Opinião

Pensão alimentícia: é possível, sim, pedir prestação de contas

Autor

  • Danielle Corrêa

    é advogada pós-graduada em Direito de Família e Sucessões e membro da OAB-SP e do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFam).

24 de setembro de 2021, 21h07

Tenho certeza de que, em algum momento, uma mãe ou pai divorciado que detém a guarda do filho já se perguntou sobre a possibilidade de exigir a prestação de contas da pensão alimentícia. Afinal, sempre há uma certa desconfiança quando o assunto é dinheiro. Quando há uma discussão familiar, rivalidade entre pai e mãe, aí que a suspeita aumenta. 

O alimentante, quando é o pai, o que ocorre em sua grande maioria, acredita fielmente que está pagando para suprir as despesas pessoais da mãe, como idas ao salão, lazer e shopping. Sabemos que a realidade é um pouco dura, isso porque algumas vezes a pensão é fixada com um valor bem abaixo do necessário para sustentar uma criança. Ou seja, arcar com as necessidades do filho é uma tarefa quase impossível, que dirá utilizar o que sobra para gastar com luxos. Nessas situações, infelizmente, aquele que está pagando a pensão alimentícia cria situações imagináveis e começa a desconfiar do objetivo da pensão alimentícia. 

Assim como há uma desconfiança sem justificativa, há pais que abusam do poder de administrar a pensão alimentícia para benefício próprio, ou seja, utilizam o valor com gastos que não pertencem ao filho. Nesses casos, a prestação de contas pode ser extremamente eficaz, uma vez que a única vítima do descontrole do administrador é a criança. Quando isso acontece, algumas necessidades básicas do descendente são deixadas de lado a fim de substituir despesas do pai ou da mãe.

A prestação de contas da pensão pode ser exigida quando um dos pais detém a guarda unilateral da criança, enquanto o outro arca com o pagamento mensal da pensão. Além de preencher esse requisito, é necessário que o solicitante comprove indícios do desvio. Não basta simplesmente requerer, tem de justificar que há possibilidade dos valores estarem sendo desviados para suprir as necessidades do detentor. 

Sendo assim, não pense em pedir a prestação de contas apenas para monitorar qualquer gasto, tendo em vista que o principal objetivo da prestação é mitigar o uso abusivo com gastos alheios à necessidade da criança. A solicitação pode ser feita pelo alimentante, pois ele é o único que detém legitimidade para ajuizar a ação de exigir contas. Enquanto o polo passivo será aquele que administra a pensão alimentícia, ou seja, quem detém a guarda. 

Anteriormente a 2014, o Superior Tribunal de Justiça não reconhecia a possibilidade de ajuizar o pedido, sob o fundamento de que o alimentante não tinha legitimidade para tal. Ocorre que naquele ano foi instituída a Lei Federal nº 13.058/2014, que incluiu o artigo 5 do artigo 1.583 do Código Civil, o qual dispôs que "qualquer um dos genitores sempre será parte legítima para solicitar informações e/ou prestação de contas, objetivas ou subjetivas, em assuntos ou situações que direta ou indiretamente afetem a saúde física e psicológica e a educação de seus filhos"

Em 2020, o STJ determinou que uma mãe prestasse as contas dos valores gastos, uma vez que o pai (que ajuizou a ação) tinha provas de que os valores pagos a título de pensão estavam sendo desviados para suprir despesas não pertencentes ao filho. Maria Berenice Dias, vice-presidente nacional do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM), entende que a prestação de contas não precisa ser apresentada de forma contábil, uma simples comprovação já é suficiente para demonstrar os gastos. 

Ainda seguindo o seu pensamento, discorreu que "essa possibilidade já está prevista em lei, como se dá no processo de prestação de contas. Com isso, é possível ver como esse dinheiro está sendo aplicado para atender as necessidades do filho". Portanto, é totalmente possível exigir a prestação de contas, desde que requerida em juízo e devidamente comprovada que há indícios de desvio. 

Vale ressaltar que a prestação não deve ser utilizada como forma de perseguir o (a) ex-cônjuge. No Direito de Família, o bem a ser protegido será sempre será a criança. 

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