Opinião

Revolução digital e amplitude prática da proteção à privacidade digital

Autor

30 de outubro de 2021, 6h03

A proteção de dados pessoais é direito fundamental reconhecido pela Constituição do Brasil. A proposta de autoria da senadora Simone Tebet materializou no texto constitucional a garantia à proteção dos dados privados, inclusive nos meios digitais. A emenda à Constituição confirma a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal que prestigia a privacidade de tais informações.

No plano internacional, Alemanha e França foram pioneiras ao proteger os dados pessoais na década de 1970 [1]. A União Europeia reconheceu a garantia à privacidade de dados na Convenção 108/1981 do Conselho da Europa  convenção para proteção das pessoas em relação ao tratamento automatizado de dados pessoais. Em 1974, os Estados Unidos promulgaram o Privacy Act [2] para proteger a privacidade de registros pessoais em bancos de dados do governo federal. E, desde 1995, o Parlamento Europeu e o Conselho da União Europeia contam com a Diretiva 95/46/CE, que trata a proteção de informações pessoais como direito fundamental.

No Brasil, o Marco Civil da Internet e a Lei Geral de Proteção de Dados já previam proteções específicas para os dados pessoais, porém a garantia agora se encontra em nível constitucional, o que amplia o alcance prático da proteção à privacidade digital.

A informática transformou a geração de riqueza, a atividade econômica e o balanço de poder nas sociedades. Impérios comerciais surgiram a partir do tratamento de dados pessoais, novas profissões foram criadas e a rotina de todos foi profundamente transformada. Facebook (Whatsapp e Instagram), Tencent, Baidu, Google, Amazon têm em comum a extração e o processamento intenso dessas informações e a rápida ascensão para a lista das maiores empresas do planeta. Com efeito, as cinco maiores empresas listadas na bolsa norte-americana  Amazon, Google, Facebook, Microsoft e Apple  representam juntas valor de mercado de aproximadamente US$ 4,5 trilhões de e todas atuam na economia digital.

Chamada Indústria 4.0 ou Revolução Digital, o fato é que a extração, a análise, o aproveitamento e a comercialização de informações, em especial os dados pessoais, respondem hoje por parcela significativa da economia mundial.

O termo ciberespaço, cunhado no romance "Neuromancer", publicado em 1984, denomina o locus virtual onde se operam transações comerciais e relacionamentos pessoais sem a necessidade da presença física. O Facebook anunciou o projeto de construção de ambiente digital para realização de atividades, eventos ou apresentações virtuais. A iniciativa, chamada de metaverso, irá transformar o ambiente de trabalho, os encontros de família e até mesmo o entretenimento cotidiano.

Todas essas inovações, entretanto, oferecem campo fértil para a extração de dados pessoais dos usuários das plataformas. Além disso, a extração de tais dados representa oportunidade para a prática de delitos tais como a usurpação de identidade, assédio ou perseguição, desvio ou apropriação de dinheiro, tomada de empréstimos e golpes comerciais variados. Ainda mais abrangente, algoritmos que analisam essas informações para prever e influenciar o comportamento se tornaram uma nova fronteira empresarial.

Com efeito, as mais diversas atividades foram compelidas a se amoldar ao novo núcleo gerador de riqueza, poder, status e reconhecimento que é o processamento maciço de dados. Então, a inserção na Constituição da garantia à privacidade, inclusive quanto aos dados digitais, veio em boa hora para assegurar que todas as normas legais e regulamentares serão interpretadas conforme a diretriz de proteção do titular dos dados quanto ao acesso, ao controle, ao processamento e ao aproveitamento de suas informações.

 

[1] Em 07 de janeiro 1978 a França publicava a Lei 78-17/1978 relativa "à Informática, aos Arquivos e à Liberdade", diploma que inseriu formalmente direitos informáticos no rol dos direitos fundamentais.

[2] [5 U.S.C. §552a (1974)].

Autores

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!