Consultor Jurídico

Pereira e Blum: A exclusão do ICMS da base de cálculo da CPRB

10 de setembro de 2021, 9h14

Por Marcello Pedroso Pereira, Rodrigo Blum

imprimir

No presente artigo, trataremos da sistemática de apuração da base de cálculo da Contribuição Previdenciária sobre a Receita Bruta (CPRB), mais especificamente da necessidade ou não de tributação do ICMS que compõe transitoriamente a receita bruta das empresas.

Inicialmente, destacamos que a CPRB foi criada pela Lei nº 12.546/2011 com o objetivo de desonerar (reduzir a carga tributária) da folha de pagamento. Esse regime substitutivo está em vigor até hoje, com algumas alterações desde a sua criação.

Em 2017, a partir da decisão do Supremo Tribunal Federal que declarou inconstitucional a inclusão do ICMS da base de cálculo do PIS/Cofins (RE nº 574.706), ganhou força o seguinte raciocínio: valores referentes a tributos que transitam na contabilidade de forma provisória para posterior repasse aos cofres públicos não compõem a receita definitiva das empresa, não devendo ser objeto de tributação.

Como não poderia deixar de ser, surgiu uma verdadeira hecatombe de teses que objetivavam a aplicação desse racional ao procedimento de apuração da base de cálculo dos demais tributos incidentes sobre a receita bruta.

Essas teses receberam o nome comum de "teses filhotes", sendo que, entre tais teses, está aquela que discute a tributação do ICMS pela CPRB.

Por conta do altíssimo volume de processos discutindo essa questão, o STJ resolveu pacificar o entendimento e uniformizá-lo para todos os contribuintes do território nacional.

Nesse cenário, em 10/4/2019, foi julgado o Tema nº 994 dos recursos especiais repetitivos pelo STJ, ocasião em que foi declarado que "os valores de ICMS não integram a base de cálculo da Contribuição Previdenciária sobre a Receita Bruta — CPRB, instituída pela Medida Provisória nº 540/2011, convertida na Lei nº 12.546/2011".

Em vista de tratar-se de recurso especial repetitivo, essa tese passou a gozar de eficácia vinculante, de modo que todos os contribuintes — independentemente do ajuizamento ou não de ação judicial sobre o tema — teriam de segui-la a partir de então.

Com a decisão do STJ, os contribuintes optantes pelo sistema substitutivo da CPRB ajustaram suas contabilidades para não incluir a parcela provisória do ICMS na base de cálculo final da CPRB.

A seu favor, existiam dois precedentes fortíssimos, com caráter vinculante, do STF e do STJ sobre a matéria, de modo que o cenário parecia resolvido. Após quatro anos da decisão do STF e após dois anos da decisão do STJ, aquele mesmo caso analisado pelo STJ foi enviado para julgamento da questão pelo STF a pedido da Fazenda Nacional.

Infelizmente, o ano de 2021 começou com uma péssima notícia para o Direito Previdenciário/Tributário e para a segurança jurídica nacional, pois o STF reverteu o entendimento vinculante das decisões citadas, determinando que o "é constitucional a inclusão do Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e Serviços — ICMS na base de cálculo da Contribuição Previdenciária sobre a Receita Bruta — CPRB" (RE nº 1.187.264 (Tema nº 1.048 de repercussão geral).

É muito importante demarcar desde já que o principal motivo que levou o STF a modificar seu entendimento foi o fato de que a escolha pela CPRB em detrimento da tributação da folha é mera opção dos contribuintes, de modo que seria incabível aliar à opção da tributação mais favorável a possibilidade de redução da carga tributária pela exclusão do ICMS da base de cálculo da CPRB.

Como se não bastasse, agora no final de agosto foi finalizado o julgamento virtual dos embargos de declaração que foram apresentados após o julgamento da questão pelo STF e a reversão total dos entendimentos sobre o tema.

Nem mesmo a tão conhecida e discutida técnica de modulação de efeitos foi aplicada pela Corte Constitucional, de modo que, realmente, os contribuintes que ajustaram suas contabilidades e não mais tributaram o ICMS pela CPRB nos últimos cinco anos ficaram expostos a autuações. Nesse contexto, não seria errado concluir que as recentes decisões da carte não estão dissociadas no cenário econômico e crise financeira vivida pelo país em tempos pandêmicos. Entretanto, esperava-se, no mínimo, a utilização da técnica de modulação dos efeitos para fazer com que, excepcionalmente, os efeitos do julgamento fossem aplicados apenas no futuro, isto é, apenas no período posterior à decisão, não atingindo o passado, de modo a não expor os contribuintes a tantos riscos.

Em que pese a densidade da discussão, válido ressaltar que, neste mesmo ano de 2021, no mês de abril, os embargos de declaração apresentados pela Fazenda Nacional no primeiro precedente que autorizou a exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS/Cofins foram parcialmente providos para que fosse reconhecida como indevida a tributação do ICMS apenas a partir da decisão de 2017 e não no tocante ao período anterior.

Desse modo, sob o argumento da segurança jurídica, esperava-se que o STF restringisse os efeitos da decisão ao menos a partir da decisão do STJ de 2019, em virtude da mudança repentina da jurisprudência sobre o tema.

Contudo, a cada julgamento tributário decidido em favor da Fazenda Nacional, com aplicação ou não da técnica da modulação dos efeitos do julgamento, parece-nos que caminhamos para uma pergunta sem resposta para a seguinte questão: "Existe segurança jurídica no Brasil?".

A ver os próximos passos e caminhos dos julgamentos de relevante impacto financeiro que estão por vir, sempre com a esperança de que a Constituição Federal e a segurança jurídica prevaleçam sobre todo o resto.