Opinião

A racionalização processual promovida pela Lei 14.195/2021

Autor

  • Rodrigo Pereira Cuano

    é advogado da área Corporate do escritório Reis Advogados (SP) especialista em Direito Processual Civil reestruturação e recuperação de empresas e em Direito Digital e integrante da Comissão Jurídica de Direito Bancário do Instituto dos Advogados de São Paulo (Iasp).

3 de setembro de 2021, 15h04

Publicada no último dia 26, a Lei 14.195 trouxe alterações em nossa legislação processual civil, como a regulação de atos processuais e a prescrição intercorrente. Entre as inovações temos o dever das partes, de seus procuradores e de todos aqueles que de qualquer forma participem do processo informar e manter atualizados os seus dados cadastrais perante os órgãos do Poder Judiciário.

Além disso, as empresas públicas e privadas serão obrigadas a manter cadastro nos sistemas de processo em autos eletrônicos, para efeito de recebimento de citações e intimações, sendo previsto, ainda, o compartilhamento de cadastro, incluído o endereço eletrônico constante do sistema integrado da Redesim, com o órgão do Poder Judiciário.

Trata-se de medida que busca dar maior efetividade e celeridade à prestação jurisdicional, já que a nova disposição do artigo 246 do Código de Processo Civil prevê que a "citação será feita preferencialmente por meio eletrônico, no prazo de até 2 (dois) dias úteis, contado da decisão que a determinar, por meio dos endereços eletrônicos indicados pelo citando no banco de dados do Poder Judiciário, conforme regulamento do Conselho Nacional de Justiça".

Somente no caso de ausência de confirmação, em até três dias úteis, contados do recebimento da citação eletrônica, implicará realização da citação por quaisquer dos outros meios previsto no Código de Processo Civil — 1) pelo correio; 2) por oficial de Justiça; 3) pelo escrivão ou chefe de secretaria, se o citando comparecer em cartório; e 4) por edital.

Não obstante tal fato, na primeira oportunidade de se manifestar no processo o réu citado por quaisquer das formas que não a eletrônica deverá apresentar justa causa para a ausência de confirmação do recebimento da citação enviada eletronicamente, sob pena de, não o fazendo, tal fato ser considerado como atentatório à dignidade da Justiça, passível de multa de até 5% do valor da causa.

Com a alteração realizada, portanto, a citação por meio eletrônico, que antes era preferencial apenas para as empresas "obrigadas a manter cadastro nos sistemas de processo em autos eletrônicos", passa a ser a modalidade preferencial de citação em qualquer caso, inclusive para pessoas naturais, nos termos do que vier a ser regulamentado pelo Conselho Nacional de Justiça.

Nesse aspecto, em que pese a redação do caput do artigo 246 mencionar "endereço eletrônico", entendo que há possibilidade de ser regulamentada a citação por aplicativos de mensagens, como o WhatsApp, pelo CNJ. O Superior Tribunal de Justiça, inclusive, em um caso criminal admitiu como válida a citação pelo referido aplicativo em sendo possível comprovar a autenticidade da conversa (HC 641.877/DF, relator ministro Ribeiro Dantas, 5ª Turma, j. 9/3/2021).

Um ponto de atenção quanto à alteração realizada é que o artigo 5º da Lei 11.419/2006 não foi expressamente revogado pela Lei 14.195/2021. Nesse aspecto, há um claro conflito entre o artigo 231, V, do CPC, que disciplina que o início do prazo é a data da consulta e o artigo 5º, §2º, da Lei 11.419/2006, quando esta se dá "por meio eletrônico em portal próprio".

Já quanto à prescrição intercorrente, a alteração estabeleceu no artigo 921, III, que a execução será suspensa quando "não for localizado o executado ou bens penhoráveis" e o termo inicial da prescrição no curso do processo será a ciência da primeira tentativa infrutífera de localização do devedor ou de bens penhoráveis, e será suspensa, por uma única vez, pelo prazo máximo de um ano, sendo certo que uma vez firmada a efetiva citação, intimação do devedor ou constrição de bens penhoráveis, o prazo prescricional será interrompido e não correrá pelo tempo necessário à citação e à intimação do devedor, bem como para as formalidades da constrição patrimonial, se necessária, desde que o credor cumpra os prazos previstos na lei processual ou fixados pelo juiz.

A Lei 14.195 dispõe também sobre:

Facilitação para abertura de empresas;

Proteção de acionistas minoritários;

Facilitação do comércio exterior;

Sistema Integrado de Recuperação de Ativos (Sira);

Cobranças realizadas pelos conselhos profissionais;

Profissão de tradutor e intérprete público;

Obtenção de eletricidade;

Desburocratização societária (a íntegra das alterações pode ser conferida aqui).

Em conclusão, o que se espera é que as alterações tragam maior celeridade e segurança jurídica ao encaminhamento dos processos judiciais, fatores esses necessários para uma prestação jurisdicional mais efetiva e eficaz.

Autores

  • Brave

    é advogado da área Corporate do escritório Reis Advogados (SP), integrante da Comissão Jurídica de Direito Bancário do Instituto dos Advogados de São Paulo (IASP), membro associado do TMA (Turnaround Management Association) e especialista em Direito Processual Civil pela Universidade Presbiteriana Mackenzie, com extensão em reestruturação e recuperação de empresas pela FGV Direito, Escola Paulista da Magistratura, OAB/SP e IBAJUD e em Direito Digital Aplicado pela FGV Direito.

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