Opinião

Quem quer o bônus deve arcar com o ônus: inadimplência dos restos a pagar no Rio

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28 de outubro de 2021, 12h13

A Câmara de Vereadores do município do Rio de Janeiro aprovou, no último dia 21, o Projeto de Lei Complementar nº 04/2021, que cria o novo regime fiscal do município, estabelece normas de finanças públicas voltadas para a responsabilidade na gestão fiscal e define mecanismos de controle, estabilização e preservação para corrigir os desvios que afetaram o equilíbrio das contas públicas.

Na prática, a lei autoriza o prefeito a descumprir algumas normas gerais de Direito Financeiro, sobretudo as contidas na Lei de Responsabilidade Fiscal.

O projeto de lei complementar é inconstitucional, uma vez que irá alterar as normas gerais da legislação nacional, estabelecidas no artigo 65 da Lei Complementar nº 101/00 (LRF). O estado de calamidade deve ser reconhecido pela Assembleia Legislativa, e não pela Câmara de Vereadores, para que as concessões previstas sejam concedidas. Indubitavelmente, a submissão dessa lei ao Poder Legislativo municipal possui o desejo de autorização para realização de operações de créditos, com o fim de resguardar o prefeito de eventual crime de responsabilidade, nos termos do Decreto-Lei nº 201/67.

O município do Rio de Janeiro não pagou as despesas públicas do ano anterior: várias estratégias foram adotadas pelo chefe do Poder Executivo para não quitar essas despesas. O gasto realizado no ano de 2020 deveria ser pago em 2021 mediante auditoria das despesas realizadas pelo gestor anterior.

A auditoria foi realizada e todos os ordenadores de despesas, ratificados. Diante de toda essa análise, vendo-se obrigado a quitar aquelas despesas, o prefeito decretou a suspensão de qualquer pagamento e despesas realizadas no exercício anterior. E, com isso, as empresas vêm suportando essa inadimplência. Atualmente, o discurso é que seus contratos estão em dia, mas não estão. Os contratos deste ano estão pagos, mas as despesas de 2020 permanecem sem pagamento. Por isso, o município continua na inadimplência.

Com isso, a vítima mais afetada é a sociedade. O político não pode tratar o seu antecessor como inimigo, mas, sim, como adversário político. A sociedade jamais será inimiga do seu gestor escolhido. Esse comportamento gera alavanca de aumento de preços nas contratações públicas pelo município. Os empresários elevam seus preços quando vão contratar com a Administração Pública. O resultado desse comportamento cria a vítima fatal: a sociedade, que paga mais caro e fica sem o serviço público.

A violação do Direito Financeiro provoca também o desemprego, a falta de capacidade e o desinteresse do fornecedor, que prefere não arriscar um contrato público e opta por uma atividade privada. Enfim, o resto a pagar não está sendo pago, está suspenso. Neste ano não será paga uma ordem de R$ 2 bilhões e isso viola as normas de Direito Financeiro, e nós estamos assistindo a tudo isso acontecer no município do Rio de Janeiro.

Essas empresas estão sendo obrigadas a executar seu objeto mesmo com uma inadimplência vultuosa das despesas do ano passado. Elas precisam cumprir seu contrato agora, estão recebendo pelo que estão executando agora, mas elas tiveram de pagar aquela folha de pagamento e os tributos do ano passado, até porque se não pagar, não recebe. As empresas estão passando por dificuldades nesse sentido.

Os serviços públicos ficam cada vez mais precários, as contratações, mais caras, o risco financeiro é enorme, a produtividade reduz. Não é possível que se permita que o saldo desse resto a pagar seja utilizado em investimentos novos, que vão captar votos. É necessário que se honre os contratos administrativos, que se dê segurança jurídica e confiança legítima para que nós tenhamos serviços públicos adequados no Rio de Janeiro.

É importante que os órgãos de controle externo estejam atentos ao descumprimento das normas financeiras. Isso afeta diretamente o interesse público e a sociedade. A responsabilidade fiscal deve ser tratada de forma séria e objetiva. Para o advogado, a sociedade assiste à Câmara de Vereadores aprovar uma lei para pagar esse resto em dez anos. Não há índice que comprove que isso seja necessário. As empresas, sim, vão precisar parcelar em dez anos as suas dívidas para não falir e, assim, conseguirem se manter no mercado. Além disso, a contratação governamental em nosso município, certamente, será a mais cara e menos eficiente do Brasil.

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