Consultor Jurídico

Se repetir 2018, registros serão cassados em 2022, avisa Moraes

28 de outubro de 2021, 12h37

Por Danilo Vital

imprimir

Se em 2022 houver registro de ação de milícias digitais como o "gabinete do ódio", que impulsionou a campanha de Jair Bolsonaro à presidência da República por meio de disparos em massa via WhatsApp, registros de candidatura serão cassados e pessoas serão presas.

Marcos Oliveira/Agência Senado
Ministro Alexandre de Moraes vai presidir o TSE durante as eleições de 2022
Marcos Oliveira/Agência Senado

O aviso foi dado pelo ministro Alexandre de Moraes, durante o julgamento em que o Tribunal Superior Eleitoral rejeitou a cassação da chapa Bolsonaro-Mourão pela prática do ilícito, em duas ações de investigação judicial eleitoral. O colegiado reconheceu a ocorrência do ilícito, mas não viu provas de sua gravidade no contexto eleitoral.

Para Moraes, penúltimo a votar, a importância do caso reside em deixar muito claro que, a partir de agora, a Justiça Eleitoral não será pega de surpresa pela atuação dessas milícias digitais.

Isso fica claro a partir da tese fixada pelo colegiado, que permite o enquadramento de aplicativos de mensagem instantânea como meios de comunicação pelos quais será possível enquadrar a conduta de abuso de poder tipificada no artigo 22 da Lei Complementar 64/1990.

"Esse será precedente é importantíssimo para que a Justiça Eleitoral possa ter mais um instrumento importante e passe um recado claro: se houver repetição do que foi feito em 2018, o registro será cassado e as pessoas que assim fizerem irão para cadeia, por atentar contra as eleições e contra a democracia no Brasil", apontou.

Ao votar, o futuro presidente do TSE disse que "todo mundo sabe o que aconteceu" em 2018: o "gabinete do ódio" identificado em inquéritos do Supremo Tribunal Federal e operado por pessoas próximas a Bolsonaro montou estrutura para difundir notícias falsas e atacar opositores do candidato vencedor, modus operandi que se manteve pós-eleição e se voltou ao ataque ao sistema eleitoral e às instituições democráticas.

Nelson Jr./SCO/STF
Ministro Fachin será o próximo presidente do TSE e alertou para a atenção da corte para com brechas legistlativas
Nelson Jr./SCO/STF

"Não podemos confundir neutralidade da Justiça, que tradicionalmente se configura pela ideia de ela ser cega, com tolice. A Justiça Eleitoral não é tola. Podemos absolver por falta de provas, mas sabemos o que ocorreu. Sabemos o que vem ocorrendo e não vamos permitir que isso ocorra", prometeu.

Destacou que, ao julgar um caso como o de Bolsonaro, o Judiciário não pode "passar pano" depois de tudo que se identificou. E criticou o que chamou de "política de avestruz" das redes sociais nos últimos anos, que subestimaram as movimentações da extrema direita, o que permitiu que ideais fascistas se espalhassem e ganhassem terreno.

Por isso, apontou ser uma ingenuidade achar que rede social e Whatsapp não são meios de comunicação social. Entende que elas são o principal meio de comunicação, fonte primária de informação de grande parte da população mundial, fator que justamente impulsiona a atuação das milícias digitais.

"Houve disparo em massa. Houve financiamento não declarado para esses disparos. O lapso temporal pode ser impeditivo de uma condenação, mas não é impeditivo da absorção pela Justiça Eleitoral do modus operandi que foi realizado e que vai ser combatido nas eleições de 2022", disse.

Istockphoto
Preocupação do TSE é com uso malicioso de redes sociais e aplicativos de mensagem durante processo eleitoral
Istockphoto

Brechas vigiadas
A importância do posicionamento do TSE no momento político conturbado que vive o mundo foi ressaltada por outros ministros.

Antes de Moraes chegar à presidência, ela será ocupada pelo ministro Luiz Edson Fachin, que destacou a atenção permanente da Justiça Eleitoral com a exploração indevida e ilícita das chamadas brechas normativas e do uso abusivo de realidades tecnológicas contra as regras democráticas.

Se é verdade que os avanços tecnológicos e as estratégias de campanha estão sempre à frente do texto normativo, a função do TSE é justamente construir marcos jurisprudenciais e, a partir deles, delimitar as possibilidades de atuação e limitar os atos ilícitos, afirmou.

"A atenção e a realidade social instauradas a partir de 2018 permitiu que essa Justiça Eleitoral se organizasse e se preparasse para o enfrentamento célere e eficaz do desafio eleitoral que se anuncia, seja no campo da propaganda ou do uso da internet por todas as suas plataformas", disse o ministro Fachin.

Nelson Jr./SCO/STF
Ministro Barroso destacou que redes sociais devem ser "chamadas ao senso" para não se tornarem palco de ameaças eleitorais
Nelson Jr./SCO/STF

Decisão para o futuro
Em complemento, o atual presidente da Corte, ministro Luís Roberto Barroso, apontou que a decisão no caso Bolsonaro-Mourão não é para o passado, mas para o futuro.

"Estamos procurando demarcar os contornos que vão pautar a democracia brasileira e as eleições do próximo ano dentro de um quadro em que as pessoas coloquem suas ideias na mesa e não da desqualificação do voto com mentiras e teorias conspiratórias", afirmou.

Para Barroso, o caso trata de novos meios de cometer velhos ilícitos. Se a propaganda eleitoral migrou para os meios virtuais, é preciso acomodar as práticas abusivas surgidas nesse novo paradigma ao texto da LC 64/1990, que já completou 30 anos, de modo a permitir o devido controle da legitimidade dos atos eleitorais.

"É preciso chamar as mídias sociais ao senso, para que o ganho financeiro não permita sua autodestruição moral e a destruição da democracia. As mídias sociais podem se transformar em um grande espaço público que permita a participação no processo democrático. Não podem se transformar num coliseu romano de barbaridades", afirmou.

"Precisamos de legislação, de atuação judicial e de atuação voluntária das próprias mídias sociais, para que sejam um espaço construtivo de ideias, não um espaço destrutivo", complementou o presidente do TSE.

0601771-28.2018.6.00.0000
0601968-80.2018.6.00.0000