.

"Isso porque a presença exclusiva de vacinados nas dependências do clube não é fator decisivo à não circulação do vírus, afinal, é mesmo notória — está em todos os jornais — a constatação de que a vacinação contra a Covid-19, lamentavelmente, não impede a contaminação daqueles que foram vacinados, o que determina, portanto, a manutenção das idênticas cautelas sanitárias desde sempre adotadas, independentemente de estarem ou não vacinados os frequentadores."

Intenções do prefeito
O prefeito do Rio de Janeiro, Eduardo Paes (PSD), afirmou na terça (21/9), em live, que o "passaporte da vacina" aumentou o número de imunizados contra a Covid-19 na cidade.

"A gente tinha essa coisa do 'passaporte da vacina', para vocês terem uma ideia, a gente tinha empacado em mais ou menos 95, 96%. Com o passaporte, a gente foi para quase 100%. Então, tínhamos uns 4%, 5% das pessoas mais rebeldes que entenderam a importância da vacina e que foram se vacinar", disse Paes.

Para Filizzola, a fala do prefeito demonstra que "o 'passaporte da vacina' imposto por seu decreto guarda muito mais relação com a ideia de coação da população a se vacinar do que com a contenção do contágio, em si mesma considerada".

Dessa maneira, há dúvidas sobre a adequação da exigência da vacinação para frequentadores de clubes para conter a disseminação do vírus, uma vez que essa medida, por si só, não impede a circulação do coronavírus, avaliou a magistrada.

Ela ainda destacou que, no mérito, será preciso avaliar se a exigência de comprovante de vacinação poderia ter sido imposta por decreto — ou se só seria válida por lei. E declarou que a norma não tratou os estabelecimentos do Rio de forma igualitária.

"Por derradeiro — mas, talvez, principalmente — avulta a momentânea perplexidade com o caráter aparentemente anti-isonômico do rol estabelecido pelo Poder Público municipal para disciplinar os locais em que a circulação de não vacinados está proscrita. O decreto arrolou clubes, academias de ginástica, convenções, museus etc., mas não contemplou bares, restaurantes, shopping centers, lojas e congêneres, que promovem atividades econômicas de potencial aglomerativo ainda maior que as atividades dos recorrentes."

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Processo 0069278-54.2021.8.19.0000

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